O presidente Jair Bolsonaro foi recebido nesta quinta-feira (09/06) pelo líder norte-americano, Joe Biden, na ocasião da Cúpula das Américas, realizada em Los Angeles, na Califórnia.
Em um breve pronunciamento antes do início da reunião a portas fechadas, Biden afirmou aos jornalistas que o Brasil é uma “democracia vibrante”, e fez uma defesa sutil do sistema eleitoral brasileiro, ao dizer que o país possui “instituições eleitorais sólidas”.
Bolsonaro adotou um tom ameno e foi até amigável com o norte-americano, o chamando, a certa altura, de “companheiro”. Ele ressaltou a importância da parceria entre os dois países, e assegurou a Biden que sempre vai optar pelas vias democráticas.
“Para que não sobre nenhuma dúvida depois. Tenho certeza que ele será realizado nesse espírito democrático. Cheguei pela democracia e tenho certeza de que quando deixar o governo também será de forma democrática”, afirmou.
O brasileiro, porém, deixou no ar uma crítica ao sistema eleitoral brasileiro, dizendo que seu desejo é que haja “eleições limpas, confiáveis e auditáveis” no Brasil.
“Temos muito em comum, como nosso amor compartilhado pela liberdade e democracia”, afirmou. Como é habitual em seus pronunciamentos em eventos internacionais, Bolsonaro enalteceu as riquezas naturais do Brasil, mas forneceu algumas informações duvidosas sobre a situação do meio ambiente no país.
“Por vezes, nos sentimos ameaçados em nossa soberania, mas o Brasil preserva seu território. Mais de 85% da Amazônia brasileira é preservada, nossa legislação ambiental é muito rígida”, afirmou.
Desafios eleitorais
Este foi o primeiro encontro entre os dois presidentes desde que Biden chegou à Presidência dos EUA, em janeiro de 2021. A Casa Branca considera o brasileiro como uma figura politicamente “tóxica”, mas o esvaziamento da Cúpula das Américas em razão da ausência de líderes de nações importantes na região, como o México, fez com que Biden estendesse o convite ao Palácio do Planalto.
Para garantir a presença do Brasileiro, Biden aceitou a realização de um encontro bilateral paralelo à Cúpula. Os líderes, embora tenham objetivos diferentes no evento, têm em comum o fato de enfrentarem este ano eleições decisivas para as pretensões políticas de ambos.
Em apenas cinco meses, o norte-americano enfrentará as eleições legislativas, na qual muitos analistas avaliam que seu partido arrisca perder a frágil maioria que possui atualmente no Congresso.
Bolsonaro, por sua vez, corre sério risco de não conseguir se reeleger. Pesquisas de opinião o colocam bem atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva nas intenções de voto. Alguns levantamentos sinalizam a possibilidade de uma derrota já no primeiro turno das eleições.
O presidente brasileiro ainda demonstra mágoa por ter sido ignorado por Biden e pelos demais líderes internacionais da reunião do G20, em 2019 no Japão. “Passou por mim como se eu não existisse”, se queixou, repetindo algumas teorias populares na extrema direita norte-americana, de que o líder da Casa Branca estaria senil.
Fiel à cartilha de Trump
Bolsonaro, um admirador declarado do ex-presidente republicano Donald Trump, chegou a contestar o resultado das eleições presidenciais norte-americanas.
Evan Vucci/AP Photo/picture alliance
Bolsonaro (esquerda) e Biden (direita) se encontraram pela 1ª vez na Cúpula das Américas
O brasileiro repetiu alegações alardeadas por Trump, até hoje não comprovadas, de que teria havido fraude na votação. A atitude gerou repulsa na Casa Branca, que colocou o Brasil em segundo plano de sua diplomacia.
Desde o início de seu governo, Biden deixou as comunicações com o governo Bolsonaro a cargo de seu gabinete, e buscou uma aproximação com o presidente argentino, Alberto Fernández, inclusive o convidando para visitar a Casa Branca em julho próximo.
Antes mesmo de ser eleito, Biden já criticava as políticas ambientais do governo brasileiro e expressava preocupações com o estado da democracia no Brasil.
O governo norte-americano se manifestou em diversas ocasiões contra as declarações de Bolsonaro que buscam lançar dúvidas sobre o sistema eleitoral brasileiro.
Sua ameaça de não aceitar o resultado do pleito caso seja derrotado é vista como uma réplica das atitudes de Trump, que resultaram a invasão do Capitólio por seus apoiadores em janeiro de 2021.
Segundo apurou a agência de notícias AP, ao aceitar o convide para a Cúpula das Américas, Bolsonaro teria pedido para que Biden não o questionasse sobre seus constantes ataques contra o sistema eleitoral.
Mas o conselheiro de segurança nacional de Biden, Jake Sullivan, negou que o presidente norte-americano tivesse concordado com quaisquer condições, e assegurou que não haveria temas proibidos na conversa. Segundo a Casa Branca, o tema da realização de “eleições livres, transparentes e democráticas” no Brasil estava na pauta do encontro.
Em Los Angeles, na saída do hotel a caminho da Cúpula, Bolsonaro disse a jornalistas que seu antagonismo em relação a Biden já teria sido superado.
“Não vim aqui tratar desse assunto. Já é um passado. Vocês sabem que eu tive um excelente relacionamento com o presidente Trump. O presidente agora é Joe Biden, é com ele que eu converso, ele é o presidente e não se discute mais esse assunto”, afirmou.
“Sempre tive enorme consideração pelo povo norte-americano, temos valores em comum, como a democracia e liberdade, e será um bom encontro com o presidente Biden”, afirmou.
“Assuntos sigilosos”
Bolsonaro, em entrevista à emissora CNN antes da reunião com Biden, disse que o objetivo da conversa era buscar uma reaproximação com Washington. “Nunca tivemos problema com os Estados Unidos. O Brasil está aberto para conversar e ter relação com qualquer país.”
Segundo o brasileiro, entre os temas a serem discutidos estavam questões de energia e “assuntos sigilosos”.
Os Estados Unidos ofereceram a reunião bilateral para Bolsonaro como forma de garantir sua presença na Cúpula e minimizar a ausência de outros líderes que boicotaram o encontro, após Washington se recusara convidar países considerados não democráticos.
Antes do encontro, Kristina Rosales, porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, explicou a decisão em uma entrevista à revista Veja. “Estamos cientes de que alguns presidentes preferiram não participar da Cúpula, como é o caso do presidente do México. E há outros países que decidimos não convidar: Cuba, Venezuela e Nicarágua”, afirmou.
“Nosso objetivo é que todos cumpram a Carta Democrática Interamericana. Os países que participam da Cúpula precisam ser democráticos, e esses três, não são.”