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Política e Economia

'Existe em média um assassinato em massa por dia nos EUA', diz cientista político

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Especialista em Estados Unidos, Didier Combeau explica que existem muitos casos que não são noticiados; 'só ouvimos falar daqueles que deixam muitos mortos'

Redação

RFI RFI

2022-05-26T17:28:00.000Z

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A morte de 19 crianças no Texas, fuziladas a sangue frio por um adolescente de 18 anos, provocou revolta nos Estados Unidos. O presidente norte-americano, Joe Biden, declarou que estava enojado e cansado da sequência de assassinatos trágicos no país. O episódio relança o debate sobre o acesso legalizado às armas de fogo, mas a população norte-americana é profundamente apegada à esse “direito à autodefesa”, como explicou à RFI Didier Combeau, cientista político francês especializado nos Estados Unidos.

“Uma boa parte dos norte-americanos acreditam que o porte de armas faz parte de um ideal democrático”, explica o cientista político Didier Combeau. “Trata-se dessa pequena parte de poder que pode ter cada cidadão, que permite a cada um deles supostamente pegar em armas caso o governo se torne autoritário. Isso remete à guerra da independência e à formação dos Estados Unidos enquanto país, quando os norte-americanos se rebelaram contra a tirania do rei da Inglaterra”, diz o especialista.

Um senador do Texas chegou a declarar que o porte de armas não era um problema e, após esse novo assassinato em massa, propôs deslocar "policiais armados para as escolas". Uma declaração parecida com a do ex-presidente norte-americano Donald Trump que disse, na ocasião dos ataques terroristas à casa noturna Bataclan, em Paris, “que se os franceses estivessem armados, eles teriam conseguido acabar com os atiradores mais rápido”, lembra Combeau.  

“Há pessoas que defendem que até os professores se armem, o que é uma hipótese completamente absurda”, avalia o cientista político. “Imagine se um professor tiver uma pistola ativada em sua bolsa e um aluno pega essa arma... Seria extremamente perigoso”, diz. “Muito frequentemente as armas são apresentadas como seu próprio antídoto nos Estados Unidos”, avalia.

Combeau lembra que o autoproclamado “direito à autodefesa” também tem uma importância para boa parte da população. “Quando se fala em autodefesa nos Estados Unidos, significa a defesa da comunidade. Então existe quase um dever cívico nesse direito à autodefesa”, contextualiza. “Existe em média um assassinato em massa por dia nos Estados Unidos, mas só ouvimos falar daqueles que deixam muitos mortos. Estive há pouco tempo em Sacramento, na Califórnia, por exemplo, onde havia acontecido uma matança que deixou seis mortos”, relata o especialista em entrevista à RFI.

Flickr
Operação policial dentro do Texas, nos Estados Unidos, em 2019

“Para conseguir adotar uma lei federal [contra o porte de armas] seria necessário convencer os senadores a votar nela. Mas existe um sistema de obstrução no Senado [norte-americano] que pode exigir que 65% dos senadores votem por essa lei, e os democratas possuem apenas 55% das cadeiras”, afirma Combeau.

É impossível que uma lei como essa possa ser adotada e, mesmo se ela conseguisse passar, esperamos nos próximos meses uma decisão da Corte Suprema que pode decidir que a Segunda Emenda da Constituição proíbe desregulamentar o porte de armas no país”, explica. “Ou seja, é muito difícil fazer passar uma lei como essa e, mesmo se ela for adotada, pode ser considerada inconstitucional”, resume o cientista político.

“Há certamente muita pressão por parte do porte de armas”, diz Combeau. “A National Rifle Association [NRA na sigla em inglês] dá notas aos candidatos [a cargos políticos] de acordo com seu posicionamento em relação às armas, como alunos de escola”, diz. “E como há uma pequena porcentagem de norte-americanos que se determina [politicamente] unicamente sobre esse assunto, é preciso lembrar que se trata de uma minoria, mas que pode mudar o resultado das eleições”, avalia.

“Além disso, há um enfrentamento cada vez maior entre democratas e republicanos sobre a questão. Isso faz parte da guerra cultural, tudo isso remete a uma questão de identidade. Do lado republicano, acredita-se que ter uma arma faz parte da identidade norte-americana e que, se retirarmos as armas, retira-se também um pedaço dessa identidade. Do outro lado, os democratas, se têm uma visão completamente diferente”, conta.

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Análise

Patentes na OMC é uma derrota para os países do Sul Global

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Pandemia de covid-19 reativou a debate sobre a quebra de patentes para medicamentos e vacinas. Apesar de sua união em torno do tema, países subdesenvolvidos sofreram uma derrota

Alessandra Monterastelli

Outras Palavras Outras Palavras

2022-07-06T22:35:00.000Z

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No dia 17 de junho, saiu fumaça branca das chaminés da Organização Mundial do Comércio (OMC). A entidade, responsável pela regulação de patentes internacionais, anunciou que chegara a uma conclusão sobre as vacinas contra o coronavírus. Tratava-se do pedido de isenção do acordo TRIPS – sigla em inglês para Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio. Firmado na virada do século, tal compromisso obriga os países-membros da OMC a adotar padrões mais rigorosos de proteção patentária. Consequentemente, encarece o acesso às inovações tecnológicas, inclusive no setor farmacêutico. Mas a decisão final foi amplamente criticada por ativistas da saúde e movimentos populares em todo o mundo, já que a OMC rejeitou a isenção total do TRIPS. 

