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Política e Economia

'É tempo de lutar, não de encontrar em quem colocar a culpa', diz Mujica sobre crise brasileira

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Em São Paulo, ex-presidente uruguaio falou à imprensa independente e criticou sistema político no Brasil: 'Ter que tecer alianças para ter maioria é perverso'

Vanessa Martina Silva

2016-04-27T22:02:00.000Z

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Clique para acessar todas as matérias e artigos de Opera Mundi e Samuel sobre o processo de impeachment

Com seu carisma e seu estilo filosófico característicos, o ex-presidente e senador do Uruguai José 'Pepe' Mujica conversou por quase duas horas na manhã desta quarta-feira (27/04) com jornalistas da imprensa independente brasileira em São Paulo, abordando temas como a crise política brasileira, a integração regional e o papel da esquerda nas disputas sociais atuais.

Para o político, um dos mais prestigiados da América Latina, a situação atual do Brasil, que se relaciona à crise da esquerda e ao avanço da direita na região, deve forjar a união entre as forças progressistas. “Agora é tempo de lutar e não de encontrar em quem colocar a culpa. As organizações de esquerda se destroem. Há que fazer autocrítica, mas à distância no tempo, não no quente da situação. Agora é preciso lutar”, sustentou.

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"É incomensurável a perda de Chávez. Nunca conheci um homem que tinha a generosidade que ele tinha com as pessoas", afirmou

Para Mujica, a corrupção — argumento utilizado para justificar a retirada do PT do poder através do impeachment da presidente Dilma Rousseff — não diz respeito a um único partido, mas “é um problema tão velho quanto o Brasil”.

"Não sei como administrar um país com tantos partidos", afirmou em referência ao sistema político brasileiro, que conta com 35 legendas atualmente. "Isso é mais uma questão de interesses pessoais, do que de causas ideológicas. E aí se tem a questão de como gestar uma maioria. (…) Ter que tecer alianças para ter maioria é perverso, porque será essa uma maioria ideológica? Não. Acho que algum dia vocês vão mudar isso. É preciso mudar o contrato social”.

Ainda com relação ao processo de impeachment contra a presidente brasileira, o líder ressaltou ser “paradoxal” que Dilma seja julgada por "um montão de gente" contra quem há acusações e investigações. E observou que a votação da admissibilidade do impeachment na Câmara dos Deputados “não deveria ter sido transmitida mundialmente. Isso fez mal ao Brasil como nação, ao seu prestígio. Baixaram a consideração do Brasil no mundo. Se tivessem votado sem falar nada, teria sido mais saudável”.

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Mujica ressaltou que 
é preciso "de ter humildade para aceitar as derrotas e coragem para recomeçar de novo, sempre"

Apesar de ser crítico da fragmentação da esquerda, Mujica considera que "os partidos progressistas devem aprofundar a democracia". "Partidos são insubstituíveis, mas têm defeitos porque os homens têm defeitos. A história é feita por correntes e não por indivíduos fenomenais", disse ao ressaltar que os meios de comunicação tendem a inventar o tal indivíduo fenomenal, tal como ocorreu na Guatemala recentemente, onde o ator e comediante Jimmy Morales foi eleito presidente em sua primeira investida política após intensos protestos contra a corrupção perpetrada pelos políticos tradicionais.

“A direita tem utilizado, com muitos benefícios, os nossos erros. Aproveitou um momento em que a conjuntura econômica estava a favor para gerar inconformismo”, observou o ex-presidente uruguaio, ressaltando que isso foi feito com a ajuda dos meios de comunicação. “Forças conspirativas? Quando as formas da direita conspirativa dão resultado é porque há fatores a favor deles”, afirmou.
 

Nesse sentido, o ex-presidente lembrou que a crise econômica teve um impacto muito forte entre a população. “Temos um crescimento muito lento da economia do mundo. Penso que é um transbordamento do capital financeiro, que está condenando o capital produtivo”, afirmou.

Otimista, Mujica acredita que "isso [a crise da esquerda] vai passar". "Sempre que chove, para. É preciso ter coragem de recomeçar, aprender com os erros e perseverar. Os únicos derrotados são os que desistem, por isso é preciso ter coragem, porque o triunfo é relativo", observou. Ex-guerrilheiro, Mujica passou muitos anos na prisão, e lembrou sua experiência para provar seu ponto: “Em matéria de derrota, por favor. Fiquei quase 14 anos preso, não me digam o que é derrota”.

