A cidade de Caracas viu novas manifestações, nesta quinta-feira (13/02) após a violência registrada ao final de um protesto estudantil e de líderes opositores na tarde de ontem, que resultou em três mortes. Na zona leste da cidade, um grupo de estudantes cortou uma avenida em frente à Universidade Alejandro Humboldt para exigir informações de um colega detido e justiça pela morte de outro. Já chavistas se reuniram no centro da capital para pedir o fim das agressões.
“Eu não sou Chávez, não sou Maduro, sou estudante que defende seu futuro”, foi uma das consignas cantadas em referência ao falecido presidente e ao atual chefe de Estado venezuelano. Com cartazes coloridos, alguns manifestantes sentaram na avenida, enquanto outros em pé formavam uma barreira. “Quem somos? Estudantes! Que queremos? Liberdade!” gritavam, além de “somos estudantes, não somos delinquentes”.
Luciana Taddeo/Opera Mundi
Protesto de estudantes na avenida Romulo Gallegos, em Caracas. Manifestação aconteceu um dia após atos de violência
Por volta das 11h, a estudante de comércio internacional, Maria Villarreal, de 21 anos disse a Opera Mundi que o grupo se encontrava no local desde as 8h e que não tiveram problemas com a polícia, que bloqueou a avenida a alguns metros de distância. Segundo ela, o grupo protestava por dois detidos da universidade, um dos quais já tinha sido liberado, além da morte de um universitário da instituição.
“Estamos aqui para repudiar os atos violentos registrados ontem no Dia da Juventude, na marcha de estudantes que se desenvolveu de maneira pacífica. Arremeteram contra a marcha, um companheiro perdeu a vida, dois foram apreendidos e ainda não temos notícias de um deles”, afirmou o estudante de publicidade Marcos Mata, de 22 anos. “Se não tivermos notícias, o protesto continuará ativo, de maneira pacífica, como está previsto na nossa Constituição”, complementou.
A cerca de quatro quarteirões do local, um CDI (Centro de Diagnóstico Integral), posto médico onde atuam médicos cubanos, estava protegido por efetivos da Guarda Nacional Bolivariana. Um edifício ministerial no município de Chacao, ao lado da estação de metrô homônima, amanheceu com vidros estilhaçados, quando não totalmente quebrados. Os efetivos policiais também resguardavam o local. Na noite de ontem, manifestações foram registradas no município, onde armaram barricadas com fogo e faleceu a terceira vítima fatal dos protestos.
Chavistas
Ainda durante a manhã, apoiadores do governo venezuelano se reuniram em frente à sede do Ministério Público, na região central da cidade, cujo edifício foi assediado por manifestantes na tarde de ontem. “Basta já de conciliar, já é hora de lutar” foram algumas das palavras de ordem dos manifestantes, que pediam a prisão do dirigente opositor Leopoldo López, do partido Vontade Popular, acusado por líderes chavistas de ser o autor intelectual da violência desta quarta.
Luciana Taddeo/Opera Mundi
“Chega de impunidade! Não ao fascismo! Pela vida e pela paz! Não voltarão!”, diz cartaz em manifestação chavista
“Se o povo não se indigna, a direita o pega”, cantavam, esperando a chegada da promotora geral da república, Luisa Ortega Díaz, que mais cedo confirmou a morte de três pessoas e mais de 60 feridos. Durante seu pronunciamento, diante da fachada danificada pelos protestos de ontem, ela afirmou que haverá justiça pelos mortos e feridos. Segundo Jorge Navas, membro de um coletivo alinhado ao governo que estava no local durante os distúrbios, havia infiltrados armados entre os manifestantes.
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“Nós, grupos de coletivos irmãos estivemos mobilizados para preservar tanto a nossa marcha [chavista] que estava concentrada, assim como as instalações do governo e do Ministério Público. Nós, dos coletivos de trabalho organizado, não somos uns fascistas nem assassinos, em nenhum momento nós provocamos ninguém, nós sempre pedimos disciplina, prudência, paz, tolerância. Tivemos que recuar porque não vamos cair em nenhum tipo de provocação. Os manifestantes pediam a presença da promotora, ela ordena uma equipe para recebê-los e eles se negaram. Então ela diz que desceria, e eles também se negam”, contou.
De acordo com ele, “no meio da discussão”, López começou a falar em um megafone e dizer “uma série de barbaridades”, antes de se retirar. Navas diz que os manifestantes queriam ir em direção ao Palácio de Miraflores e que começaram a jogar pedras e garrafas contra o cordão policial. “Um jovem sobe na barricada e cai do outro lado, e não acontece nada. Ele alegou que tinha que passar porque lhe estavam violando o artigo 68 da Constituição, mas não dessa maneira, irmão!”, relata.
Jovem estudante opositor é contido pela PNB e levado até a mãe:
Segundo ele, os coletivos viram uma pessoa armada e avisou aos efetivos de inteligência do governo, mas o indivíduo se misturou aos manifestantes. Navas acredita que o assassinato de Juan Montoya, líder de um coletivo, tenha sido disparado por um franco-atirador ,“porque foi direto na cara”. “Nós estávamos retirados quando ele caiu, porque já era impossível se manter aí, a violência já era extrema”, conta, afirmando que membros do coletivo e “organizações do poder popular” não levantaram armas “em nenhum momento”.
Infiltrados
O argentino Juan Francia, que trabalha com jornalismo na Venezuela e mora perto do local dos distúrbios, contou ter saído da estação de metrô Parque Carabobo e ter visto “grupos violentos que jogavam garrafas e pedras contra a polícia, querendo passar”. Segundo ele, um grupo “nutrido” estava batendo em portas do Ministério Público, insultando autoridades e que as pessoas dentro do edifício aparentavam medo.
Luciana Taddeo/Opera Mundi
Pixação em Caracas diz “a revolução morreu com Chávez”. Estudantes foram às ruas pedir pela libertação de colegas detidos
“Eu me aproximei de duas estudantes e perguntei se elas não achavam que a atitude era hostil e elas disseram que não. Aí perguntei da violência no estado de Táchira e elas disseram que isso se devia a grupos infiltrados. Alguns dos manifestantes gritavam ‘paz, paz’. Eu tive que voltar pra casa e, quando voltei, as forças públicas já tinham ocupado o lugar e o edifício estava todo destruído. Não escutei disparos. Quando eu voltei, os manifestantes não estavam na área e tinha um grupo mais exaltado na região de Bellas Artes, a algumas quadras”, conta.
Além de Caracas, a violência também se registrou em outros pontos do país durante protestos de quarta. Sobre um dos incidentes, o governador do estado de Aragua, Tareck El Aissami, afirmou que grupos tentaram agredir funcionários do corpo de segurança e queimar a sede do governo. Para o ministro do Interior, Justiça e Paz, Miguel Rodríguez Torres, as ações violentas têm um propósito conspirativo.