A primeira-ministra da Dinamarca, Mette Frederiksen, visitou três países europeus em um só dia a fim de angariar apoios contra as ameaças do presidente norte-americano Donald Trump de anexar a Groenlândia. E os obteve.
Nesta terça-feira (29/01), ela esteve em Paris, Berlin e Bruxelas, onde se reuniu, respectivamente, com o presidente francês Emmanuel Macron, com o chanceler Olaf Scholz e com o secretário-geral da Organização do Tratado do Atlântico Norte, Mark Rutte.
Em Berlin, na entrevista coletiva que deram depois da reunião, Frederiksen e Scholz não mencionaram a Groenlândia, mas a referências estavam claramente subentendida.
Ao falar da invasão da Ucrânia pela Rússia, o chanceler alemão frisou que “a inviolabilidade das fronteiras é um princípio fundamental do direito internacional” que “deve se aplicar a todos”. Depois, passou para o inglês para acrescentar: “A quem possa interessar.”
França não descarta enviar tropas à Groenlândia
Mais contundente foi a declaração de apoio recebida de Jean-Noël Barrot, ministro francês Relações Exteriores. Em uma emissora de rádio, ele afirmou que não descarta enviar tropas europeias à ilha à Groenlândia se a Dinamarca pedir.
“Por que não? Se Dinamarca solicitar a solidariedade da União Europeia, a França responderá presente”, disse Barrot quando questionado a respeito na emissora.
Depois do encontro com Macron, a primeira-ministra dinamarquesa disse: “Todos na Europa podem ver que agora será uma colaboração diferente com os Estados Unidos”.
Em Bruxelas, o comissário de Defesa da União Europeia (UE), Andrius Kubilius, declarou que o bloco está pronto para apoiar a Dinamarca.
Europa precisa assumir mais a própria segurança
“A mensagem dos amigos dos países nórdicos da Europa e também de fora dela é que deve haver respeito pelos territórios e soberania dos Estados. Isso é crucial para a comunidade internacional que construímos juntos desde a Segunda Guerra”, disse Frederiksen na TV dinamarquesa.
Nos três países, Frideriksen discutiu com os líderes europeus a necessidade de a Europa assumir mais responsabilidade sobre sua própria segurança. Este será o tema da reunião de cúpula que os líderes União Europeia realizarão na próxima segunda-feira (03/02). Diferentemente das outras será uma reunião em local afastado, com menos acesso da imprensa e sem documentos ou conclusões para que os líderes possam se expressar mais livremente.
Trump já manifestou interesse em anexar a Groenlândia em seu primeiro mandato. Desde a campanha retomou o tema, primeiro falando em comprar e logo aventando a possibilidade de anexá-la à força. Na semana passada, ele falou por telefone com Frederiksen durante 45 minutos numa conversa que vazou e foi classificada por vários meios como “tempestuosa”. A Dinamarca chegou a dizer que aceitaria a independência da Groenlândia, se seus habitantes assim o quisessem, mas não sua anexação por outro país.

A primeira-ministra dinamarquesa Mette Frederiksen
85% dos habitantes da ilha não quer ser norte-americana
No sábado, Trump voltou a dizer que os 57 mil moradores da ilha querem ser norte-americanos. Mas uma pesquisa de opinião divulgada nesta quarta-feira (29/01) mostra que 85% dos groenlandeses rejeitam a proposta. Apenas 6% são a favor e 9% estão indecisos. A pesquisa foi feita pelo Instituto Verian, encomendada pelo jornal dinamarquês Berlingske.
Numa demonstração de unidade dos países nórdicos, a primeira-ministra dinamarquesa postou em suas redes sociais uma foto de um jantar na sua cozinha com os primeiros-ministros da Noruega, Jonas Gahr Store, e da Suécia, Ulf Kristersson, junto com o presidente finlandês Alexander Stubb.
A Dinamarca também anunciou investimentos de cerca de US$ 2 bilhões em defesa para “melhorar a vigilância e a afirmação da soberania” da Groenlândia e das Ilhas Faroé. Os planos incluem três novos navios para transportar helicópteros, drones que podem fazer imagens detalhadas a longa distância, e o aprimoramento da capacidade de monitorar o Ártico e o Atlântico Norte por satélite. Trump ridicularizou o anúncio.
A Dinamarca também vem anunciando medidas para combater o racismo contra as populações nativas da Groenlândia e planos para que mais jovens groenlandeses receba treinamento para se envolver na defesa da soberania da Ilha.
‘Não existe colonizador melhor’
Em paralelo, Frederiksen conversou com os principais empresários do país para discutir como fazer frente a uma eventual guerra comercial com os Estados Unidos.
O Conselho Inuit do Círculo Polar, órgão que representa todos os inuits, povos originários do Alasca, Canadá, Chukotka e Groenlândia, disse que as últimas semanas evidenciaram a importância do Ártico para o Mundo. Alertou também, entretanto, que não existe um “colonizador melhor”.
“Não queremos discutir qual Estado é melhor ou pior para se viver ou qual é o melhor ou pior colonizador. Queremos debater como podemos melhorar a vida, os meios de subsistência, o bem-estar e a autodeterminação dos Inuit em todas as nossas regiões”, disse o representante do grupo.
Os Inuits são conhecidos como “esquimós”, mas muitos deles consideram a designação pejorativa e de cunho racista.
A Groenlândia, maior e mais gelada ilha do mundo, é objeto de ambição tanto por sua localização estratégica como por ser muito rica em diversas matérias primas essenciais para as novas tecnologias. A ilha faz parte do Reino da Dinamarca, mas tem muita autonomia e uma primeira-ministra própria.