Com muito pouco você
apoia a mídia independente
Opera Mundi
Opera Mundi APOIE
  • Política e Economia
  • Diplomacia
  • Análise
  • Opinião
  • Coronavírus
  • Vídeos
  • Podcasts
Política e Economia

Palestinos usam "Muro da Vergonha" como telão para ver jogos da Copa

Encaminhar Enviar por e-mail

Restaurante na cidade de Belém projeta partidas do Mundial de futebol na barreira que simboliza a segregação na Cisjordânia e o conflito israelo-palestino

Felipe Amorim

2014-06-27T23:50:00.000Z

Receba nossas notícias e novidades em primeira mão!

Do alto de seus oito metros de comprimento, o muro simboliza a segregação. Ao separar os palestinos da cidade sagrada de Belém do resto da Cisjordânia, tornou-se um dos emblemas da ocupação israelense dos territórios árabes. Além de servir de tela para artistas como Banksy expressarem sua indignação e ativistas rabiscarem suas palavras de ordem, a população palestina encontrou outra maneira de se apropriar dessa barreira imposta por Israel há mais de dez anos: projetar nela as partidas da Copa do Mundo, evento esportivo que congrega 32 nações diferentes e cujo slogan oficial — “juntos num só ritmo” — é mais uma provocação à construção do paredão.

Leia mais: Especialista: visita do papa a 'Muro da Vergonha' vale por dez anos de intifada palestina

Reprodução/Activestills.org

Clientes do "The Wall Steak House" assistem à partida da Copa do Mundo projetada no Muro da Cisjordânia

A iniciativa partiu de um dono de restaurante aficionado por futebol, Joseph Hasboun. A casa de carnes que gerencia, “The Wall Steak House”, estampa logo no nome a paisagem a que seus clientes têm direito ao se acomodar no estabelecimento. Do outro lado da rua, lá está ele, o muro. Desde o dia 12 de junho, quando o Brasil inaugurou o Mundial contra a Croácia, a parede tem também outra função e serve de telão para a transmissão dos jogos da Copa.

Leia mais: Clube de futebol usa antigo mapa da Palestina em camisa e comunidade judia reage

“É algo como uma resistência civil. Eles podem colocar esse muro, mas não podem nos impedir de fazer isso”, relata o advogado palestino Ihab Jaser, 33, ao veículo local The Jewish Journal, enquanto assistia ao empate entre Alemanha e Gana. “É um lugar bonito, é ao ar livre e tem algum significado”, completa Hasboun, o dono do restaurante.

A transmissão ao vivo dos duelos futebolísticos já se tornou uma tradição, começou em 2010 no Mundial da África do Sul e virou ponto de encontro para grupos de jovens palestinos — e também alguns turistas de passagem por Belém — vibrarem com os grandes craques do futebol. De lá para cá, uma mudança. Para atender à demanda, Hasboun investiu em uma tela maior e agora são quase 20 metros quadrados emprestados pelo muro à nobre causa.

Reprodução/Activestill.org

Usado para projetar jogos da Copa, retângulo de tinta branca de 20 m² encobre parte da obra de artista espanhol

A “reforma”, entretanto, desagradou parte da clientela. Isto porque, para bancar o upgrade, Hasboun teve que cobrir com tinta branca a pintura de um camelo gigante feita pelo artista de rua espanhol Sam3. Questionado sobre por que não pintou a tela alguns metros para o lado, Hasboun tem uma defesa técnica: “O equipamento de projeção já estava instalado ali”.

Baixa audiência

Embora a Copa no Brasil esteja presenteando o público com bons jogos e muitos gols — para a alegria dos donos de bares, que torcem por mesas cheias e copos esvaziados — a frequência no “The Wall Steak House” tem sido abaixo da esperada. Desde o sequestro dos adolescentes israelenses, há duas semanas, a Cisjordânia virou palco de uma força-tarefa do Exército vizinho. Durante a caçada pelos autores do rapto, cinco palestinos já foram mortos e centenas detidos, enquanto cidades foram sitiadas pelas forças israelenses, controlando a entrada e saída de moradores e conduzindo buscas indiscriminadamente na casa das pessoas.

Leia mais: De Chiapas à Palestina: equipe inglesa mostra que outro futebol é possível

O dono do restaurante disse que pelo menos dois grupos de clientes, habitués da casa e fãs de futebol, decidiram não comparecer à transmissão da peleja com medo de serem parados na rua, enquadrados e revistados por militares israelenses.

Vídeo mostra extensão e trajeto do Muro da Cisjordânia (ou "Muro da Vergonha") construído por Israel na década de 2000:

“Se eles continuarem a entrar todas as noites em nossas casas, pode haver outra intifada”, comenta Jaser ao The Jewish Journal, referindo-se aos movimentos palestinos de resistência contra a ocupação israelense. Foi, inclusive, após o último desses levantes, a 2ª Intifada, que teve início em 2000, que Israel se pôs a erguer o muro, considerado uma “cerca de segurança” para proteger seus cidadãos dos ataques palestinos.

