ONU condena Israel e cria comissão para investigar ofensiva contra Gaza
O 16º dia da ofensiva militar israelense também teve encontro entre Kerry e Netanyahu, além de uma tentativa do Irã em fornecer ajuda médica a Gaza
* Atualizada às 15h05
O Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas aprovou nesta quarta-feira (23/07) uma resolução que condena Israel por sua ofensiva militar contra Gaza e também cria uma comissão própria para investigar crimes e violações do direito internacional na empreitada.
Entre os 47 países-membros do conselho, a resolução foi aprovada por 29 votos favoráveis — todos os países latino-americanos, incluindo o Brasil, apoiaram a proposta — e 17 abstenções (Alemanha, Itália, França e Reino Unido permaneceram neutros). Os Estados Unidos foram os únicos a se opor à proposta, assinalando que o conteúdo do documento é "destrutivo" e que em nada contribui para o fim das hostilidades.
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Agência Efe
Sessão especial do Conselho de Direitos Humanos da ONU na Suiça.
Em termos gerais, o documento pede que Israel detenha imediatamente sua operação na Faixa de Gaza, especialmente os ataques contra os civis. Além disso, reivindica a suspensão do bloqueio contra Gaza, para que seja possível a entrada segura de ajuda humanitária e comércio de bens no território.
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Sobre a comissão investigadora, o documento destaca que terá personalidade independente e internacional, e que deve viajar de forma urgente aos territórios palestinos para realizar sua investigação. Suas indagações deverão cobrir o período desde o dia 13 de junho, além de incluir a identificação dos responsáveis dos crimes e recomendar medidas para que sejam julgados por seus atos. "Tudo isto com o propósito de evitar e pôr fim à impunidade, e garantir que os responsáveis prestem contas", indica a resolução.
Crimes de guerra
Mais cedo, na manhã de hoje, a alta comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Navi Pillay, já havia denunciado que os ataques do Exército israelense contra Gaza poderiam constituir crimes de guerra.
"Os exemplos que acabo de mencionar [ataques israelenses contra civis indefesos] mostram que a lei humanitária internacional foi violada até um alcance que poderiam constituir crimes de guerra", assinalou Navi perante o Conselho de Direitos Humanos da ONU, que hoje realiza uma sessão especial sobre a incursão israelense.
Ela começou sua declaração lembrando que os ataques israelenses causaram a morte de 600 palestinos — entre eles 147 crianças e 74 mulheres —, 74% dos quais eram civis. Navi informou ainda que 27 soldados e dois civis israelenses morreram durante estes ataques e destacou que civis e suas casas não devem ser alvos militares, argumento que já havia sido usado pela ONG humanitária Human Rights Watch.
"As casas de civis não são alvos legítimos, a menos que sejam usados ou contribuam para propósitos militares. Em caso de dúvida, as casas de civis não são alvos legítimos", criticou.
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Agência Efe
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Navy qualificou como "inaceitável" o lançamento de foguetes de áreas densamente povoadas, como presumivelmente faz o grupo islamita Hamas, "no entanto, a lei internacional é clara: as ações de uma parte não absolvem à outra de sua responsabilidade de respeitar suas obrigações sob a lei internacional".
Ela concordou com o argumento israelense de alertar antes de atacar, mas disse que estes avisos devem ser claros, críveis e dar tempo para que as pessoas se protejam. No entanto, a população "não tem prazo suficiente para deixar suas casas e, embora o façam, não têm onde se esconder nem sabem quando nem onde será o próximo bombardeio". Ela lembrou que um destes projéteis lançados supostamente para alertar destruiu uma casa e matou três crianças.
A alta comissária fez um especial alerta ao alto preço que as crianças pagam, e lembrou o caso de quatro menores que morreram e sete que ficaram gravemente feridos quando brincavam na praia. "A indiferença pela lei humanitária internacional é evidente quando bombardeios aéreos e navais atacam diretamente crianças que brincavam e que, obviamente, não estavam participando das hostilidades", afirmou.
Navy reiterou a todas as partes do conflito "Israel, Hamas e outros grupos armados palestinos" que apliquem a lei internacional e deixem de ter como alvo os civis. Ela lembrou que desde 12 de junho Israel deteve mais de 1.200 palestinos na Cisjordânia e Jerusalém Oriental, e que muitos deles foram postos em detenção administrativa. Ou seja, estão presos sem qualquer acusação.
"Na Cisjordânia, Israel continua expandindo assentamentos, demolindo casas palestinas, usando excessivamente a força, abusando de forma contínua e violando constantemente os direitos humanos da população", informou a alta representante.
