O governo da República Democrática do Congo (RDC) confirmou, no último domingo (16/02), a entrada do grupo armado M23 (Movimento 23 de Março), aliado de Ruanda, na cidade de Bukavu, capital da província de Kivu do Sul e segunda maior cidade do país.
Por meio de um comunicado do Ministério de Comunicação e Mídias da RDC, o governo do país africano garantiu monitorar “de perto” a situação na região, acusando o Exército da Ruanda “e seus auxiliares” pela invasão.
#RDC Le Gouvernement suit, heure par heure, la situation à #Bukavu marquée par l’entrée de l’armée rwandaise et ses supplétifs ce matin.
Contrairement aux résolutions de Dar-Es-Salaam, aux appels au cessez-le-feu de la communauté internationale y compris l’implication du…
— Ministère de la Communication et Médias/RDC (@Com_mediasRDC) February 16, 2025
Ao afirmar que “está fazendo o possível para restaurar a ordem, a segurança e a integridade territorial” em Bukavu, cidade com cerca de um milhão de habitantes, o governo da RDC ainda pediu que a população da cidade “fique em casa e não se exponha para evitar ser alvo das forças de ocupação”.
Kinshasa, capital congolesa, ainda denunciou o avanço do M23 apoiado por Ruanda, contrariando acordos de paz e apelo de cessar-fogo da comunidade internacional: “Ruanda persiste em seu plano de ocupação, pilhagem e prática de crimes e graves violações de direitos humanos em nosso solo”.
“Bukavu, Goma e todos os outros cantos ocupados em Kivu do Norte e Kivu do Sul constituem o símbolo da nossa resistência. Permaneçamos todos de pé, vigilantes, resilientes e unidos diante desta provação por trás de nossas forças armadas e do presidente da República [Felix Tshisekedi]”, finalizou o governo.
M23 pode ter tomado o controle de Bukavu
Segundo fontes locais, como a rádio Okapi, os rebeldes do M23 tomaram o controle de vários locais estratégicos na cidade na manhã do último sábado (15/02), incluindo a residência do governador provincial. A situação na cidade é tensa, com lojas e farmácias fechadas por medo de saques, relatou a rádio.
A Okapi ainda afirmou que o exército da República Democrática do Congo, responsável pelos combates para combater o M23, se retirou de Bukavu, permitindo o controle da cidade pelos rebeldes.
De acordo com o portal de notícias RDC Times, as tropas do governo deixaram Bukavu sem lutar e estão se movendo para o sul, para a cidade de Uvira, perto da fronteira com Burundi. A imprensa local relata que alguns soldados congoleses teriam fugido de Bukavu em barcos.
O jornal britânico The Guardian afirmou, nesta segunda-feira (17/02), que o M23 havia tomado o controle de Bukavu. O controle da cidade pelos rebeldes também foi confirmado pelo governador de Kivu do Sul, Jean-Jacques Purusi.

Bukavu é a capital da província de Kivu do Sul e a segunda maior cidade da República Democrática do Congo
Contudo, o governo da RDC afirmou no domingo (16/02) que a cidade foi apenas “brevemente invadida por terroristas”, mas é “controlada pelo exército congolês” e seus aliados.
Unidades do M23 entraram em Bukavu na última sexta-feira (14/02), quando o M23 anunciou a tomada do aeroporto de Kavumu, um centro vital de suprimentos humanitários e militares em Kivu do Sul. O aeroporto também serve como uma linha defensiva essencial para Bukavu.
Essa mais recente ofensiva do M23 ocorreu semanas depois do grupo tomar controle de Goma, capital da província de Kivu do Norte, em 26 de janeiro. Na ocasião, os militantes já haviam anunciado a reorientação de suas forças para Kivu do Sul.
Do ponto de vista humanitário, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) alertou nesta segunda-feira (17/02), que desde o início deste ano mais de 2,5 mil escolas no leste da RDC tiveram que ser fechadas por causa dos combates na região.
O conflito com o M23 levou com que mais de 330 mil crianças ficassem fora das escolas, em meio ao temor de que essas crianças jamais retornem à sala de aula. Além da questão educacional, os combates deixaram centenas de mortes e provocaram o deslocamento de meio milhão a desde o início do ano.
Origem do conflito
Segundo uma fonte da RDC, sob condição de anonimato, ao Brasil de Fato, o atual conflito na República Democrática do Congo ocorreu porque o país africano é muito rico em recursos naturais, como tântalo, estanho, tungstênio e ouro, os quais o Ocidente se interessa para uso em seu setor tecnológico.
“O Ocidente está usando Ruanda para saquear esses recursos. Já Ruanda criou esse grupo de rebeldes chamado M23, totalmente apoiado por eles para saquear os minerais e levá-los à Kigali, capital ruandesa, para exportação”, explica.
Na análise do ativista pan-africanista, a mídia internacional “distorce a situação” ao configurar o conflito como uma questão étnica. Esse equívoco ocorre porque durante a guerra civil da Ruanda, entre abril e julho de 1994, a etnia tutsi foi massacrada por extremistas étnicos hutus, de modo que 800 mil pessoas foram mortas.
Nos últimos anos, o M23, um grupo predominantemente tutsi e apoiado pelas tropas da Ruanda, conquistou grandes áreas de território no leste da RDC, como em Kivu do Sul e do Norte, alegando que luta para defender a população de sua etnia.
O governo de Ruanda insiste nessa narrativa, mas a fonte da RDC explica que “os rebeldes do M23 são ruandeses que se passam por congoleses”.
(*) Com Tass, Xinhua, ONU News e informações do Brasil de Fato e The Guardian