Ao autorizar a realização de incursões militares no Iraque e na Síria, a Turquia deu nesta quinta-feira (02/10) um importante passo para se juntar à operação ocidental que combate os avanços do grupo radical sunita EI (Estado Islâmico). Como efeito prático e inédito, a empreitada poderá colocar lado a lado turcos e curdos, dois grupos protagonistas de um histórico de guerra civil dentro da Turquia nas últimas décadas.
Minoria no território turco, os curdos separatistas militam pela criação de um Curdistão independente. Por sua vez, o governo de Ancara não aceita e classifica como organização terrorista a principal voz do movimento separatista curdo. Agora, são aliados em potencial na luta contra o EI.
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Agência Efe
Já são mais de 1,5 milhão de refugiados sírios na Turquia; Ancara autorizou incursão militar para deter EI na Síria e Iraque
Por 298 votos contra 98, o Parlamento turco aprovou ontem uma moção que dá ao governo do país novos poderes para lançar incursões militares terrestres na Síria e no Iraque. Além disso, a medida também permite que tropas estrangeiras utilizem parte do território turco como forma de auxílio às operações logísticas de combate ao grupo extremista.
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A moção aprovada fixa os fundamentos legais para o envolvimento do Exército da Turquia na empreitada, além de legitimar o uso em potencial de bases militares em solo turco por soldados estrangeiros.
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Nos últimos dias, os EUA, que lideram a coalizão internacional anti-EI, vinham pressionando a Turquia para que o país assumisse um papel mais ativo na luta contra o grupo extremista, em especial, após os avanços obtidos pelo grupo sunita há uma semana, chegando a dominar uma cidade síria na fronteira com a Turquia.
A relutância do governo de Ancara em se juntar à força-tarefa que combate o grupo extremista acabou quando os 46 reféns turcos — incluindo diplomatas e crianças — foram libertados pelo EI, em meados de setembro.
Agência Efe
Tanques turcos patrulham cidade fronteiriça com a Síria
A Turquia chegou a ser acusada até de fazer “vistas grossas” quanto ao fluxo de jihadistas e recursos — incluindo petróleo extraído de campos capturados pelo EI — que atravessam os 900 quilômetros de fronteira que o país divide com a Síria. Ancara sempre negou todas as acusações.
Curdos e turcos
Apesar da aprovação da moção parlamentar, ainda é incerta a maneira como a Turquia deverá fazer parte da operação militar — não há sinais imediatos de incursão militar iminente. Isto, pois a Turquia ainda segue receosa de eventuais retaliações por parte do EI, além de temer ajudar os curdos, importante força de resistência ao avanço do EI no norte do Iraque.
Curdos e turcos têm um longo histórico de conflitos, protagonizando uma guerra civil que teve início na década de 1980. A principal bandeira da minoria curda na Turquia é o separatismo, com o objetivo de criar um Estado curdo independente. O PKK (Partido dos Trabalhadores do Curdistão), principal movimento curdo, é considerado uma organização terrorista pela Turquia e também por EUA, Otan (aliança militar ocidental) e União Europeia.
A moção parlamentar aprovada hoje estende os poderes de intevenção em territórios iraquiano e sírio — antes, foram permitidas apenas para atacar os separatistas curdos ou para conter ameaças do governo Bashar al Assad. Hoje, Assad, curdos e turcos devem lutar do mesmo lado.
Dogu Ergil, um professor turco de ciência política entrevistado pela agência AP, disse, por exemplo, que a nova medida poderá permitir que combatentes curdos utilizem especificamente o território turco para seguir em direção ao foco dos enfrentamentos.