Depois de uma intensa jornada no Congresso Nacional, onde governo e oposição negociaram votos e indicações ao menos quatro vezes, em comissões e no Senado, a presidente Michelle Bachelet conseguiu a aprovação da chamada Lei Expressa de Gratuidade Universitária na madrugada desta quarta-feira (24/12). O texto, que tramitou no Legislativo com máxima urgência, não integra a reforma universitária, e foi viabilizado para garantir a gratuidade no ensino já em 2016. Por essa razão, o movimento estudantil criticou a medida, classificada pelos estudantes como “improvisada”.
O projeto foi elaborado com certa urgência, como reação à sentença do TC (Tribunal Constitucional) de duas semanas atrás, que considerou discriminatórios os critérios de entrega de recursos públicos para as universidades que desejam oferecer educação gratuita. O TC colocou em dúvida o cumprimento da promessa da presidente de iniciar a gratuidade na educação superior já em 2016 de forma parcial, contemplando apenas estudantes de famílias carentes.
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A negociação com a oposição visava incluir as universidades privadas no sistema de entrega de recursos para oferecer educação gratuita – inicialmente, o benefício seria entregue somente às universidades e centros técnicos profissionais estatais. Assim, o governo teve que aceitar também a inclusão de universidades privadas no modelo, desde que tenham ao menos quatro anos de credenciamento e comprovem ser instituições sem fins de lucro.
Com a mudança, o Senado aprovou a medida com 22 votos a favor (13 abstenções). Menos de uma hora depois, a Câmara votou novamente o projeto novo, com as indicações incluídas, e os 92 votos favoráveis encerraram o trâmite legislativo.
Como a lei expressa não integra a reforma educacional e seu conteúdo valerá somente em 2016, o governo espera aprovar, no primeiro semestre do próximo ano, os capítulos da reforma educacional relativos à educação universitária – um dos quais se refere à gratuidade universal.
Mudanças no conteúdo
Entre as mudanças que o governo teve que aceitar para aprovar a medida está a redução do número de estudantes contemplados. O projeto rejeitado pelo TC contemplaria mais de 200 mil universitários, priorizando os de estratos sociais mais vulneráveis, regra que continuará valendo, mas somente para 180 mil alunos, segundo o novo texto.
Agência Efe
Estudantes protestaram nesta terça-feira; “com a educação pública não se brinca”, diz faixa
Outra alteração importante foi a retirada dos centros de formação técnica da lei expressa – que, segundo a ministra Delpiano, serão compensados com um novo programa especial de bolsas de estudo. Também se determinou que as universidades privadas que quiserem contar com o benefício deverão manifestar oficialmente sua intenção junto ao Ministério de Educação ainda este ano.
A presidente Michelle Bachelet deu uma declaração à imprensa local, após a promulgação da lei, na qual enfatizou que com isso, “cumprimos com a promessa de entregar educação gratuita aos estudantes de famílias mais pobres, mas não esquecemos que o objetivo final da reforma é estabelecer um sistema com gratuidade universal”.
Movimento Estudantil
O movimento estudantil protestou durante esta semana nos dois dias de votação no Congresso (terça e quarta-feira, 22 e 23). Os estudantes realizaram duas marchas, que contaram com cerca de 30 mil participantes cada uma, segundo números do movimento estudantil – a polícia afirmou que foram menos de 10 mil em ambas.
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A Confech (Confederação dos Estudantes do Chile) expressou, em comunicado, sua desconformidade com a lei apresentada pelo governo. Para o movimento, tratou-se de improvisação.
A dirigente estudantil Marta Matamala, uma das porta-vozes da Confech, avalia que “o governo foi tão apressado em fazer essa lei que o texto que foi divulgado no site do Ministério de Educação continha erros estatísticos e de redação. Uma lei assim não nos interessa porque estamos nos mobilizando por esta reforma desde 2011, e gostaríamos de um compromisso maior por parte da presidente e dos demais parlamentares”.
Os estudantes também reclamaram da inclusão de universidades privadas no modelo de gratuidade: “a entrega de recursos públicos para instituições privadas, que lucram oculta ou descaradamente, não pode ser considerada” afirmou Matamala.
Nesse sentido, é importante ressaltar que o deputado Gabriel Boric, um dos mais importantes dirigentes estudantis na época das primeiras marchas multitudinárias, foi o único representante da esquerda (ele milita no partido Esquerda Autônoma) que votou contra a lei expressa.