Dor-de-cabeça para governantes de todas as partes do mundo, a crise econômica ocupou lugar de destaque na visita de Luiz Inácio Lula da Silva à China. Nas 48 horas em que o presidente esteve no país, ficou clara a intenção de uma cooperação em prol da recuperação do mercado financeiro mundial.
A China, que em abril passou a ser o maior comprador de produtos brasileiros, agora parece ter intenção de investir mais no Brasil. Resultados práticos foram empréstimos para a Petrobras, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o Banco do Brasil e o Itaú. As perspectivas de negócios são ainda melhores que no ano passado, quando o fluxo comercial chegou perto dos 40 bilhões de dólares.
Presidentes Lula e Hu Jintao durante encontro em Pequim; Jason Lee Pool/EFE – 19/05/2009
Para Su Zhenhua, economista e professor da conceituada Universidade de Zhejiang, na China, uma parceria mais firme pode ser um grande negócio para os dois países superarem a crise. “A atual situação financeira dá aos países em desenvolvimento uma oportunidade de ajustar suas estruturas econômicas e, principalmente, trabalhar juntos. Agora é a hora de reforçar o comércio para reduzir a dependência econômica de países desenvolvidos”.
Mas mesmo entre esses países, há disparidades nos efeitos da crise. Enquanto as previsões de expansão do PIB (Produto Interno Bruto) este ano para o Brasil são de apenas 1%, a China já parece dar sinais de recuperação. Com um crescimento de 6,1% no primeiro trimestre e previsões de expansão ainda otimistas, o país tem dinheiro no bolso para comprar, o que é uma boa oportunidade para quem tem o que vender.
Milad Nouri, diretor da China Consultants International, empresa de consultoria que trabalha há mais de oito anos com o mercado chinês e internacional (incluindo o Brasil), lembra do potencial que a China representa em tempos de crise.
“Com o pacote de estímulo do governo chinês, o mercado doméstico representa hoje uma grande oportunidade para companhias estrangeiras. Além disso, a internacionalização da China está modificando positivamente os hábitos dos consumidores chineses em termos de adaptação aos produtos importados. Há também oportunidades para empresas que têm knowhow em áreas específicas que os chineses ainda não têm”, sugere Nouri.
Coca-Cola virou Ke kou ke le
Os fast foods são um bom exemplo da internacionalização do mercado interno chinês. Para se ter uma idéia, o país é hoje o mercado número 1 em expansão para o McDonald’s, com 960 restaurantes e mais de 60.000 empregados. O KFC (Kentucky Fried Chicken) ainda consegue maior êxito, com mais de 2.200 lojas espalhadas por 465 cidades.
Os chineses estão se adaptando rapidamente ao sabor ocidental, mas com ajuda das multinacionais. Alguns menus são criados especificamente para agradar ao paladar chinês. As companhias que investem no país já sabem que para ter sucesso é preciso adaptar-se. A Coca-Cola, assim como milhares de outros gigantes, tem nome específico em mandarim: “Ke kou ke le”. McDonald’s é “Mai Dang Lao”.
Se vender para a China é uma oportunidade para sair da crise, vender para o Brasil também é. Os chineses estão atentos a mercados que absorvam seus produtos. Roberto Dumas, representante-chefe do Itaú BBA em Xangai, argumenta que nesse cenário de recessão mundial, o Brasil passou a ter uma posição privilegiada.
“Nações que apresentam algum nível de demanda para absorver essa capacidade excedente certamente terão tratamento diferenciado, principalmente por países que tenham nas exportações e investimentos a base de seu modelo de crescimento, como é o caso da China”, argumenta.
Mas nem tudo são flores nessa relação. Não é porque o gigante asiático já mostra reações positivas à crise que agora vai investir pesado no Brasil e comprar mais. As exportações brasileiras para a China representam apenas 1,3% das importações chinesas, percentual quase todo relativo à compra de produtos primários como soja, minério e derivados. Produtos industrializados não têm vez.
Para o diretor do Departamento de Comércio Exterior e Relações Internacionais da Fiesp (Federação das Indústrias de São Paulo), Ricardo Martins, a visita presidencial, do ponto de vista da indústria, não trouxe nenhum avanço para o aumento da venda de produtos industrializados.
“A cooperação neste momento [para superação da crise] é a China aumentar suas compras de commodities, como já vem acontecendo. Melhor seria se pudéssemos agregar valor à pauta de exportação, o que creio ser muito difícil neste momento”, diz.
O que falta?
Consenso entre especialistas, o Brasil ainda não sabe vender bem o seu peixe. Espaço existe para ser ocupado no mercado chinês. Um estudo do Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC) aponta que de uma lista de 600 produtos fabricados no nosso país, só 147 são procurados pelo mercado chinês, dentre eles cosméticos e alimentos. OU seja, mais de 75% do que poderia ser vendido para a China não é comercializado.
Para Rodrigo Maciel, secretário-executivo do CEBC, o investimento é a chave da diversificação da pauta exportadora brasileira. “A visita do presidente Lula abriu uma porta. Agora precisamos traçar esse caminho, com o aumento do fluxo de informação para a promoção de projetos no Brasil que possam atrair investimentos chineses. A importância da visita presidencial não é apenas política. Este é apenas um início de trabalho que precisa ocorrer com mais frequência”, defende Maciel.
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