Os Estados Unidos solicitaram a extradição do empresário colombiano Alex Saab à Procuradoria Geral de Cabo Verde, país no qual o cidadão naturalizado venezuelano está preso desde o dia 12 de junho. Saab estava de viagem a serviço do governo da Venezuela e foi detido a pedido da Interpol durante uma parada técnica do avião que o transportava.
Para o jurista brasileiro Pedro Serrano, o fato de não haver um tratado de extradição entre Cabo Verde e os EUA “não possibilita” o envio de Saab ao território norte-americano. “Os EUA não podem querer mandar no território de Cabo Verde, querendo determinar quem o país deve ou não prender. O mais grave, entretanto, é a violação da missão diplomática. Uma representação diplomática é intangível, não está sujeita à jurisdição local de cada país. Não só o chanceler, mas qualquer funcionário a serviço de um Estado que viaja em missão diplomática não pode ser preso, mesmo que cometa um crime”, afirmou o jurista.
Segundo o professor de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), a própria a prisão de Saab “é um sequestro”, uma vez que o empresário viajava em missão diplomática. “Em uma missão diplomática, o avião é um pedaço da nação venezuelana. A prisão de um representante diplomático é absolutamente irregular. É um sequestro. As autoridades de Cabo Verde deveriam ter deixado o avião abastecer e prosseguir. Não é um fator político. Eu sou crítico ao governo da Venezuela, mas isso é um fator de soberania”, diz .
O pedido de extradição foi feito no dia 30 de junho, segundo informações da emissora cabo verdiana RTC. De acordo com o governo venezuelano, a prisão de Saab viola o direito e as normas internacionais, já que o empresário viajava na condição de “agente do governo da Venezuela e possuía imunidade diplomática”.
“O Sr. Saab, como agente do governo Bolivariano da Venezuela, se encontrava em trânsito pela República de Cabo Verde, durante uma escala técnica para continuar seu trajeto com o objetivo de realizar gestões para garantir a obtenção de alimentos para os Comitês Locais de Alimentação e Produção (Clap), assim como medicamentos, insumos médicos e outros bens de caráter humanitário para a atenção à pandemia da covid-19”, informou a chancelaria da Venezuela em nota.
Ainda de acordo com o Ministério de Relações Exteriores do país, a operação que prendeu Saab ocorreu de maneira irregular, uma vez que “no dia 12 de junho [dia da prisão] não existia código vermelho vigente no sistema” da Interpol.
“Após sua detenção arbitrária, no dia 13 de junho a Interpol emite uma extemporânea ordem de captura para justificar a prisão, sem levar em consideração a imunidade diplomática [de Saab]”, diz a chancelaria.
Polícia Nacional Cabo Verde/Reprodução
Saab foi preso em Cabo Verde no dia 12 de junho
Os Estados Unidos acusaram de lavagem de dinheiro uma operação realizada pelo empresário de compra de alimentos no exterior para as lojas Clap, que fazem parte da rede de abastecimento alimentar da Venezuela. Há acusações contra Saab também na Colômbia. Além disso, o cidadão naturalizado venezuelano foi alvo de sanções por parte do governo norte-americano em 2019 e teve alguns bens congelados.
Transferido para a ilha de São Vicente, Saab já se queixou das más condições da cela que ocupa na prisão, afirmando que recebeu maus tratos e relatando forte presença de mosquitos, formigas e outros fatores de insalubridade.
Segundo a agência cabo verdiana Inforpress, familiares de Saab fizeram um apelo ao presidente do país, Jorge Carlos Fonseca, denunciando as condições insalubres da prisão e pedindo a soltura imediata do empresário.
“Mais preocupante ainda é o fato de sabermos que ele sofreu tratamentos cruéis e desumanos, que dão origem a preocupações pela sua segurança. Exortamos as autoridades cabo verdianas a investigar urgentemente o assunto e a fornecer-nos, a nós e ao povo venezuelano, garantias absolutas sobre o bem-estar de Alex”, afirmam.
Após o pedido de extradição, o presidente de Cabo Verde se recusou a comentar a situação da prisão de Saab e as irregularidades cometidas pelas autoridades do país durante a operação.
“A única coisa que posso dizer é que, como presidente de Cabo Verde, e sendo Cabo Verde uma democracia, sempre achei e continuo a achar que, em quaisquer circunstâncias, seja qual for o dossiê, qualquer que seja a sua complexidade, as suas implicações, nós temos que funcionar como um Estado democrático de direito”, disse.
O mandatário ainda acrescentou que Saab “tem que ter, nomeadamente, acesso a todas as garantias de defesa que a Constituição exige para qualquer pessoa detida em qualquer processo judicial”.