Alugar o próprio apartamento para turistas de passagem se tornou uma prática comum no mundo todo graças a sites de anúncios entre particulares como o Airbnb. A ideia original era oferecer a possibilidade de um dinheiro extra durante as férias do proprietário, por períodos curtos. Com o tempo, porém, a atividade foi crescendo e a amplitude do fenômeno começou a ter impacto direto na esfera sócio-economica de alguns grandes centros turísticos como Paris, Londres ou Nova York. Desde então, autoridades tentam encontrar a melhor maneira de lidar com a nova prática sem que ela se torne um problema para a sociedade.
Paris, cidade que mais recebe turistas no mundo, se tornou também a campeã de anúncios de apartamentos no Airbnb, disponibilizando mais de 40 mil imóveis em sua aglomeração – 7.000 a mais que Nova York. A prefeitura de Paris, no entanto, está preocupada com o recorde: segundo estimativa municipal, entre 25 e 30 mil alojamentos que, antes, eram alugados a habitantes, agora são locados exclusivamente a viajantes. Em alguns prédios de bairros turísticos, como o Marais, um em cada quatro apartamentos já teria sido convertido em locação temporária. Em médio prazo, tal conjuntura pode aumentar ainda mais os preços dos imóveis da região e expulsar os moradores para a periferia.
Fotos: Amanda Lourenço/Opera Mundi
Turistas procuram direções no bairro do Marais, em Paris: prefeitura começou a multar aluguéis irregulares feitos no Airbnb
“Não temos o menor problema com as pessoas que saem de férias e alugam seus apartamentos durante esse período. Elas têm todo o direito. Porém, transformar uma residência secundária em locação turística permanente sem registrar como atividade comercial é uma prática ilegal”, afirmou a assessoria de comunicação da Prefeitura de Paris por telefone. Atraídos por lucros consideráveis, proprietários estariam abandonando a locação tradicional pela turística: o valor do aluguel que seria cobrado mensalmente é rapidamente alcançado em apenas uma semana com turistas.
Para lutar contra este tipo de atividade, a prefeitura de Paris organiza visitas surpresas aos apartamentos. “É fácil descobrir quem aluga o ano todo, basta fazer uma pesquisa nos sites”, explicou a assessora. No mês de maio, uma operação visitou 80 imóveis em três dias no Marais e notificou 30 deles. Apesar do susto de abrir a porta e dar de cara com todo o aparato policial, turistas não são alvo de nenhuma acusação. Os proprietários, por outro lado, recebem uma primeira notificação para regularizar o imóvel como locação turística ou cessar a atividade. Caso não sigam as normas, podem ser obrigados a pagar multas de até € 80 mil (cerca de R$ 280 mil).
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Apenas no ano passado, 56 alojamentos irregulares somaram € 567 mil, cerca de R$ 2 milhões, em multas. Um dos proprietários condenados era dono de quatro apartamentos e foi obrigado a pagar € 100 mil (R$ 350 mil) sozinho. Neste ano, reicidente, teve que pagar a mesma quantia novamente.
Nova York
Prevendo complicações semelhantes já em 2010, Nova York criou uma lei que proibe locações e sublocações de menos de um mês. O proprietário, porém, pode alugar um quarto de seu apartamento, com a condição de que ele também esteja no imóvel ao mesmo tempo em que o visitante. O resultado é que a maior parte dos anúncios do Airbnb de NY são ilegais. Além disso, segundo relatório do governo do Estado de Nova York publicado no fim do ano passado, 6% dos anunciantes são responsáveis por 37% dos pagamentos do site, ou seja, há uma profissionalização do setor também nos EUA.
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Em Londres, a reclamação é a mesma. Sarah Hayward, conselheira municipal, declarou à imprensa britânica que não é favorável às locações massivas: “Com milhares de famílias londrinas precisando de casas, temos que resistir firmemente ao mercado de alugueis de curta duração, pois sabemos que isto vai reduzir as opções disponíveis para cidadãos procurando um local de preço acessível para viver”, afirmou.
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Contatada pela reportagem, a Airbnb afirmou que são poucos casos de irregularidade dos inscritos no site. “A grande maioria dos nossos anfitriões aluga sua residência principal de maneira ocasional, o que é totalmente autorizado por lei”. A empresa afirma ainda que apoia o trabalho da prefeitura. “Desde o ano passado pedimos aos proprietários que assinem um termo de compromisso de respeito às regras em vigor”, explicou a representante.
Comerciantes do bairro do Marais (foto) ficam divididos com presença de turistas na área
Cotidiano
Ilegal ou não, o aluguel de apartamentos por turistas têm interferido no cotidiano de alguns bairros. Há mais reclamações de vizinhos por causa de barulho e do entra e sai de malas nos apartamentos, até então, residenciais. Alguns comerciantes também não estão muito satisfeitos, como o dono de um açougue no Marais que em entrevista à imprensa local reclamou do movimento: “O bairro está perdendo seus habitantes. O comércio tem cada vez menos clientes, pois os turistas não compram ingredientes, vão ao restaurante e comem sanduíches”.
Como se é de imaginar, proprietários de restaurantes e outros tipos de comércios não são da mesma opinião e acham que a permanência dos turistas no bairro é positiva. “O Marais é um bairro turístico, sempre esteve cheio de visitantes. A diferença é que agora eles participam mais. Por exemplo, ao invés de comprarem na Champs Elysée, compram aqui que é mais perto de casa”, argumenta Jonathan Allouch, dono de uma ótica no bairro. “Gosto da presença dos turistas. No bairro onde moro também tem vários apartamentos alugados para eles, acho ótimo. Meu irmão, inclusive, já alugou o dele”, diz o comerciante.