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"
Se fosse Dilma estaria pior que ela. Não posso dizer para vocês o que faria no lugar dela", disse Mujica

Direitos sociais

Questionado a respeito das ameaças às leis trabalhistas diante do avanço da direita na região, Mujica observou que essa questão sempre aparece em momentos de crise, porque quando “há crise, a direta e as empresas se assustam pelo gasto do Estado. Então dizem ser preciso cortar gastos, conter a inflação”.

Diante dessas ameaças, os trabalhadores “não deveriam se atomizar ou romper e sim ter uma frente comum para ter capacidade de resistir e a maior capacidade de resistir dos trabalhadores é quando estão juntos. Então é preciso ter interesse de defender as conquistas trabalhistas em um momento em que o avanço da direita vai tentar fazer cortes”.

Por outro lado, observa Mujica, “a classe média, que parece ter emergido pela graça do Espírito Santo, não se dá conta de que isso ocorreu por obra da política de redistribuição social”. "Não esperem gratidão da história", alerta o ex-líder Tupamaru. "Está bem que as pessoas vivam melhor, ainda que não nos agradeçam. Não fizemos isso para que nos beijem as mãos, mas porque tínhamos que fazer".

Imprensa

Muito celebrada no Brasil, a chamada Lei de Meios no Uruguai, que objetiva a democratização dos meios de comunicação, foi sancionada pelo Congresso uruguaio em 2014, mas, este ano, a Justiça do país declarou alguns artigos da lei como inconstitucionais. Para Mujica, tal processo se entende por meio da problemática das classes sociais e da concentração de riquezas. “As empresas de comunicação vivem da venda de seus produtos. Quem são os grandes clientes? Obviamente não são de esquerda. Não temos que nos impressionar que os meios estejam voltados para a direita, é uma consequência”, observou.  

Sobre o avanço da lei, pontuou ser necessário “encontrar caminhos alternativos” e ressaltou a importância da união e do fortalecimento dos pequenos meios de comunicação.

"O triunfo é o caminhar"

“Para viver é preciso ter horizonte, uma estrela, um rumo. A grande causa dos americanos é a integração para ser alguém em um mundo cada vez mais poderoso", disse Mujica sobre a integração entre os cidadãos do continente. "A vantagem da integração é o desenvolvimento, juntar o conhecimento".

"Nunca triunfamos totalmente na vida, o verdadeiro triunfo é o caminhar", filosofou o ex-presidente uruguaio. "Não há um prêmio no final da vida, o prêmio é a vida, viver com causa, com sentimento e que se tenha a coragem de viver a aventura."

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Análise

Patentes na OMC é uma derrota para os países do Sul Global

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Pandemia de covid-19 reativou a debate sobre a quebra de patentes para medicamentos e vacinas. Apesar de sua união em torno do tema, países subdesenvolvidos sofreram uma derrota

Alessandra Monterastelli

Outras Palavras Outras Palavras

2022-07-06T22:35:00.000Z

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No dia 17 de junho, saiu fumaça branca das chaminés da Organização Mundial do Comércio (OMC). A entidade, responsável pela regulação de patentes internacionais, anunciou que chegara a uma conclusão sobre as vacinas contra o coronavírus. Tratava-se do pedido de isenção do acordo TRIPS – sigla em inglês para Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio. Firmado na virada do século, tal compromisso obriga os países-membros da OMC a adotar padrões mais rigorosos de proteção patentária. Consequentemente, encarece o acesso às inovações tecnológicas, inclusive no setor farmacêutico. Mas a decisão final foi amplamente criticada por ativistas da saúde e movimentos populares em todo o mundo, já que a OMC rejeitou a isenção total do TRIPS. 

Em 2020, diante da disseminação do novo coronavírus, África do Sul e Índia protocolaram a proposta de isenção do Acordo, que obteve amplo apoio dos países em desenvolvimento e de baixa renda – com exceção do Brasil. A nova decisão foi saudada pelo Secretariado da OMC e por representantes de países ricos como um resultado sem precedentes, mas ativistas condenam que, na prática, a decisão não atende as necessidades mínimas da maior fatia do mundo. “Houve um esvaziamento da proposta pelos países mais ricos. O texto perdeu totalmente sua força, não trouxe nada novo”, explica Felipe Carvalho, Coordenador Regional da Campanha de Acesso do Médicos Sem Fronteiras ao Outra Saúde.

