A cidade de Assunção, capital do Paraguai, abriga nesta segunda-feira (08/07) a 64ª Cúpula do Mercosul, que poderia ser a primeira a contar com cinco chefes de Estado de países membros, mas que terá somente quatro, devido à ausência do presidente da Argentina, Javier Milei.
Além do mandatário anfitrião, Santiago Peña, o evento tem a presença dos presidentes do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, da Bolívia, Luis Arce, e do Uruguai, Luis Lacalle Pou.
A ausência do presidente da Argentina, Javier Milei, é um dos pontos polêmicos do evento, que também marca a incorporação da Bolívia como membro pleno do bloco e os avanços em um possível tratado de livre comércio com a China.
Em termos de protocolo, o evento serviu para o Paraguai entregasse a presidência pro-tempore ao Uruguai, que exercerá essa função durante os próximos seis meses, e que terá a responsabilidade de organizar a próxima cúpula, em janeiro de 2025.
Bolívia como membro pleno
A presença de Arce ganhou destaque na edição deste ano, já que uma das pautas principais é a oficialização da Bolívia como membro pleno do bloco econômico sul-americano.
Segundo o presidente boliviano, a incorporação do país ao Mercosul “tem caráter estratégico, porque significa fazer parte de um importante espaço de integração regional, intercâmbio comercial, fortalecimento produtivo e nos torna um eixo articulador na região”.
Arce acrescentou que espera, em breve, “celebrar a adesão do nosso país a outros espaços de integração que podem inserir a Bolívia ao novo mundo que se está construindo”.
Esta última declaração soou como uma alusão à candidatura boliviana ao BRICS, cuja cúpula anual, que acontecerá em outubro, na cidade russa de Kazan, deverá avaliar esta e outras 30 solicitações de países que desejam ingressar ao bloco originalmente integrado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, e que incorporou este ano outros cinco integrantes: Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes, Etiópia e Irã.
Ausência de Milei
O único membro pleno do Mercosul que não foi representado por seu presidente na cúpula deste ano foi a Argentina, cuja delegação é encabeçada pela chanceler Diana Mondino.
O mandatário argentino Javier Milei não foi a Assunção, mas esteve presente em um evento que forma parte da Conferência de Ação Política Conservadora (CPAC), realizada na cidade de Balneário Camboriú, em Santa Catarina, junto com ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro (2019-2022).
O Itamaraty, através da diplomata Gisela Padovan, secretária para a região da América Latina e do Caribe, afirmou que o Brasil “lamenta (a ausência de Milei), pois não é desejável que isso aconteça. Mas o Mercosul tem 33 anos de história, é um bloco consolidado. Este fato não altera a importância da cúpula, mas é lamentável que um presidente decida não se reunir com seus pares regionais”.
Crítica de Lula
Em seu discurso durante o evento, o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva disse que “esta é a 19ª cúpula do Mercosul em que participo como chefe de Estado e nunca nos deparamos com tantos desafios, seja no âmbito regional, seja em nível global”
“A questão que se impõe é se nossos países querem se integrar ao mundo unidos ou separados. Minha aposta no Mercosul como plataforma de inserção internacional e de desenvolvimento do Brasil permanece inabalável. Nosso bloco é um projeto ambicioso e que gerou muitos frutos desde seu lançamento. O comércio entre nós multiplicou-se dez vezes e hoje já é de US$ 49 bilhões”, acrescentou o mandatário.
Lula também celebrou a adesão da Bolívia como membro pleno, frisando que esta decisão tem “enorme valor estratégico e faz do nosso bloco ator incontornável no contexto da transição energética”.
No entanto, o líder brasileiro questionou o fato de a palavra “gênero” ter sido retirada do documento final da cúpula.
“Apagar a palavra gênero de documentos só agrava a violência cotidiana sofrida por mulheres e meninas. Para superar flagelos como a fome, a pobreza e as desigualdades é importante contar com um instituto social forte, com meios para estabelecer metas e ações concretas”, criticou o presidente do Brasil.
Lula evitou mencionar a ausência de Milei no evento, mas comemorou a participação de delegações de cinco países, incluindo a do Panamá, que foi liderada pelo próprio presidente do país centro-americano, José Raúl Mulino.
As outras nações presentes, cujas representações foram encabeçadas pelos respectivos chanceleres, foram Chile, Colômbia, Equador e Guiana.
Um pseudo “aggiornamento” que afasta o Mercosul de suas bases sociais nos enfraquece. Apagar a palavra gênero de documentos só agrava a violência cotidiana sofrida por mulheres e meninas. Para superar flagelos como a fome, a pobreza e as desigualdades, é importante contar com um…
— Lula (@LulaOficial) July 8, 2024
Acordo com a China
Outro ponto importante da cúpula deste ano foi o avanço nos pontos em comum para se buscar um tratado de livre comércio do bloco com a China.
A questão se tornou polêmica em 2022, quando o presidente do Uruguai, Luis Lacalle Pou, disse que seu governo tentaria consolidar um acordo bilateral com Pequim sem a participação dos demais membros do Mercosul, postura que gerou reações de repúdio por parte de Argentina e Paraguai – então governados por Alberto Fernández e Adbo Benítez, respectivamente – e de indiferença por parte do Brasil – então sob a gestão de Jair Bolsonaro.
Aquela postura de Montevidéu contrariava uma regra interna do Mercosul, segundo a qual todas as negociações com terceiros países devem ter o aval dos demais parceiros.
Porém, na reunião desta segunda, o Uruguai se mostrou mais receptivo à ideia de uma negociação em conjunto dos países do Mercosul com os representantes do gigante asiático, o que agradou o Brasil, cuja postura também passou a ser mais firme com relação a este tema a partir da chegada ao poder do presidente Lula.
“Não haveria problema em abrir conversações com a China se todos nós formos juntos”, disse a diplomata brasileira Gisela Padovan, representante do Itamaraty, em uma conferência de imprensa.