Senadores petistas votam por Dia da Amizade Brasil-Israel
Partido de Lula participou de aprovação simbólica da lei; de acordo com Rogério Carvalho, líder da bancada, foi 'um gesto simbólico de diplomacia' que não conflitaria com a 'defesa de um Estado palestino soberano'
O Senado aprovou por unanimidade, em votação simbólica, sem registro nominal, o Projeto de Lei (PL) 5636/2019 que estabelece 12 de abril como Dia da Amizade Brasil-Israel no calendário oficial do país, em meio a nova etapa do genocídio de Israel contra o povo palestino. A proposta, agora aguarda sanção presidencial. A unanimidade incluiu a bancada do Partido dos Trabalhadores (PT), além de todos os outros 11 partidos representados no Senado: MDB, Novo, PDT, PL, Podemos, PP, PSB, PSDB, PSD, Republicanos e União Brasil.
O líder do PT no Senado, Rogério Carvalho (SE), justificou o voto favorável a Opera Mundi como um “gesto simbólico da diplomacia”, ressaltando que a decisão não conflita com a “defesa intransigente de um Estado palestino soberano”.
A bancada do PT no Senado atualmente é composta pelos parlamentares Augusta Brito (CE), Beto Faro (PA), Fabiano Contarato (ES), Humberto Costa (SP), Jaques Wagner (RJ), Paulo Paim (RS), Randolfe Rodrigues (PE), Rogério Carvalho (SE) e Teresa Leitão (PE).
A votação ocorre em meio à escalada dos ataques israelenses ao território palestino, que desde 7 de outubro de 2023 já resultou em mais de 53 mil mortes na Faixa de Gaza, incluindo 17 mil crianças, segundo o Ministério da Saúde local.
“O momento é, sem dúvida, delicado. E é justamente por isso que precisamos reafirmar o papel do Brasil como um ator de equilíbrio”, argumentou Carvalho, acrescentando que a homenagem “não é um endosso ao sionismo bélico, mas um gesto diplomático de continuidade institucional”.

Jane de Araújo/Agência Senado e UNRWA under CC BY-SA 4.0
Questionado sobre possíveis contradições com críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao que classificou como “genocídio” em Gaza – posição que levou Israel a declará-lo persona non grata em fevereiro de 2024 –, Carvalho negou incongruência: “não há contradição; há complexidade”.
O Brasil mantém relações diplomáticas e comerciais com o Estado israelense, na contramão do pedido da sociedade civil palestina e de campanhas como o movimento BDS, que demanda boicote, desinvestimento e sanções. A Campanha “Brasil Abastece o Genocídio”, que integra o BDS, pede que Lula proíba as exportações de petróleo para Israel em conformidade com a responsabilidade frente à Convenção para a Prevenção e a Repressão do Crime de Genocídio.
O projeto de lei aprovado no Senado, com relatoria do senador Carlos Viana (Podemos-MG), surge de uma proposta aprovada em 2019 pela Câmara dos Deputados, o PL 5815/13, enviado em outubro de 2013 pelo governo de Dilma Rousseff (PT), por iniciativa do chanceler Antonio Patriota. Esse projeto substituía uma versão anterior, vetada pela então presidente, que sugeria o dia 29 de novembro para a celebração entre os dois países, por essa data ser identificada pela ONU como Dia Internacional de Solidariedade com o Povo da Palestina.

Marcos Oliveira/Agência Senado
A reportagem consultou alguns senadores da bancada petista no Senado. Jaques Wagner, líder do governo no Senado, ainda não retornou o contato. As assessorias de Humberto Costa e Fabiano Contarato afirmaram que o tema não foi discutido e remeteram a responsabilidade ao líder Rogério Carvalho, que respondeu via mensagens às perguntas de Opera Mundi.
Por que a bancada petista votou favoravelmente à instituição do Dia da Amizade Brasil-Israel?
Essa proposição foi elaborada ainda em 2013, por iniciativa do então chanceler Antonio Patriota e encaminhada ao Congresso pela presidenta Dilma Rousseff. Ela se insere numa tradição diplomática brasileira de diálogo bilateral, de construção de pontes, não de muros. Votamos favoravelmente por compreender que a diplomacia é feita também de gestos simbólicos — e que isso não contraria, em hipótese alguma, a nossa defesa intransigente de um Estado palestino soberano e de uma solução justa e negociada para o conflito no Oriente Médio.
Não é contraditória essa homenagem em meio aos ataques de Israel contra a Faixa de Gaza e diante das acusações de genocídio na Corte Internacional de Justiça?
O momento é, sem dúvida, delicado. E é justamente por isso que precisamos reafirmar o papel do Brasil como um ator de equilíbrio. A homenagem à amizade Brasil-Israel é um reconhecimento histórico, e não uma carta branca às ações recentes do governo de Israel, as quais, aliás, temos duramente criticado. O presidente Lula tem sido claro ao condenar o genocídio em Gaza. Essa homenagem não é um endosso ao sionismo bélico, mas um gesto diplomático de continuidade institucional. Além disso, é válido ressaltar que a homenagem é entre Israel e o Brasil, não entre o atual governo de Israel e o atual governo do Brasil. Israel — ou seja, sua população — deseja majoritariamente o fim da guerra (mais de 70%, segundo as pesquisas mais recentes), ao contrário do governo atual, que recentemente declarou sua intenção de remover mais de 2 milhões de palestinos da Faixa de Gaza, intensificando o conflito.
Essa decisão não representa, ao menos simbolicamente, um alinhamento brasileiro ao Estado de Israel?
Essa interpretação não se sustenta diante dos fatos. O governo brasileiro — e o PT, em especial — tem uma longa trajetória de apoio à causa palestina. Defendemos a coexistência de dois Estados, com fronteiras seguras e mutuamente reconhecidas. Essa medida, ao contrário do que alegam alguns críticos, reafirma o compromisso do Brasil com o diálogo, com a construção da paz e com a manutenção de relações diplomáticas maduras. Ser contra o genocídio em Gaza não nos obriga a romper laços históricos com o povo israelense.
Não há contradição entre o voto favorável da bancada petista a esse projeto de lei e as críticas duras do presidente Lula ao Estado de Israel?
Não há contradição. Há complexidade. É preciso compreender que essa proposição não trata da conjuntura atual, mas de um marco simbólico construído há mais de uma década, em um contexto de relações bilaterais estáveis. A crítica do presidente Lula ao genocídio em Gaza é legítima e necessária. Ao mesmo tempo, o Estado brasileiro — por meio de seus diversos governos — tem mantido relações com Israel e com a Palestina. O PL não rompe com os valores do PT. Ao contrário, reafirma nosso compromisso com uma diplomacia que respeita a soberania dos povos, inclusive do povo palestino.
