Terça-feira, 8 de julho de 2025
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A terra treme às 15h. Atrás de uma pequena catedral de cor mostarda e estilo colonial, se ergue uma escura nuvem de poeira cinza. Após alguns minutos, a terra volta a tremer. Dessa vez, o pó sobe mais, compacto e uniforme. Perto de San Luis de Potosí, cidade no centro do México a cerca de 360 km da capital, a extração de ouro e prata em uma mina no povoado de Cerro de San Pedro já comeu metade da colina de San Pedro, símbolo do estado. Além do estrago no patrimônio local, o refugo da mina está sobre a fonte de água potável da região e moradores dizem que há riscos de contaminação – a empresa responsável, por sua vez, nega as acusações.

Federico Mastrogiovanni



A histórica colina de San Pedro foi reduzida à metade com a exploração intensiva de minérios

“Hoje não tem mais”, comenta dom Marcos Rángel. “Quando se passam mais de cinco minutos, quer dizer que não vai haver mais explosões. Em alguns dias, são até seis, uma após a outra, mas eles nunca deixam que se passem mais de cinco minutos entre as explosões.”

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Desde 2007, a mineradora canadense Newgold, por meio de sua subsidiária mexicana, a Mineradora San Xavier (MSX), dedica-se à extração de minérios na zona, que nasceu e se desenvolveu em torno da mineração a partir de 1592.    

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O pequeno centro mineiro de Cerro de San Pedro, que hoje tem menos três mil habitantes, foi erguido nas encostas da colina de San Pedro, uma área povoada e explorada durante séculos pelos espanhóis, graças à abundância de metais preciosos, principalmente ouro e prata. Após séculos de exploração das minas, os metais se esgotaram e a pequena vila foi abandonada. A colina, porém, se tornou um símbolo e figura inclusive no brasão do estado de San Luís Potosí, logo abaixo dos pés do santo, para simbolizar a raiz da riqueza e do desenvolvimento do território.   

Atualmente, metade da colina já foi derrubada, depois de apenas três anos de extração. “Em 1995, a Newgold chegou a Cerro de San Pedro”, conta Carlos Covarrubias Rendón, um dos advogados encarregados da defesa da colina e um dos fundadores da Frente Ampla Opositora (FAO). “Desde o início, com o projeto em mãos, foi possível ver as intenções da empresa. Depois de checar os planos de impacto ambiental, a população optou pela oposição pacífica, mas firme, às operações de perfuração, que se manteve até 2007”, afirma. Segundo ele, o trabalho “constante e paciente” de um grupo de advogados e de pequenas organizações ambientalistas e cidadãos demonstrou em todos as instâncias que a Mineradora San Xavier atuava ilegalmente.   

Federico Mastrogiovanni



Habitantes de Cerro de San Pedro protestam quase diariamente pela interrupção da mina de ouro e prata

Poluição da água   

O processo de extração utilizado pela Mineradora San Xavier é a lixiviação, método que consiste na separação dos componentes (ouro e prata) de uma massa sólida por meio de um solvente. No caso de Cerro de San Pedro, o ouro e a prata são separados da rocha da montanha com o uso do cianeto de sódio, considerado poluente.   

Todos os dias, a colina é destruída por meio de duas ou mais explosões. Caminhões transportam o material e, com a ajuda de 32 milhões de litros de água potável por dia, cerca de 16 toneladas de cianeto de sódio são introduzidos através da rocha. O solvente faz sua função e os metais preciosos são recolhidos e separados. O que sobra é descartado.   

Moradores explicaram que a extração não é algo novo na região, mas desde a chegada da Mineradora San Xavier, tudo mudou, por causa do processo de extração. “O perigo deste processo já foi comprovado. Supostamente, deveriam ser usados revestimentos impermeáveis para evitar que o cianeto se infiltre nos lençóis aquíferos. No entanto, foi demonstrado que o revestimento não resiste ao tempo e o cianeto vaza, contaminando a água e a terra”, diz David Covarrubias Rendón, irmão de Carlos, geólogo e assessor técnico da FAO. De acordo com ele, ainda mais poluentes que o cianeto são os metais pesados restantes da lixiviação: chumbo, arsênico e cádmio, que contaminam águas subterrâneas de forma definitiva.    

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“Os resultados deste processo serão vistos em dez anos, quando a exploração da mina já terá terminado e não haverá tempo para reverter o cenário. Isso sem falar na utilização da enorme quantidade de água potável, tirada diretamente das fontes da região e desviada do consumo humano. Não há um só aspecto que permita que esse tipo de mineração seja considerado sustentável, embora a Mineradora San Xavier afirme em seu site que atua de uma forma totalmente sustentável para o meio ambiente”, diz Covarrubias.   

O diretor da San Xavier, Luis Rodolfo Rodríguez, afirmou ao Opera Mundi que é interesse da empresa desenvolver a região de San Luis Potosí. “Nossos opositores não conseguiram provar o que afirmam, que poluímos. Pelo contrário: desde o começo dos trabalhos cuidamos do meio ambiente, assim como do patrimônio cultural da cidade, gerando emprego, organizando atividades e financiando o bem estar de todos”.

Rodríguez reconheceu que as substâncias usadas no processo de lixiviação são tóxicas, mas diz que as quantidades são controladas: “A contaminação da água é impossível.”   

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Em queda de braço com mineradora, mexicanos tentam frear destruição de patrimônio histórico

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