Símbolo da divisão e do acirramento do conflito israelo-palestino, o “Muro da Vergonha”, como também é conhecida a barreira, recebeu recentemente outra entidade “supranacional”. Além de servir de suporte para a transmissão dos jogos da Copa, suas paredes também encararam a paradigmática visita do papa Francisco. Distante apenas algumas quadras da fachada do restaurante-sede das projeções, o líder da Igreja Católica saltou do papa-móvel e encostou na parede para rezar e pedir por paz no Oriente Médio.

Você que chegou até aqui e que acredita em uma mídia autônoma e comprometida com a verdade: precisamos da sua contribuição. A informação deve ser livre e acessível para todos, mas produzi-la com qualidade tem um custo, que é bancado essencialmente por nossos assinantes solidários. Escolha a melhor forma de você contribuir com nosso projeto jornalístico, que olha ao mundo a partir da América Latina e do Brasil.

Contra as fake news, o jornalismo de qualidade é a melhor vacina!

Faça uma
assinatura mensal
Faça uma
assinatura anual
Faça uma
contribuição única

Opera Mundi foi criado em 2008. É mais de uma década de cobertura do cenário político internacional, numa perspectiva brasileira e única. Só o apoio dos internautas nos permite sobreviver e expandir o projeto. Obrigado.

Eu apoio Opera Mundi
Análise

Patentes na OMC é uma derrota para os países do Sul Global

Encaminhar Enviar por e-mail

Pandemia de covid-19 reativou a debate sobre a quebra de patentes para medicamentos e vacinas. Apesar de sua união em torno do tema, países subdesenvolvidos sofreram uma derrota

Alessandra Monterastelli

Outras Palavras Outras Palavras

2022-07-06T22:35:00.000Z

Receba nossas notícias e novidades em primeira mão!

No dia 17 de junho, saiu fumaça branca das chaminés da Organização Mundial do Comércio (OMC). A entidade, responsável pela regulação de patentes internacionais, anunciou que chegara a uma conclusão sobre as vacinas contra o coronavírus. Tratava-se do pedido de isenção do acordo TRIPS – sigla em inglês para Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio. Firmado na virada do século, tal compromisso obriga os países-membros da OMC a adotar padrões mais rigorosos de proteção patentária. Consequentemente, encarece o acesso às inovações tecnológicas, inclusive no setor farmacêutico. Mas a decisão final foi amplamente criticada por ativistas da saúde e movimentos populares em todo o mundo, já que a OMC rejeitou a isenção total do TRIPS. 

Em 2020, diante da disseminação do novo coronavírus, África do Sul e Índia protocolaram a proposta de isenção do Acordo, que obteve amplo apoio dos países em desenvolvimento e de baixa renda – com exceção do Brasil. A nova decisão foi saudada pelo Secretariado da OMC e por representantes de países ricos como um resultado sem precedentes, mas ativistas condenam que, na prática, a decisão não atende as necessidades mínimas da maior fatia do mundo. “Houve um esvaziamento da proposta pelos países mais ricos. O texto perdeu totalmente sua força, não trouxe nada novo”, explica Felipe Carvalho, Coordenador Regional da Campanha de Acesso do Médicos Sem Fronteiras ao Outra Saúde.

A conclusão do órgão concedeu uma exceção temporária à restrição das quantidades de vacinas que podem ser exportadas sob licença compulsória; diagnósticos e tratamentos não estão incluídos e devem obedecer ao limite de exportação durante o tempo de licença compulsória – decretada durante emergências sanitárias, como é o caso da pandemia. Além disso, a concessão vale apenas para responder à covid-19 e não tem validade diante de outras crises de saúde. O acordo final não inclui o compartilhamento de segredos comerciais e know-how de fabricação, o que prejudicará a produção de vacinas com tecnologia avançada por países de baixa renda – como é o caso dos imunizantes de RNA.

Carvalho conta que o problema é abordado com frequência em reuniões escpecais da OMS e da ONU.  “Existe um consenso entre especialistas e órgãos multilaterais de que as patentes causam constantes crises de acesso e inovação na saúde”. Em maio, o The Guardian divulgou que a Pfizer lucrou 25,7 bilhões de dólares só no início de 2022 – mais da metade do valor está relacionado à venda de vacinas contra a covid-19. Tim Bierley, ativista do Global Justice Now, denunciou ao jornal britânico que apesar do apelo da Organização Mundial da Saúde (OMS) e de outras organizações, a farmacêutica seguia se recusando a compartilhar a tecnologia de produção do imunizante. O diretor da OMS, Tedros Adhanon, afirmou em 2021 que a pandemia estava sendo prolongada por uma “escandalosa desigualdade” diante do acúmulo de doses de imunizantes por países ricos enquanto países pobres não conseguiam avançar em sua meta de vacinação em massa. 

