Em meio a uma grave crise política no Haiti, o governo interino do país, nomeado de Conselho Presidencial de Transição (CPT), decidiu destituir o primeiro-ministro Garry Conille e nomear como seu substituto ao empresário Alix Didier Fils-Aimé, na última segunda-feira (11/11).
O novo primeiro-ministro haitiano é uma das figuras mais fortes do empresariado no país. Formado pela Universidade de Boston, ele atuou como presidente da Câmara de Comércio e Indústria do país e, em 2016, concorreu sem sucesso ao Senado.
Fils-Aimé também é conhecido por seu trabalho como proprietário e acionista de diversas empresas no Haiti, incluindo o Haiti Networking Group SA (HAINET), um provedor de serviços de Internet. Também dirige a Blanchisserie du Soleil, rede de lavagens, e a COFI Industrie SA, que produz produtos de papel. Além disso, está envolvido na San Aquino SA, uma empresa focada no desenvolvimento do turismo.
A decisão do CPT foi anunciada no jornal oficial do país. Já Conille denunciou que a medida foi “tomada fora de qualquer estrutura legal e constitucional”, o que levanta “sérias dúvidas sobre sua legitimidade e suas repercussões sobre o futuro” do Haiti.
O ex-primeiro-ministro afirmou ainda que o Conselho Presidencial de Transição tem o poder de nomear o primeiro-ministro, mas não de demiti-lo.
Em maio passado, quando a CPT tinha que eleger o primeiro-ministro do atual governo de transição, o nome de Alix Didier Fils-Aimé já circulava como possível candidato. No entanto, naquela ocasião, Conille, um funcionário de longa data da ONU, conseguiu prevalecer como primeiro-ministro interino, cargo que ocupou por apenas seis meses.
Crise no governo haitiano
Apesar das denúncias contra o CPT, a demissão de Conille decorre por ter deixado escapar o pedido de renúncia de três membros do governo interino (Gérald Gilles, Emmanuel Vertilaire e Smith Augustin) que, em agosto, se envolveram num escândalo de corrupção.
Na ocasião, o presidente do Banco Nacional de Crédito, Raoul Pascal Pierre-Louis, alegou que esses três membros da CPT haviam exigido dele a quantia exorbitante de US$ 758 mil (R$ 4,3 bi) para garantir sua continuidade no cargo.
Assim, o atual presidente do CPT e consequentemente presidente interino do país, Leslie Voltaire, durante seu discurso de posse para o novo primeiro-ministro, elogiou a “coragem e determinação” de Conille, mas afirmou que fez parte de “lutas políticas estéreis”.
“Já chegou a hora de o Haiti pensar e fazer política de forma diferente”, afirmou. Ao mesmo tempo, Fils-Aimé disse que trabalharia para harmonizar os dois poderes do Executivo.
Em resposta às graves acusações, no início de outubro, a unidade anticorrupção do Haiti (ULCC), um órgão oficial, emitiu relatório que aconselhava a abertura de processos judiciais contra os três membros da CPT. Essa situação aumentou a pressão sobre a CPT para substituir os representantes, mas devido à natureza sem precedentes do conselho de transição, criado fora da estrutura constitucional e sem eleições, o órgão interino permaneceu em funcionamento.
O Conselho Presidencial de Transição é um órgão colegiado que exerce os poderes do presidente. Após extensas negociações entre diferentes setores políticos do Haiti, junto com a Comunidade do Caribe, os Estados Unidos, o Canadá e a França, o CTP foi estabelecido em abril, após as pressões para a renúncia do impopular primeiro-ministro Ariel Henry.
É formado por nove pessoas, sete com direito a voto e dois observadores, todos representando diferentes setores políticos do Haiti. Sua função é organizar e garantir as próximas eleições do país para eleger um presidente e um parlamento para assumir o cargo em fevereiro de 2026. A última vez que foram realizadas eleições presidenciais foi em 2016.
Também é formalmente o órgão (juntamente com o primeiro-ministro interino) responsável pela polêmica Missão Multinacional de Apoio à Segurança (MSS), um destacamento de forças policiais liderado pelo Quênia, no país desde junho.
O CPT também é marcado pela crescente impopularidade entre a população haitiana e das afirmações de que a demissão de Conille teria sido ilegal.
A mudança de primeiro-ministro inaugura um novo período de incerteza sobre o futuro político da nação caribenha, que se encontra em meio a uma grave crise humanitária. De acordo com o último relatório da ONU, entre janeiro e junho de 2024, o país sofreu mais de 3.600 homicídios e 1.100 sequestros. Enquanto isso, de acordo com a Organização Internacional para as Migrações (OIM), a violência forçou mais de 700 mil pessoas – metade delas crianças – a fugir de suas casas.
(*) Com Brasil de Fato e TeleSUR