O ex-presidente do Equador Rafael Correa defendeu, em live nesta sexta-feira (06/05), a criação de um novo sistema de justiça latino-americano para combater o uso do poder judiciário como instrumento de perseguição política.
“Se eu estivesse no Equador eu estaria preso ou provavelmente morto”, comentou o ex-chefe de Estado, que vive em condição de exilado político na Bélgica.
No último dia 15 de abril a Justiça equatoriana emitiu novo pedido de extradição contra Correa, acusando-o de financiamento ilícito de campanha e recebimento de subornos de construtoras, entre elas, a brasileira Odebrecht. Correa foi presidente do Equador por dois mandatos, entre 2007 e 2017. O processo, aberto em 2017, é denunciado como mais um caso de lawfare – perseguição político-judicial.
“Na minha sentença, na falta de provas, disseram que minha influência sobre as pessoas que cometeram delitos foi psíquica. Em seguida todo o tribunal foi reformado num golpe brando em 2018, portanto sequer temos uma instância para recorrer”, comentou Correa durante o programa Trilhas da Democracia, transmitido pelo canal do Brasil de Fato.
“O lawfare foi aplicado nos últimos anos aos diferentes líderes progressistas que não conseguiram derrotar nas urnas: Brasil, Bolívia Argentina, Paraguai, Equador. Isso não é casualidade, faz parte da estratégia”, denuncia Correa.
E continua “Como isso se resolve? Recuperando o poder político, como o Evo [Morales] fez na Bolívia, porque tudo é política”, diz. A volta do Movimento ao Socialismo (MAS-IPSP) ao governo, com a vitória eleitoral de Luis Arce, permitiu a abertura de investigações sobre o golpe de Estado. A ex-presidente golpista, Jeanine Áñez, está em prisão preventiva e sob processo judicial acusada de terrorismo e conspiração.
A perseguição político-judicial alterou cenários eleitorais na Bolívia, com o golpe de outubro-novembro de 2019; na Argentina, com as denúncias que pesaram contra a atual vice-presidente Cristina Kirchner e favoreceram a eleição de Maurício Macri, em 2019; e no Brasil, com a Operação Lava Jato, que prendeu o ex-presidente Lula da Silva e o impossibilitou de disputar as eleições de 2018.
O Supremo Tribunal Federal (STF) anulou todas as decisões da Lava Jato e considerou que a atuação do ex-juiz Sérgio Moro foi parcial. O ex-procurador Delton Dallagnol foi condenado a pagar multa de R$ 75 mil por danos morais ao ex-presidente Lula.
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‘Acredito que sejam necessárias revoluções e não evoluções,’ afirma o ex-presidente do Equador
Além disso, no dia 28 de abril, o Comitê de Direitos Humanos da ONU deu um prazo de 180 dias para que o Estado brasileiro repare danos causados ao ex-mandatário pela manipulação judicial e prisão injusta.
Para Correa, as decisões recentes favoráveis a Lula mostram um caminho para exigir justiça. “Precisamos de sistemas de justiça interamericanos e latino-americanos que verifiquem o respeito aos direitos humanos. A contradição do sistema atual é que sua sede está em Washington […]. E como queremos fazer uma política voltada para nossos países, eles [EUA] nos veem como inimigos”, destacou.
A Comissão e a Corte Interamericana de Direitos Humanos são braços da Organização dos Estados Americanos (OEA) e passaram por renovação em novembro de 2021.
Os membros eleitos para o período 2022-2025 foram Roberta Clarke, de Barbados, o colombiano Carlos Bernal Pulido e o mexicano Joel Hernández García, reeleito para o cargo. Já para a Corte de Direitos Humanos foram indicados Rodrigo Bittencourt Mydrovitsch, pelo Brasil, a argentina Verónica Gómez, a costarricense Nancy Hernández López e a chilena Patricia Pérez Goldberg.
No entanto, a legitimidade da OEA tem sido questionada pelos novos governos progressistas da região, que denunciam sua conivência e até apoio a golpes de Estado, como no caso boliviano.
Mesmo apontando as críticas, para Correa “a nova esquerda” tem um desafio ainda maior do que os governos da primeira década do século 21, porque enfrentam “uma direita armada”. Mas o ex-mandatário acredita na restauração de alianças regionais, como a Comunidade de Estados Latino-americanos e Caribenhos (Celac) e a União dos países da América do Sul (Unasul) para contrapor a política exterior dos EUA.
“A eleição de Lula no Brasil muda o balanço geopolítico, ainda mais se temos López Obrador, no México, e Fernández na Argentina. Ter governos progressistas nas três ou quatro maiores economias da região muda a correlação política”, defende Correa.