“Desde a criação do acordo TRIPs nós temos um cenário de constantes crises de acesso a medicamentos essenciais”, conta Felipe. Ele relembra o caso emblemático da epidemia de HIV/AIDS, na década de 1990. “Em 1996 surgiu a primeira terapia para a doença. As pessoas pararam de morrer e passaram a conviver com o vírus. Mas essa terapia não chegou nos países onde o cenário era mais grave”, explica. O ano de 1996 foi também quando o acordo TRIPS entrou em vigor, após sua criação em 1994 e preparação em 1995. “A partir daí se criou uma coalizão na sociedade civil, da qual fazemos parte, chamada Movimento de Luta pelo Acesso a Medicamentos. A pergunta era: por que os preços eram tão altos e o tratamento se tornava inacessível para milhões de pessoas? Nos aprofundamos no sistema de patentes e entendemos que o monopólio era a causa”, relembra.

Apesar do TRIPS possuir cláusulas que permitem flexibilizações, elas são de difícil utilização devido a dois fatores principais: sua não-incorporação completa em leis de países-membros e a pressão que as farmacêuticas exercem sobre as decisões da OMC. Na década de 1990, diante da grave situação vivida na África do Sul – país com maior número de mortes pela AIDS na época – o governo então liderado por Nelson Mandela aprovou uma das medidas previstas no TRIPS para importar genéricos. Na ocasião, Mandela sofreu o processo de 39 farmacêuticas que se opuseram à decisão tomada para conter a crise de saúde pública. Apesar da derrota das corporações na justiça, “esse é um exemplo de como essas empresas e seus países-sede tentam barrar as normas legítimas existentes no TRIPS”, exemplifica Carvalho.

A OMC é uma instituição formada por 164 membros e opera com base na tomada de decisões por consenso. “A OMC falhou em fornecer uma isenção. O acordo coloca os lucros à frente das vidas e mostra que o atual regime de propriedade intelectual falha em proteger a saúde e promover a transferência de tecnologia. Essa não-renúncia estabelece um mau precedente para futuras pandemias e continuará a colocar vidas em risco” declarou Lauren Paremoer, médica e integrante do Peoples’ Health Movement na África do Sul. 

A Health Action International, referência no trabalho para expandir o acesso a medicamentos essenciais, argumentou em nota que a decisão da OMC impõe obstáculos ao licenciamento compulsório, uma das poucas flexibilidades existentes no TRIPS, em troca de uma abertura tímida para a facilitação da exportação de vacinas. Outras entidades representantes da sociedade civil já denunciaram a atuação dos países ricos e vêm aumentando a pressão sobre os governos. O objetivo, segundo seus porta-vozes, é que sejam tomadas medidas concretas para desafiar as regras de monopólio farmacêutico da OMC e garantir mais acesso a medicamentos e tecnologias. 

Você que chegou até aqui e que acredita em uma mídia autônoma e comprometida com a verdade: precisamos da sua contribuição. A informação deve ser livre e acessível para todos, mas produzi-la com qualidade tem um custo, que é bancado essencialmente por nossos assinantes solidários. Escolha a melhor forma de você contribuir com nosso projeto jornalístico, que olha ao mundo a partir da América Latina e do Brasil.

Contra as fake news, o jornalismo de qualidade é a melhor vacina!

Faça uma
assinatura mensal
Faça uma
assinatura anual
Faça uma
contribuição única

Opera Mundi foi criado em 2008. É mais de uma década de cobertura do cenário político internacional, numa perspectiva brasileira e única. Só o apoio dos internautas nos permite sobreviver e expandir o projeto. Obrigado.

Eu apoio Opera Mundi
Receba nossas notícias e novidades em primeira mão!
Opera Mundi

Endereço: Avenida Paulista, nº 1842, TORRE NORTE CONJ 155 – 15º andar São Paulo - SP
CNPJ: 07.041.081.0001-17
Telefone: (11) 4118-6591

  • Contato
  • Política e Economia
  • Diplomacia
  • Análise
  • Opinião
  • Coronavírus
  • Vídeos
  • Expediente
  • Política de privacidade
Siga-nos
  • YouTube
  • Facebook
  • Twitter
  • Instagram
  • Google News
  • RSS
Blogs
  • Breno Altman
  • Agora
  • Bidê
  • Blog do Piva
  • Quebrando Muros
Receba nossas publicações
Receba nossas notícias e novidades em primeira mão!

© 2018 ArpaDesign | Todos os direitos reservados