Domingo, 13 de julho de 2025
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O pessimismo ambiental que tomou conta do final de 2009, após a Conferência do Clima em Copenhague, parece ecoar mais forte no extremo norte das Américas. O Canadá, um dos países signatários do Protocolo de Quioto, chega a 2010 com um aumento de quase 30% em suas emissões de gases causadores do efeito estufa em comparação com os níveis de 1990. Com isso, conquista uma das piores posições entre as nações que ratificaram o protocolo, segundo a ONU (Organização das Nações Unidas).

A pífia performance soa incoerente com o histórico de desenvolvimento do país, o quarto no ranking de IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) e também berço de uma das organizações ambientais mais populares do mundo: o Greenpeace.

Fundada em 1971 na região de Vancouver, oeste do Canadá, a organização não-governamental encara o desafio de ajudar a reverter a atrasada agenda ambiental do país, e admite: “o Canadá, vergonhosamente, merece todas as críticas”.

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A avaliação é  do Coordenador de Campanhas na área de Energia e Clima do Greenpeace Canadá, Dave Martin. Em entrevista ao Opera Mundi, o ambientalista afirma se preocupar com o futuro nada promissor das emissões de gases causadores do efeito estufa no país.

Prevista inicialmente por Quioto uma diminuição de 6% dos gases canadenses dos níveis de 1990 até 2012, meta foi reduzida mais tarde para 3%. Mesmo esta última é vista com ceticismo por Martin. “Francamente, eu não acredito que este plano está sendo posto em prática pelo governo”, comenta.

Óleo Sujo

A opinião de Martin é apoiada por outros ambientalistas canadenses e baseada principalmente no incentivo à extração de petróleo das areias betuminosas na província de Alberta. Chamada pelos opositores como óleo sujo, o processo de obtenção de um barril destas areias emite de três até cinco vezes mais dióxido de carbono que o bombeamento de um barril num poço na Arábia Saudita.



Divulgação Greenpeace




Ativistas do Greenpeace em Aurora Syncrude do Norte bloqueiam canal de dois quilômetros de largura, onde material tóxico das minas é depositado

Outro ponto negativo, explica Martin, é a grande quantidade de gás natural exigida no  aquecimento da água para separar e “pré-refinar” o betume. “Estamos queimando uma energia relativamente limpa para produzir algo tão sujo”, diz ele.

No entanto, o negócio bilionário conta com apoio do governo conservador, em especial do primeiro-ministro canadense Stephen Harper e do ministro do Meio Ambiente, Jim Prentice – ambos de Alberta –, como observa o ambientalista. Neste ano, por exemplo, a produção será aumentada em até cinco vezes.

Atualmente, a extração de petróleo das areias de Alberta corresponde a 6% das emissões de gases poluentes no Canadá. Porém, com as expansões previstas o número pode saltar para 40% em 2020, segundo o coordenador do Greenpeace. “Para quem vive numa crise ambiental, a questão das areias betuminosas se torna muito grave”, diz Martin.

Obstáculos

Desafiar a extração de petróleo em Alberta, no entanto, é desafiar a base econômica canadense e colecionar inimigos de peso. Na última década, petroleiras investiram na região mais de 50 bilhões de dólares. De acordo com a Associação Canadense de Produtores de Petróleo, 275 mil trabalhadores em Alberta estão direta ou indiretamente empregados no negócio, gerando 30% da receita da província.

O óleo de Alberta ainda é visto como uma alternativa bem-vinda para reduzir a dependência mundial do petróleo do Oriente Médio. O maior comprador, os Estados Unidos, importa quase um quinto de toda produção canadense.

Mesmo assim, Martin insiste que estudos realizados pelo Greenpeace, em parceria com a Associação dos Trabalhadores de Alberta, apontam alguns caminhos viáveis para a produção de empregos ambientalmente sustentáveis através de tecnologia limpa, investimento em transporte público e programas de conservação. “A questão acaba em condições políticas: podemos desafiar quem está por trás deste empreendimento?”, questiona.


Estratégias

Há oito anos no Greenpeace Canadá e três coordenando a campanha contra o petróleo das areias de Alberta, Dave Martin aposta no marketing para promover boicotes comerciais ao combustível. “Estamos levando a nossa mensagem internacionalmente e já conseguimos bastante apoio de empresas europeias. A causa tem bastante apelo uma vez que é divulgada, e isto nos dá confiança de que algo pode ser feito”, afirma.

Sobre o extremo descontentamento com o governo em vigor, ele conta que o Greenpeace foi uma das poucas organizações ambientais que tomou posição política na última eleição federal canadense. “Fomos a público e dissemos sem medo para não votarem em Harper. Foi algo inédito”, comenta Martin, que promete repetir a estratégia nas próximas eleições deste ano, marcadas para outubro.

Mesmo com as reclamações de pouco diálogo e falta de vontade política, o ambientalista termina a conversa em tom otimista, reafirmando sua convicção na militância: “As grandes vitórias ambientalistas muitas vezes não estão em coisas que aconteceram, mas naquilo que deixou de acontecer. Acredite, as coisas poderiam estar muito piores”. 

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