Sábado, 19 de julho de 2025
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O programa 20 MINUTOS exibiu nesta quinta-feira (19/06) uma entrevista exclusiva do presidente de Cuba, Miguel Díaz-Canel, ao jornalista Breno Altman. A conversa foi ao ar a partir das 11h no canal de Opera Mundi no Youtube.

“O governo norte-americano apostou que Cuba, em meio à pandemia, com confinamento intensificado, não poderia salvar a Revolução. O que aconteceu, mais uma vez, foi que o tiro saiu pela culatra”, afirmou o presidente de Cuba, Miguel Díaz-Canel, durante a entrevista (assista na íntegra abaixo).

 

Ao fundador de Opera Mundi, o líder cubano disse que a ilha vive um dos “períodos mais complexos”, porém ressalta a “resistência criativa” da população: “não se trata apenas de resistir, é como nós resistimos e seguimos em frente”.

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O bloqueio dos Estados Unidos contra Cuba perdura por mais de 60 anos e foi endurecido em diversos momentos, como na pandemia da covid-19, segundo Díaz-Canel. Porém, mesmo assim, não foi capaz de liquidar a Revolução liderada por Fidel Castro, “pois há dignidade” dos cubanos.

“Estou falando com você sobre resistência criativa porque não se trata apenas de resistir, nós resistimos e seguimos em frente. Porque, por exemplo, desenvolver uma vacina, quantos países do mundo foram capazes de se desenvolver suas próprias vacinas? Foram muito poucos. Podem ser contados nos dedos de uma mão. E nós o fizemos”, afirmou Díaz-Canel.

“Isso não é apenas resistir, isso é criar. Há dignidade, há essa resistência criativa, há solidariedade internacional também […]. E há a unidade do povo cubano. O povo cubano sabe o que perde se a Revolução perder”, completou o presidente cubano.

Díaz-Canel também afirmou que, com bloqueio e sem bloqueio, o regime do país “será sempre o da construção socialista”.

Veja trechos da entrevista de Breno Altman com Miguel Díaz-Canel (para assistir a entrevista, clique aqui):

Breno Altman: presidente, a economia de Cuba vive uma das suas piores crises desde o período especialmente na década de 90, quando desapareceu a União Soviética e o campo socialista. A que o senhor atribui essa situação? 

Miguel Díaz-Canel: Breno, sem dúvida, como você sugere, há uma crise multidimensional nas condições de Cuba no momento atual, e estamos passando por um dos períodos mais complexos. Acredito que a primeira causa, a causa fundamental, mesmo que não houvesse outros fatores que coincidem, esta tem o peso fundamental para poder gerar esta crise, que é o injusto, genocida, criminoso bloqueio econômico, financeiro e comercial imposto pelo governo dos Estados Unidos contra Cuba, como uma política de pressão máxima, que já faz mais de 60 anos. E eu quero distinguir isso porque estamos em um momento particular.

Você está se referindo a uma etapa particular de Cuba que é este momento, esta crise, mesmo tomando como referência outra etapa que foi tão difícil como o período especial ou o que é conhecido como período especial, mas o bloqueio atual tem uma qualidade diferente do bloqueio que Cuba viveu todos esses anos e essa qualidade diferente tem a ver com a intensificação do bloqueio.

Um emaranhado complexo de medidas coercitivas muito agressivas dá uma qualidade diferente a este bloqueio. E posso explicar isso graficamente da seguinte forma: antes da segunda metade de 2019, tínhamos o bloqueio, mas um grupo de estratégias estava se desenvolvendo no país, um grupo de programas. Tínhamos fontes de renda em moeda estrangeira provenientes de remessas, de exportações, de turismo. Tínhamos créditos de organizações bancárias ou financeiras ou de instituições bancárias e financeiras. Tivemos um nível significativo de colaboração com vários países do mundo e com essas rendas podíamos importar matérias-primas, insumos para nossos principais processos de produção e serviços.