Assistência médica iraniana
O presidente do Irã, Hassan Rohani, declarou na terça-feira que a missão médica que o país enviou à Faixa de Gaza não teve permissão para entrar em território palestino. "Infelizmente, não se permitiu à assistência médica iraniana chegar a Gaza", disse Rohani em um encontro ontem à noite em Teerã. O líder iraniano não precisou se são as autoridades israelenses ou as egípcias que atrapalham o fornecimento. Rohani reiterou a oferta do Irã de atender nos hospitais do país aos feridos na ofensiva israelense.
O porta-voz da Comissão de Segurança Nacional e Política Externa do parlamento iraniano, Hossein Naqavi Hosseini, anunciou ontem que seis deputados iranianos viajarão em breve a Gaza para manifestar o apoio de Teerã ao povo palestino e levar ajuda humanitária.
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Por sua vez, o ministro das Relações Exteriores do Irã, Mohamad Yavad Zarif, lembrou à comunidade e organismos internacionais que a responsabilidade está sobre seus ombros, especialmente sobre o Conselho de Segurança da ONU e o Alto Comissariado para os Direitos Humanos. Zarif ainda manteve conversações telefônicas com líderes do Hamas na noite de terça-feira.
O Irã é um dos principais apoiadores da organização islamita Hamas, que governa Gaza. No entanto, ambos sofreram um sério afastamento nos últimos anos por sua diferença de posições em relação ao conflito sírio, no qual o Hamas decidiu não apoiar o presidente Bashar al Assad e fechou sua sede política em Damasco.
Cessar-fogo
O secretário de Estado norte-americano, John Kerry, desembarcou nesta quarta-feira em Israel para negociar com o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, o presidente palestino, Mahmoud Abbas, e o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, um cessar-fogo imediato. Segundo o jornal norte-americano Washington Post, Kerry afirmou ter feito avanços nas negociações, mas que ainda tinha “muito trabalho a se feito”.
Agência Efe
O secretário-geral da ONU (direita) e o secretário de Estado dos Estados Unidos discutem durante reunião em Tel Aviv.
Ele esteve no Cairo na terça-feira, onde conversou com o presidente egípcio e representantes da Liga Árabe. O Egito foi o propulsor tem uma tentativa de cessar-fogo que acabou não funcionando e segue dialogando com autoridades israelenses e palestinas para que as hostilidades terminem. Em um discurso durante a comemoração que celebrou a deposição da monarquia egípcia, o presidente Abdel-Fattah Al-sisi afirmou que o país abriria a fronteira com a Palestina caso os dois lados aceitassem o cessar-fogo.
Voos cancelados
O secretário norte-americano chegou a Israel pelo aeroporto Ben Gurion, na cidade de Tel Aviv, principal porta de entrada internacional de Israel. Na terça-feira, um foguete do tipo M75, supostamente disparado por militantes do Hamas, conseguiu atravessar o escudo do sistema antimísseis Cúpula de Ferro e causou danos consideráveis em um chalé particular da pequena cidade de Yehud, situada a menos de um quilômetro do aeroporto.
Por esse motivo, diversas empresas aéreas dos Estados Unidos e da Europa decidiram suspender seus voos a Israel com medo que alguma aeronave seja atingida. Netanyahu pediu a Kerry que interceda na decisão de cancelamento dos voos. A administração de Aviação Civil de Israel considerou ontem que a suspensão de voos a Tel Aviv pelas principais companhias aéreas ocidentais era um "prêmio ao terrorismo".
Cronologia das tensões
A escalada de violência israelense ocorreu após a morte de três adolescentes israelenses na Cisjordânia no final de junho. Como “vingança”, um jovem palestino foi queimado vivo e assassinado em Jerusalém.
Logo após a descoberta dos corpos dos três jovens, Israel iniciou uma ofensiva contra o Hamas. Aviões de guerra passaram a bombardear Gaza destruindo casas e instituições e foram realizadas execuções extrajudiciais. Até agora, quase 600 palestinos foram sequestrados e presos.
A tensão aumentou na região após anúncio, no começo de junho, do fim da cisão entre o Fatah e o Hamas, que controlam a Cisjordânia e a Faixa de Gaza, respectivamente. Israel considera o Hamas um grupo terrorista e por isso suspendeu as conversas de paz que vinham sendo desenvolvidas com os palestinos com a mediação do secretário de Estado norte-americano, John Kerry.