“[Os arquivos vazados] demonstram que o governo mentiu sistematicamente, não apenas para a sociedade, mas também para o Congresso, sobre um assunto de interesse e significado nacional”. A frase do jornal norte-americano The New York Times não diz respeito aos maiores vazamentos de arquivos militares do mundo, ocorridos este ano: os “Diários da Guerra do Iraque” e os “Diários da Guerra do Afeganistão”.
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Faz referência aos “Papeis do Pentágono”, documentos sobre a Guerra do Vietnã classificados como ultra secretos, que vazaram em 1971 e revelaram informações que as autoridades norte-americanas ocultavam da sociedade. Os EUA realizavam ações com o propósito de provocar uma resposta dos vietnamitas, que seria usada para justificar uma maior participação do país na guerra.
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“Os Papeis do Pentágono de Daniel Ellsberg alertaram o público norte-americano para informações erradas que eles estavam recebendo sobre o Vietnã, o que deu maior força para o movimento contra a guerra que estava crescendo”, lembra o diretor do Middle East Policy Council, Thomas Mattais. Daniel Ellsberg, hoje com 79 anos, é o responsável pelo vazamento. Na época, ele trabalhava para o Pentágono e recomendava a retirada das tropas do Vietnã.
Hoje, Ellsberg tem defendido publicamente o vazamento dos dados das guerras do Iraque e do Afeganistão pelo Wikileaks. “Não há nada dessa dimensão desde os Papeis do Pentágono (…) Parece muito provável, em minha opinião, que depois de examinarmos todas essas milhares de páginas, nós não encontremos nenhuma base razoável que nos leve a crer que nós teremos mais sucesso se investirmos mais recursos”, disse Ellsberg em entrevista para a BBC, novamente defendendo a retirada.
Ellsberg também tem pregado a libertação de Bradley Manning, ex-analista de inteligência do exército no Iraque, suspeito de ser o responsável pelo vazamentos dos “Diários”. Manning foi preso em maio de 2010 e atualmente está confinado na solitária. Se condenado, pode pegar mais de 50 anos de prisão. Para defendê-lo, foi criada uma rede de apoio com o slogan: “expor crimes de guerra não é crime”.
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Apesar de ter servido como munição para o movimento contra a Guerra do Vietnã, os Papeis do Pentágono não surtiram efeito na política externa dos EUA. No ano seguinte ao vazamento, Nixon acentuou a guerra com novos bombardeios. A guerra só acabou em 1975.
O mesmo pode acontecer com os conflitos no Oriente Médio, acredita Mattais. “Eu não estou certo de que esses vazamentos vão ter muita influência em uma possível guerra com o Irã. Nos EUA, há uma pressão doméstica considerável para que o país tome fortes medidas contra o Irã, e poucos pensamentos sérios sobre as negativas consequências que essa guerra poderia trazer. Incrível, mas verdade!”. Os Diários do Iraque também relatam que o Irã financiou e armou milícias iraquianas.
Parte da opinião pública norte-americana está completamente ausente da discussão sobre as guerras no Iraque e no Afeganistão, comenta Cristina Pecequilo, professora de Relações Internacionais da Unifesp. “Eles estão mais preocupados com a recuperação da economia após a crise, com a reforma da saúde”.
Os dois pesquisadores também não acreditam que a postura dos EUA deve mudar para prevenir violações aos direitos humanos nos país onde atua militarmente. “Entre o que a Casa Branca fala e faz há uma grande distância. Não vejo compromisso real do país em condenar essas práticas”, diz Pecequilo. “Infelizmente, houve abusos com direitos humanos por foças -norteamericanas. Mas não tenho certeza que o comando militar norte-americano possa interromper isso. O melhor seria não entrar nessas guerras, em primeiro lugar”, opina Mattais.
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