Tínhamos outra estabilidade, no fornecimento de combustível, também podíamos importar produtos necessários para satisfazer a demanda da população. Podíamos garantir importações de alimentos necessários para a cesta básica. Podíamos manter um mercado de câmbio estatal com uma taxa apropriada. Portanto, tudo fluía, com limitações, porém as coisas fluíam. O golpe foi violento. O golpe corta as rendas, os rendimentos do turismo…

Antes mesmo da pandemia?

Quase antes. Note, estamos falando que, no final de 2019, Trump aplica essas medidas. Em 2020, em março foi registrado o primeiro caso da doença da pandemia.

Como presidente da República, engenheiro eletricista de formação, o senhor explica essa crise energética que parece ser o principal problema econômico e social que Cuba enfrenta?

Antes de responder isso, diria, bem, os efeitos do bloqueio são conhecidos. Eu acho que temos dois problemas fundamentais para resolver: questões alimentares e energéticas. A causa fundamental, a causa raiz da situação energética que estamos vivenciando hoje, são as implicações do bloqueio, tomando também como base seus dois componentes: perseguição financeira, nos limitaram a receita em moeda estrangeira que precisamos para adquirir tecnologia, para fazer novos investimentos. Por esta razão devemos investir para reparar, para manutenção, para nos atualizarmos em tecnologia; e a perseguição energética que nos priva de ter os combustíveis de que precisamos para geração de eletricidade. Então, como se vê, em nosso sistema elétrico temos uma base fundamental para a geração de eletricidade, que são as usinas termelétricas cubanas.

Essas usinas termelétricas têm 40 anos, ou seja, quase todos eles já cobriram sua vida útil. Eles funcionam por conta da inteligência, da criatividade dos cientistas, engenheiros cubanos, de técnicos cubanos. Mas essa técnica já está ultrapassada, então imagine sem reparos capitais, sem manutenção, sem investimentos que as apoiam para que possam alcançar melhorias como parte desta situação.

Então, isso nos levou a uma situação muito complexa. Você me diz: ‘bem, o que fazemos?’. Não, é isso, nós temos uma estratégia. Por um lado, conseguimos organizar negócios, dos quais não vou explicar claramente por que existe uma perseguição energética que foi feita contra nós, que nos permitiu nos últimos anos recuperar a manutenção e fazer reparos capitais pendentes que tínhamos nas usinas. E estamos estamos incorporando novas capacidades hoje, que não estavam em operação, mas isso nos forçou a tirar as usinas de operação para dar essas manutenções, esses reparos para que voltem ao normal.

Mês a mês vamos incorporando. Agora, antes de um dos meses de verão, teremos incorporado um número significativo. Além do mais, também obtivemos financiamentos que nos permitiram fazer reparos fundamentais, manutenção ou comprar peças de reposição para aquelas usinas de geração distribuída.

Presidente, qual é o status atual das relações entre Cuba e Brasil?

Nossas relações são muito, muito particulares. São, antes de tudo, relações de afeto. Os povos cubano e brasileiro, creio, se amam e se admiram mutuamente. Lula é irmão de Cuba. Lembro quando Lula foi injustamente preso, mais de 2 milhões de cubanos assinaram [um manifesto] exigindo a libertação de Lula. Temos a amarga experiência com o governo Bolsonaro, enquanto no governo Dilma conseguimos cooperar modestamente com o Brasil em saúde e tínhamos mais de 11.500 médicos cubanos, pessoal de saúde, no Brasil. E onde chegamos?  Não digo isso por chauvinismo cubano, porque no final era uma oportunidade que o governo brasileiro nos deu, que Dilma deu, para contribuir ao povo brasileiro, que é um povo irmão. Nossos médicos estiveram presente em lugares onde nunca havia chegado a saúde pública no Brasil.

No entanto, com o governo Bolsonaro, uma das primeiras coisas que ele fez, num piscar de olhos, foi negar a cooperação médica de Cuba com o Brasil. E isso deixou uma marca em nossos médicos e também deixou uma marca no povo brasileiro, pela preocupação que havia entre os pacientes brasileiros e médicos cubanos. Lula nos visitou em 2023 e um conjunto de acordos foram assinados, um conjunto de protocolos, de memorandos, e a partir de então as relações econômica-comerciais foram intensificadas.

Assista à entrevista completa no canal de Opera Mundi no Youtube.