Pela primeira vez após dois meses da crise política que provocou 39 mortes e 608 feridos na Venezuela, o governo Nicolás Maduro e a oposição concordaram em dar início ao processo de diálogo de paz. Pública e transmitida ao vivo, a primeira reunião entre chavistas e a MUD (Mesa de Unidade Democrática) contará com a mediação de três chanceleres da Unasul (União de Nações Sul-Americanas) — inclusive o brasileiro, Luiz Alberto Figueiredo.
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Agência Efe
Na sede da chancelaria venezuelana, Maduro se reúne com líderes do MUD e chanceleres da Unasul para acertar o início do diálogo
“Estou pronto e desejoso de me sentar cara a cara com a oposição”, disse Maduro, ao anunciar o início do processo. A confirmação de que os diálogos acontecerão foi feita na última terça-feira (08/04) após um encontro entre o vice-presidente, Jorge Arreaza, e Ramón Guillermo Aveledo, secretário-geral da MUD, principal coalizão opositora.
“Que essa primeira reunião ocorra perante toda a Venezuela e o mundo, para que seja feita com toda transparência e para que fiquem perfeitamente claras as posições, motivações e a sincera vontade de todos”, comentou Aveledo, que esteve acompanhado dos líderes opositores Henri Falcón (governador de Lara) e Omar Barbosa, líder do partido UNT (Um Novo Tempo).
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O secretário-geral da MUD, Aveledo (centro), dá declarações sobre o início das conversas com o governo Maduro
O acordo inclui a presença de um grupo de mediadores formado pelos chanceleres de Brasil (Figueiredo), Equador (Ricardo Patiño) e Colômbia (María Ángela Holguín), além de um representante do Vaticano.
Esfriamento das tensões
Desde que foi deflagrada a crise, este consenso em torno da busca pelo diálogo é um movimento inédito e dá indícios de esfriamento das tensões na Venezuela. Ainda que os setores mais radicais — capitaneados por Leopoldo López e María Corina Machado — permaneçam se recusando a participar das conversas, é a primeira vez que a oposição aceita sentar-se à mesa com Maduro e discutir opções. Na Conferência Nacional de Paz, iniciativa convocada pelo governo seis dias após os protestos violentos de 12 de fevereiro, toda a oposição se negou a dialogar, alegando que o governo não havia cumprido certas condições impostas.
Após o anúncio do diálogo, os Estados Unidos resolveram suspender seus planos de aplicar sanções contra a Venezuela enquanto estiverem de pé as conversas entre oposição e governo. Segundo o secretário de Estado norte-americano, John Kerry, Washington não se intrometerá na crise para que sua ação não sirva de desculpa em caso de fracasso das negociações.
“Neste momento, estamos a favor dos esforços de mediação por parte de terceiros, que têm como objetivo pôr fim à violência e conseguir um diálogo honesto, para fazer frente às queixas legítimas das pessoas na Venezuela”, disse Kerry.
O distanciamento da Casa Branca vem após semanas de relação conflituosa entre os dois países: expulsão de diplomatas das duas embaixadas e troca de acusações sobre o papel de Washington como incentivador da crise na Venezuela.
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Oposição dividia
A inclinação da MUD — classificada de “oposição democrática” na declaração do vice-presidente, Arreaza — ao diálogo gerou uma série de duras críticas por parte da ala mais radical da oposição. Nas redes sociais, integrantes da MUD foram chamados de “traidores” e “colaboracionistas” pelos simpatizantes do movimento “A Saída”, campanha que pede a mudança imediata do governo, cuja principal liderança é o opositor Leopoldo López, dirigente político do partido VP (Vontade Popular) preso há quase sete semanas.
Nome de peso da MUD e candidato presidencial derrotado pelo chavismo em dois pleitos (Chávez em 2012 e, após sua morte, por Maduro, no ano seguinte), Henrique Capriles afirmou que o diálogo com o governo não significa renunciar a seus princípios e ao direito de protesto que tem a população.
Agência Efe
A deputada independente María Corina Machado, que esteve há pouco no Brasil, não aceita dialogar com o governo venezuelano
Cassada pelo Legislativo venezuelano, a deputada independente María Corina Machado — que visitou o Brasil — disse que não aceitou participar dos diálogos, embora tenha se reunido com os representantes da Unasul — bloco regional cuja imparcialidade é questionada por boa parte da oposição do país.
“Não acreditamos em um ‘diálogo’ no qual o regime só propõe um show político utilizando os chanceleres da Unasul como interlocutores, mas se nega o tempo todo a dar as demonstrações necessárias”, afirmou o VP, em comunicado. O partido de Leopoldo López estabelece a libertação de seu dirigente político como condição para validar as conversas.