O presidente eleito da Colômbia, Juan Manuel Santos, assume hoje (7/8) o governo. Sucessor de Álvaro Uribe, que por oito anos permaneceu no poder e sai da Casa de Nariño a contragosto, após buscar um terceiro mandato, Santos parece querer dar vida própria à gestão que se inicia, em vez de ser uma prolongação do “uribismo”.
O ex-presidente Ernesto Samper analisou as recentes movimentações de Santos como “passos legítimos para assegurar sua governabilidade”, os quais “não precisam coincidir com os de Uribe”. Por sua vez, o ex-assessor presidencial José Obdulio Gaviria, apontou que “Santos está traçando uma política que depende dos mesmos elementos definidos por Uribe”, e que “não há antagonismo ou diferença”, pois os dois “representam a mesma corrente política”.
Efe
Juan Manuel Santos e Álvaro Uribe: seria o presidente eleito um fantoche do uribismo?
Na opinião de especialistas entrevistados pelo Opera Mundi, existem três diferenças fundamentais que Santos estabeleceu com Uribe desde a histórica vitória no segundo turno, em junho, com 69% dos votos: a tentativa de aproximação com países latino-americanos, a promessa de respeito com a divisão dos poderes e a nomeação de um gabinete ministerial com marca própria e figuras contrárias a Uribe.
Ex-ministro da Defesa e idealizador de ambiciosas operações de combate às FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), Santos convidou o presidente venezuelano, Hugo Chávez, para sua posse e, posteriormente, com a quebra das relações diplomáticas entre Venezuela e Colômbia, optou pelo silêncio. Naquele momento, o presidente eleito iniciava um giro pela América Latina com o objetivo de estreitar laços de seu país com governos com os quais a administração de Uribe se afastou.
“Por um lado, com as aproximações a Chávez e [Rafael] Correa; por outro, com longas viagens pela Europa e América Latina, que deram um tom internacional a sua presidência ainda antes da posse, Santos impõe profundas diferenças com Uribe”, afirma a cientista política Marcela Botero, diretora do Instituto de Ciência Política e da revista Perspectiva.
Uribe, idealizador das acusações de que Caracas abriga guerrilheiros das FARC e do ELN (Exército de Libertação Nacional), chegou a criticar a diplomacia de Santos, a qual qualificou de “cosmética e de aparências” além de “dócil e idiota”.
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Importante lembrar que Santos concede especial importância à política exterior em grande parte devido à experiência que tem com o tema. Foi lobista da federação colombiana do café, representante da entidade junto à Organização Internacional do Café, com sede em Londres, e depois presidente desta entidade, onde manteve contato com líderes mundiais. Depois, como ministro de Comércio Exterior, se dedicou a abrir mercados aos produtos colombianos.
Logo no discurso da vitória, em junho, Santos estabeleceu outra dissonância com o mentor: “meu interesse é o de respeitar integralmente a separação dos poderes públicos”. A frase, dita para assegurar que não intervirá na eleição dos novos presidentes do Senado e da Câmara, pode ser estendida ao poder Judiciário, com o qual Uribe manteve guerra declarada.
De acordo com a cientista política, “a aproximação aos altos tribunais e seu claro interesse em restaurar as relações depois dos dramáticos choques com o Executivo da era uribista, se deve ao genuíno respeito que Santos tem pelo estado de direito, que inclui o equilíbrio e a independência entre os poderes públicos.”
Após ser aprovado no Senado em setembro de 2009, a Corte Constitucional da Colômbia declarou ilegal o referendo que poderia ter autorizado Uribe a disputar um terceiro mandato consecutivo. Com o veredito dado no final de fevereiro, a Corte citou irregularidades que iam desde o financiamento da consulta popular à controversa aprovação do plebiscito no Congresso.
Gabinete
Finalmente, a nomeação do gabinete ministerial. Analistas concordam que são pelo menos três os ministros de Santos que enviam uma forte mensagem política de distanciamento do uribismo.
María Ángela Holguín, nomeada para o Ministério de Relações Exteriores, foi o primeiro nome a enfurecer os setores do uribismo, explica Maria Botero. Além de manter um fluente diálogo com o governo venezuelano, foi nomeada por Uribe embaixadora da Colômbia na ONU, mas renunciou em 2005 em protesto contra a nomeação de três filhos de políticos para sua embaixada, como pagamento de favores por parte do então presidente. Ela denunciou a manobra imediatamente.
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O futuro ministro da Agricultura, Juan Camilo Restrepo, destaca-se como um crítico aberto das iniciativas do governo que se encerra, especialmente na gestão do ministério que ele agora chefiará e no programa “Agro, Renda Segura”. Além disso, sua história torna crível a promessa de Santos de promover uma verdadeira política de restituição de terras aos deslocados, uma das prioridades do programa dos primeiros 100 dias de governo.
Restrepo terá de trabalhar com outro homem de Santos, Alejandro Reyes, autor, entre outros, do livro Guerreros y campesinos, el despojo de la tierra en Colombia. Reyes foi encarregado por Santos de preparar um projeto de lei que facilite a restituição de 1,7 milhão de hectares tomados dos camponeses pelos grupos armados.
Germán Vargas Lleras, líder do partido Mudança Radical e ex-candidato à presidência, será o ministro do Interior. Antes, ele foi citado como possível ministro da Defesa. Na ocasião, pessoas próximas de Uribe confessaram que, se Santos nomeasse Vargas Lleras para a Defesa, o ex-presidente abandonaria o país. Uribe sentiu que sua segurança não estaria garantida com Lleras no comando das forças armadas. Os uribistas culpam Vargas Lleras por ter se oposto à reeleição de Uribe. Em retaliação, o governo Uribe enfraqueceu a Mudança Radical a ponto de cooptar seus eleitos para as fileiras do Partido do U.
Em dissonância com outros nomes, em seu lugar no Ministério da Defesa entra Rodrigo Rivera, ex-pré-candidato liberal que se alinhou ao uribismo como um dos mais fervorosos defensores da reeleição. Assim que a candidatura de Santos foi oficializada, Uribe posicionou Rivera no entourage do novo presidente. Segundo vários analistas, com a nomeação de Rivera, Santos esvazia qualquer crítica do ex-presidente ao manejo de sua doutrina, que fica sob o comando de um homem de sua confiança.
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