Domingo, 20 de abril de 2025
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A senadora Maria Isabel Allende Bussi, filha do falecido presidente socialista Salvador Allende (1970-1973), fez um discurso ao Senado chileno, nesta terça-feira (08/04), em tom de despedida após ter seu mandato cassado pelo Tribunal Constitucional do país na última quinta-feira (03/04).

Allende Bussi foi destituída após assinar, no final de 2024, um acordo preliminar com o governo do presidente Gabriel Boric para comprar e vender a casa de seu pai, deposto por um golpe militar em 1973, com o objetivo de estabelecer um museu em sua memória.

A oposição considerou esse movimento como anticonstitucional porque a operação envolvia a assinatura de herdeiros que estavam no governo, além dela, a neta de Salvador Allende e ex-ministra da Defesa, Maya Fernández, que renunciou após a polêmica.

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“Depois de décadas compartilhando este espaço democrático, hoje me vejo na necessidade e no dever de falar em um dos momentos mais difíceis e dolorosos da minha vida. Não é fácil dirigir-me a vocês. Provavelmente, esta será minha última intervenção nesta sala. Desejo me despedir de vocês”, iniciou a senadora, em meio a lágrimas e consequentemente aplausos do Senado.

Allende Bussi classificou a cassação de seu mandato como uma “maneira abrupta com que terminam” seus mais de 30 anos na política do país. Apesar da “saída forçada e injusta” declarou ainda “ir em paz apesar desta saída forçada e injusta”. “Minha história não termina aqui”.

“Esta decisão representa uma enorme injustiça. Estamos diante de um veredito que, além de sua aparente legalidade, viola princípios elementares de justiça, proporcionalidade e senso democrático”, denunciou.

Apesar de discordar da decisão do Tribunal Constitucional, a senadora reconheceu que deveria “ter considerado o Artigo 60 da Constituição”, referente ao caso da compra da casa de seu pai pelo governo Boric. “Não fujo da minha responsabilidade. Vocês acham que eu arriscaria mais de 30 anos de serviço público e de luta democrática se tivesse consciência de que supostamente infringia uma norma constitucional?”, questionou.

Allende Bussi classificou cassação de seu mandato como “maneira abrupta com que terminam” seus mais de 30 anos na política do país
pschile/Instagram

“Sustentamos que o processo de compra foi realizado dentro do marco do direito público, não do direito privado. Como explicou a Controladora-Geral da República na Comissão Investigadora da Câmara dos Deputados, a compra, dentro dos processos administrativos públicos, não se concretizou. Apenas uma das duas etapas foi realizada, e nunca recebemos um único peso”, explicou.

Por outro lado, criticou ainda “uma gravidade extrema para a institucionalidade chilena” ao afirmar que está sofrendo uma sentença sem ter prestado declarações e defesa, ou mesmo antes do Tribunal Constitucional chileno ter divulgado formalmente sua cassação.

Mesmo assim “serei destituída do meu cargo como senadora da República”. “O recente vazamento da decisão do Tribunal Constitucional foi celebrado como um triunfo do direito sobre a política. Mas não vejo vitória alguma”, disse ainda.

Para a senadora, “a justiça, para ser legítima, deve ir além da aplicação literal de uma norma. Deve considerar o contexto, a intenção, o dano real e, sobretudo, o impacto institucional”, defendendo que em seu processo, “a lei foi aplicada erroneamente, mas a justiça não foi feita”.

Por fim, disse deixar o cargo “de cabeça erguida”, reafirmando que nunca usou sua posição para benefício pessoal. “Nunca busquei lucro ou privilégio. Cometi erros? Sim, como qualquer um que dedicou sua vida à ação. Mas tenho a convicção de que sempre lutei por meus ideais com integridade. E continuarei fazendo isso pelo Chile, por sua gente, pela memória e pelo futuro”, declarou a política socialista.

“Vou-me com a profunda emoção de ter servido ao Chile com convicção, com paz, com paixão e com amor”, despediu-se do Senado a filha de Allende.