A missão de observação eleitoral da União Europeia na Venezuela apresentou nesta terça-feira (23/11) a versão preliminar de seu informe sobre as eleições regionais realizadas no país no último domingo (21/11). Segundo a chefe da missão, a deputada portuguesa Isabel Santos, foram constatadas melhorias no sistema eleitoral venezuelano e a atual conformação do Conselho Nacional Eleitoral (CNE) foi a “mais equilibrada dos últimos 20 anos”.
“Os cinco reitores [do CNE] alcançaram melhorias nos componentes técnicos das eleições através do diálogo interno”, disse Santos. A observadora se refere ao fato de que, para essas eleições, uma nova diretoria foi nomeada para o órgão eleitoral, contando com a presença de dois diretores da oposição e três do governo.
Santos disse também que “as eleições ocorreram em melhores condições em comparação com processos anteriores” e que “a renovação no CNE em maio de 2021 fez com que o órgão fosse visto como o mais equilibrado em 20 anos”.
Questionada sobre como poderiam constatar essas melhorias, já que é a primeira vez que a UE envia observadores à Venezuela em 15 anos, a deputada portuguesa esclareceu que a comparação era com os últimos processos que haviam acompanhado.
A chefe da missão de observadores ainda agradeceu a “cooperação do CNE e do povo venezuelano” com o trabalho dos europeus e disse que irá combater “qualquer tentativa de utilização deste informe com motivações políticas, com as quais não temos nada a ver”.
O chefe da observação do Parlamento Europeu, Jordi Cañas, também elogiou o trabalho feito pelo órgão eleitoral da Venezuela e garantiu que o sistema eleitoral venezuelano, com “o mecanismo eletrônico, é um sistema confiável”.
“Irregularidades”
Entretanto, Santos alegou supostas “irregularidades” no processo. “Nossa missão pôde constatar a falta de independência judicial, a não aderência ao Estado de direito e que algumas leis afetaram a igualdade de condições, o equilíbrio e a falta de transparência das eleições”, disse Santos.
Questionada por Opera Mundi se poderia dar exemplos concretos dessa ausência de condições, a observadora internacional disse que não colocaria um “carimbo” no processo eleitoral, que não afirmaria se foi ou não democrático.
“Eu percebo a vontade dos jornalistas em tentar me fazer colocar um carimbo, um rótulo nessas eleições. Eu não farei isso”, disse.
Lucas Estanislau
Missão de observação eleitoral da União Europeia na Venezuela apresentou a versão preliminar de seu informe sobre as eleições regionais
Opera Mundi ainda perguntou a Santos se o histórico das relações recentes entre a UE e a Venezuela não poderia afetar ou, de alguma maneira, entrar em contradição com o caráter “neutro e independente” do informe final dos observadores europeus, já que o bloco reconheceu o ex-deputado Juan Guaidó, da oposição, como presidente interino do país, ao que a deputada se limitou a dizer que não comentaria “assuntos internos” da Venezuela.
Outro ponto criticado pela chefe de observação foi “o uso extensivo de recursos do Estado” que, supostamente, teriam sido utilizados na campanha eleitoral. Segundo Santos, “não houve sanções do Conselho Nacional Eleitoral a essas violações”.
A missão de observação europeia ainda afirmou que retornará à Venezuela em janeiro de 2022 para concluir o relatório final, que deve ser divulgado em fevereiro do próximo ano.
Tensões entre UE e Venezuela
A presença de observadores europeus nas eleições regionais venezuelanas, além de ser fruto de acordos da mesa de diálogo entre governo e oposição iniciada no México em setembro, marca o retorno de uma missão da UE ao país latino-americano após 15 anos. Entretanto, declarações recentes do chefe da diplomacia do bloco europeu, Josep Borrell, geraram críticas de autoridades do país.
O primeiro atrito entre Bruxelas e Caracas ocorreu ainda em outubro, quando Borrell disse que enviaria uma missão de observadores para “acompanhar a oposição” e que a presença das autoridades europeias seria “uma garantia maior para eles”. Além disso, o chefe da diplomacia da UE havia afirmado que o informe final que será redigido pelos observadores do bloco irá “legitimar ou deslegitimar” o governo do presidente Nicolás Maduro.
Caracas reagiu às declarações as classificando como uma “violação flagrante” das normas impostas aos observadores pela Justiça Eleitoral do país. À época, o presidente do Parlamento, Jorge Rodríguez, chegou a dizer que “se eles vêm para violar as normas, violar o convênio que eles assinaram, melhor que não venham”.
Já no dia 4 de novembro, os posicionamentos de Borrell voltaram a criar tensões com a Venezuela quando o europeu se reuniu com migrantes venezuelanos no Brasil e elogiou o programa “Braços Abertos” do governo brasileiro, que recebe cidadãos do país vizinho que atravessam a fronteira.
O chanceler venezuelano Félix Plascencia condenou o que chamou de “obsessão” do chefe da diplomacia da UE contra a Venezuela e disse que Borrell “deveria dedicar sua pretensão em dar lições de democracia, liberdade e prosperidade a atender às necessidades dos cidadãos europeus”.