A conclusão do órgão concedeu uma exceção temporária à restrição das quantidades de vacinas que podem ser exportadas sob licença compulsória; diagnósticos e tratamentos não estão incluídos e devem obedecer ao limite de exportação durante o tempo de licença compulsória – decretada durante emergências sanitárias, como é o caso da pandemia. Além disso, a concessão vale apenas para responder à covid-19 e não tem validade diante de outras crises de saúde. O acordo final não inclui o compartilhamento de segredos comerciais e know-how de fabricação, o que prejudicará a produção de vacinas com tecnologia avançada por países de baixa renda – como é o caso dos imunizantes de RNA.

Carvalho conta que o problema é abordado com frequência em reuniões escpecais da OMS e da ONU.  “Existe um consenso entre especialistas e órgãos multilaterais de que as patentes causam constantes crises de acesso e inovação na saúde”. Em maio, o The Guardian divulgou que a Pfizer lucrou 25,7 bilhões de dólares só no início de 2022 – mais da metade do valor está relacionado à venda de vacinas contra a covid-19. Tim Bierley, ativista do Global Justice Now, denunciou ao jornal britânico que apesar do apelo da Organização Mundial da Saúde (OMS) e de outras organizações, a farmacêutica seguia se recusando a compartilhar a tecnologia de produção do imunizante. O diretor da OMS, Tedros Adhanon, afirmou em 2021 que a pandemia estava sendo prolongada por uma “escandalosa desigualdade” diante do acúmulo de doses de imunizantes por países ricos enquanto países pobres não conseguiam avançar em sua meta de vacinação em massa. 

“Desde a criação do acordo TRIPs nós temos um cenário de constantes crises de acesso a medicamentos essenciais”, conta Felipe. Ele relembra o caso emblemático da epidemia de HIV/AIDS, na década de 1990. “Em 1996 surgiu a primeira terapia para a doença. As pessoas pararam de morrer e passaram a conviver com o vírus. Mas essa terapia não chegou nos países onde o cenário era mais grave”, explica. O ano de 1996 foi também quando o acordo TRIPS entrou em vigor, após sua criação em 1994 e preparação em 1995. “A partir daí se criou uma coalizão na sociedade civil, da qual fazemos parte, chamada Movimento de Luta pelo Acesso a Medicamentos. A pergunta era: por que os preços eram tão altos e o tratamento se tornava inacessível para milhões de pessoas? Nos aprofundamos no sistema de patentes e entendemos que o monopólio era a causa”, relembra.

Apesar do TRIPS possuir cláusulas que permitem flexibilizações, elas são de difícil utilização devido a dois fatores principais: sua não-incorporação completa em leis de países-membros e a pressão que as farmacêuticas exercem sobre as decisões da OMC. Na década de 1990, diante da grave situação vivida na África do Sul – país com maior número de mortes pela AIDS na época – o governo então liderado por Nelson Mandela aprovou uma das medidas previstas no TRIPS para importar genéricos. Na ocasião, Mandela sofreu o processo de 39 farmacêuticas que se opuseram à decisão tomada para conter a crise de saúde pública. Apesar da derrota das corporações na justiça, “esse é um exemplo de como essas empresas e seus países-sede tentam barrar as normas legítimas existentes no TRIPS”, exemplifica Carvalho.

A OMC é uma instituição formada por 164 membros e opera com base na tomada de decisões por consenso. “A OMC falhou em fornecer uma isenção. O acordo coloca os lucros à frente das vidas e mostra que o atual regime de propriedade intelectual falha em proteger a saúde e promover a transferência de tecnologia. Essa não-renúncia estabelece um mau precedente para futuras pandemias e continuará a colocar vidas em risco” declarou Lauren Paremoer, médica e integrante do Peoples’ Health Movement na África do Sul. 

A Health Action International, referência no trabalho para expandir o acesso a medicamentos essenciais, argumentou em nota que a decisão da OMC impõe obstáculos ao licenciamento compulsório, uma das poucas flexibilidades existentes no TRIPS, em troca de uma abertura tímida para a facilitação da exportação de vacinas. Outras entidades representantes da sociedade civil já denunciaram a atuação dos países ricos e vêm aumentando a pressão sobre os governos. O objetivo, segundo seus porta-vozes, é que sejam tomadas medidas concretas para desafiar as regras de monopólio farmacêutico da OMC e garantir mais acesso a medicamentos e tecnologias. 

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