Em 2020, diante da disseminação do novo coronavírus, África do Sul e Índia protocolaram a proposta de isenção do Acordo, que obteve amplo apoio dos países em desenvolvimento e de baixa renda – com exceção do Brasil. A nova decisão foi saudada pelo Secretariado da OMC e por representantes de países ricos como um resultado sem precedentes, mas ativistas condenam que, na prática, a decisão não atende as necessidades mínimas da maior fatia do mundo. “Houve um esvaziamento da proposta pelos países mais ricos. O texto perdeu totalmente sua força, não trouxe nada novo”, explica Felipe Carvalho, Coordenador Regional da Campanha de Acesso do Médicos Sem Fronteiras ao Outra Saúde.

A conclusão do órgão concedeu uma exceção temporária à restrição das quantidades de vacinas que podem ser exportadas sob licença compulsória; diagnósticos e tratamentos não estão incluídos e devem obedecer ao limite de exportação durante o tempo de licença compulsória – decretada durante emergências sanitárias, como é o caso da pandemia. Além disso, a concessão vale apenas para responder à covid-19 e não tem validade diante de outras crises de saúde. O acordo final não inclui o compartilhamento de segredos comerciais e know-how de fabricação, o que prejudicará a produção de vacinas com tecnologia avançada por países de baixa renda – como é o caso dos imunizantes de RNA.

Carvalho conta que o problema é abordado com frequência em reuniões escpecais da OMS e da ONU.  “Existe um consenso entre especialistas e órgãos multilaterais de que as patentes causam constantes crises de acesso e inovação na saúde”. Em maio, o The Guardian divulgou que a Pfizer lucrou 25,7 bilhões de dólares só no início de 2022 – mais da metade do valor está relacionado à venda de vacinas contra a covid-19. Tim Bierley, ativista do Global Justice Now, denunciou ao jornal britânico que apesar do apelo da Organização Mundial da Saúde (OMS) e de outras organizações, a farmacêutica seguia se recusando a compartilhar a tecnologia de produção do imunizante. O diretor da OMS, Tedros Adhanon, afirmou em 2021 que a pandemia estava sendo prolongada por uma “escandalosa desigualdade” diante do acúmulo de doses de imunizantes por países ricos enquanto países pobres não conseguiam avançar em sua meta de vacinação em massa. 

“Desde a criação do acordo TRIPs nós temos um cenário de constantes crises de acesso a medicamentos essenciais”, conta Felipe. Ele relembra o caso emblemático da epidemia de HIV/AIDS, na década de 1990. “Em 1996 surgiu a primeira terapia para a doença. As pessoas pararam de morrer e passaram a conviver com o vírus. Mas essa terapia não chegou nos países onde o cenário era mais grave”, explica. O ano de 1996 foi também quando o acordo TRIPS entrou em vigor, após sua criação em 1994 e preparação em 1995. “A partir daí se criou uma coalizão na sociedade civil, da qual fazemos parte, chamada Movimento de Luta pelo Acesso a Medicamentos. A pergunta era: por que os preços eram tão altos e o tratamento se tornava inacessível para milhões de pessoas? Nos aprofundamos no sistema de patentes e entendemos que o monopólio era a causa”, relembra.

Apesar do TRIPS possuir cláusulas que permitem flexibilizações, elas são de difícil utilização devido a dois fatores principais: sua não-incorporação completa em leis de países-membros e a pressão que as farmacêuticas exercem sobre as decisões da OMC. Na década de 1990, diante da grave situação vivida na África do Sul – país com maior número de mortes pela AIDS na época – o governo então liderado por Nelson Mandela aprovou uma das medidas previstas no TRIPS para importar genéricos. Na ocasião, Mandela sofreu o processo de 39 farmacêuticas que se opuseram à decisão tomada para conter a crise de saúde pública. Apesar da derrota das corporações na justiça, “esse é um exemplo de como essas empresas e seus países-sede tentam barrar as normas legítimas existentes no TRIPS”, exemplifica Carvalho.

A OMC é uma instituição formada por 164 membros e opera com base na tomada de decisões por consenso. “A OMC falhou em fornecer uma isenção. O acordo coloca os lucros à frente das vidas e mostra que o atual regime de propriedade intelectual falha em proteger a saúde e promover a transferência de tecnologia. Essa não-renúncia estabelece um mau precedente para futuras pandemias e continuará a colocar vidas em risco” declarou Lauren Paremoer, médica e integrante do Peoples’ Health Movement na África do Sul. 

A Health Action International, referência no trabalho para expandir o acesso a medicamentos essenciais, argumentou em nota que a decisão da OMC impõe obstáculos ao licenciamento compulsório, uma das poucas flexibilidades existentes no TRIPS, em troca de uma abertura tímida para a facilitação da exportação de vacinas. Outras entidades representantes da sociedade civil já denunciaram a atuação dos países ricos e vêm aumentando a pressão sobre os governos. O objetivo, segundo seus porta-vozes, é que sejam tomadas medidas concretas para desafiar as regras de monopólio farmacêutico da OMC e garantir mais acesso a medicamentos e tecnologias. 

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