Na segunda parte da entrevista ao Opera Mundi, Miguel Tinker Salas, professor do Pomona College, na Califórnia, analisa a nova abordagem dada pelo presidente venezuelano, Hugo Chávez, à política petrolífera, focada na busca de novos mercados, fora da esfera norte-americana. Autor do livro The Enduring Legacy: Oil, Culture, and Society in Venezuela, publicado nos Estados Unidos, Salas avalia também se o preço do petróleo comprometerá o desenvolvimento do projeto de Chávez.
De que maneira o petróleo influencia as relações de Venezuela com o resto do mundo?
Num primeiro momento, o petróleo exige que a Venezuela opere dentro da órbita dos Estados Unidos. A partir da Segunda Guerra Mundial, a Venezuela se converte num fator-chave da política militar dos norte-americanos. Assim, durante a Guerra Fria, o país é mostrado como a vitrine da democracia, o modelo que os Estados Unidos propõem como exemplo para a região.
O governo Chávez procurou diversificar seus mercados, buscando novos sócios. Mas ainda assim, Caracas continua a exportar a maior parte do seu petróleo para os Estados Unidos, onde existem refinarias capazes de refinar o petróleo pesado venezuelano.
O governo de Chávez fez do petróleo uma ferramenta de diplomacia. Foi o primeiro chefe de Estado a agir assim?
Sem dúvida, o governo Chávez tem construído uma nova política de petróleo buscando novos mercados na Ásia e novos parceiros como a China, Índia e Rússia. Também ele estabeleceu o sistema Petro- Caribe, uma organização regional liderada pela Venezuela pela qual 18 países da América Central e do Caribe compram petróleo em condições especiais. Mas da mesma maneira, você poderia argumentar que os governos anteriores, que destinavam quase toda a produção para os Estados Unidos, com um alinhamento absoluto sobre a política da Casa Branca, tinham uma diplomacia petrolífera, com um objetivo oposto.
O petróleo tem um peso cada vez maior nas exportações venezuelanas, impedindo uma verdadeira diversificação. É uma fatalidade venezuelana?
Não obstante a existência de projetos alternativos, o país continua dependente do petróleo. Este é um fato não só na Venezuela, mas em quase todos os países onde a mono- exportação tem raízes nas últimas décadas do século 19 e nas primeiras décadas do século 20. Todavia, o petróleo constitui um produto único, com um impacto determinante na economia global, o que sublinha a dependência que tem criado na Venezuela.
Apesar de precisar de mais recursos, o governo rejeita qualquer aumento do preço da gasolina. Como explicar este medo de todos os governos na hora de aumentar este preço, muito subsidiado pela PDVSA (menos de 0,05 dólares por litro) ?
Sem dúvida há uma visão nacional de que o petróleo é um privilégio para todos os venezuelanos. Isso se manifesta por meio preço da gasolina, o mais barato do mundo e pela idéia de que o Estado deve subsidiar uma série de benefícios para a sociedade. Neste sentido, a mentalidade provocada pela renda petroleira tem formas múltiplas em toda a economia.
Todo mundo lembra do Caracazo – rebelião popular de 27 de fevereiro de 1989, que matou entre 400 e mil pessoas -, cujo ponto de partida foi um aumento do preço da gasolina. Embora o governo atual tenha afirmado que o preço é insustentável, também entende que é um fator cultural e social. Aumentar o preço da gasolina teria impactos políticos, mas também culturais.
Com a brutal queda dos preços do petróleo, o governo terá dificuldade em financiar sua chamada Revolução Bolivariana. O senhor acha que isso vai significar uma queda da popularidade também?
O processo político na Venezuela não depende apenas do preço do petróleo. Lembre-se que, quando Chávez foi eleito em 1998, o preço era de cerca de 9 dólares por barril. Quando começou a aumentar de maneira irracional, foi resultado da especulação sem limites nos mercados estrangeiros. Sem dúvida a crise econômica e a queda do preço do barril limitam o alcance das ações do governo.
Chávez deverá dar prioridade a projetos sociais na Venezuela e, provavelmente, reduzir sua presença internacional. Mas duvido que o preço do barril se mantenha no seu nível atual durante muito tempo. Dá para perceber que a tendência verificada nas últimas semanas tem sido no sentido de um aumento lento, mas constante.
Leia a primeira parte da entrevista:
Petróleo está presente na cultura e na alma dos venezuelanos
NULL
NULL
NULL