A franco-brasileira Céline Hervieu foi eleita para um primeiro mandato como deputada nas eleições parlamentares antecipadas de 7 de julho na França pelo Partido Socialista (PS), que integra a coalizão de esquerda Nova Frente Popular (NFP).
No dia seguinte da recusa do presidente francês em nomear ao cargo de primeiro-ministro o nome indicado pela NFP, a parlamentar disse em entrevista à RFI que Emmanuel Macron age “como se nada tivesse mudado”.
Céline Hervieu, de 31 anos, é filha de pai francês e mãe brasileira. Ela nasceu em Paris, mas viaja ao Brasil todos os anos para visitar a família. Pediu desculpas pelo português hesitante, chegou a pensar em fazer a entrevista em francês, mas acabou respondendo a todas as perguntas na língua da mãe.
Psicóloga de formação e militante em defesa dos direitos dos migrantes e refugiados, ela foi vereadora de Paris de 2020 até este ano. Ela estreia na política nacional francesa em um momento de impasse político, sem a indicação de um novo primeiro-ministro. Há um mês e meio o país é dirigido por um governo interino.
As eleições legislativas antecipadas, convocadas por Emmanuel Macron após a vitória do Partido Reunião Nacional, de extrema direita, nas eleições europeias, elegeram um Parlamento dividido. Três grandes blocos compõem a casa e, até agora, nenhum deles conseguiu formar maioria.
A NFP, que elegeu o maior número de deputados e reivindica a vitória, indicou, em julho, Lucie Castets para o cargo de primeira-ministra. Para Céline Hervieu, o resultado das urnas foi claro. “O resultado mostrou uma coisa muito importante. Os franceses rejeitam a extrema direita, por um lado, e a política de Emmanuel Macron, por outro lado”.
Recusa de nomear Castets
Após consultas com líderes partidários, o presidente Emmanuel Macron se recusou nessa segunda-feira (26/08) a nomear a candidata da esquerda para garantir a “estabilidade institucional” do país. “Na verdade, ele (Macron) não consegue aceitar os resultados dessas eleições. Ele quer continuar como sempre, como se nada tivesse mudado”, critica a deputada socialista.
Como outros líderes da esquerda, Céline Hervieu considera essa posição do presidente francês como um “golpe antidemocrático” e um desrespeito ao voto dos franceses. “Ele (Macron) não aceita, não respeita o voto do povo francês que quer uma mudança grande no país e nas políticas públicas”, afirma, garantindo que seu campo está preocupado com a estabilidade do país e espera uma mudança em breve.
O presidente francês lançou uma segunda rodada de consultas, pedindo aos partidos que tentem formar coligações de governo. O Partido França Insubmissa, de esquerda radical, e o Reunião Nacional, de extrema direita, foram excluídos.
No início de seu mandato, Céline Hervieu, que se considera uma social-democrata, defendeu negociações com outras correntes políticas para a formação de um governo. Ela continua defendendo “discussões com outros partidos”, mas detalha que elas devem começar em torno do “programa da esquerda” que ganhou a eleição e não da “política de Emmanuel Macron”, que foi recusada nas urnas.
A esquerda já convoca manifestações para defender o resultado das eleições e forçar o presidente “a mudar de posição” “Temos de continuar a mobilização, a pressão. Na França, o povo decide o destino político. A França é um grande país democrático e isso tem que ser respeitado”, pontua.
Temporada cruzada França-Brasil
França e Brasil organizam para o ano que vem uma temporada cultural cruzada entre os dois países. Céline Hervieu acompanha a organização do evento e “vai apoiar” o máximo que puder todos os projetos. Ela não acredita que a situação de bloqueio político atual na França comprometa a organização dessa temporada cruzada França Brasil em 2025.
“A programação é feita com muitos atores da sociedade civil, associações, grupos informais. A comunidade brasileira na França também vai ajudar. Então, felizmente, eu acho a situação política nacional não vai impedir os projetos de se desenvolverem”, espera a deputada, ressaltando que a temporada cruzada, decidida pelos presidentes Lula e Macron, será “um grande momento da relação bilateral” franco-brasileira.