Os cenários políticos de Chile e Brasil apresentam semelhanças na atualidade. Os dois países são governados por mulheres de campos políticos parecidos. Nas eleições recentes para o Poder Legislativo, porém, tiveram resultados distintos, com o conservadorismo ganhando espaço no Brasil, enquanto forças de esquerda cresceram no Chile.
Em novembro de 2013, junto com a vitória do projeto reformista de Michelle Bachelet, o Chile elegeu uma maioria de representantes de esquerda para o Parlamento, o que reforçou a hegemonia da agenda progressista no debate político do país. No Brasil, apesar da reeleição da presidente Dilma Rousseff, o Congresso que saiu das urnas terá uma representação conservadora comparável ao panorama de 1964, segundo análise do Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar), com o aumento da bancada religiosa e de ex-policiais.
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No caso chileno, o crescimento da esquerda veio acompanhado de um rompimento com fatores como geração e origem política. Por exemplo, dos 13 novos deputados das bancadas de esquerda que iniciaram seu primeiro mandato em 2014, seis têm menos de 30 anos e somente um é militante de partido político considerado grande – Daniella Cicardini, do Partido Socialista.
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Bachelet com três deputadas eleitas no ano passado: Karol Cariola, Maya Fernández e Camila Vallejo (da esq. para direita)
Os demais concorreram por partidos pequenos ou de frentes políticas alternativas. A maioria deles surgiu na vida política do país através das grandes marchas estudantis de 2011, como Gabriel Boric, da Esquerda Autônoma, e Giorgio Jackson, do movimento Revolução Democrática. Do Partido Comunista vieram duas mulheres, Camila Vallejo e Karol Cariola, também nascidas politicamente no movimento estudantil. O quinto membro é Vlado Marinovic, militante do movimento regionalista do norte do Chile e eleito pelo Partido Progressista.
Segundo a analista política María Francisca Quiroga, esse fator da origem política cria um ponto que não distancia tanto a esquerda chilena da brasileira no aspecto da renovação. “Não é a esquerda partidária que está se renovando. Dentro dos partidos da coalizão de governo os nomes continuam sendo os mesmos, a renovação aconteceu a partir do crescimento dos movimentos sociais que impulsaram novos líderes”, explicou Quiroga, que é acadêmica da ELAP (Escola Latino Americana de Pós-graduação).
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A análise vale também para o Brasil, na opinião da cientista política, que vê o mesmo problema de falta de espaço dentro da coligação governista para o surgimento de novas lideranças de esquerda. Segundo ela, um dos sintomas desse problema é que os novos rostos que surgem são sempre através de padrinhos, sendo as próprias presidentes exemplos disso, lembrando o histórico político de ambas: Michelle Bachelet não era uma política tradicional, nunca havia competido em qualquer eleição, até ser ministra de Saúde de Ricardo Lagos (2000-2006), depois foi ministra de Defesa e se tornou candidata à Presidência, apadrinhada por Lagos. Já Dilma teve uma ascensão parecida, ocupou o Ministério de Minas e Energia nos primeiros anos do governo Luiz Inácio Lula da Silva e passou à Casa Civil, até chegar à Presidência, sempre contando com a indicação do presidente Lula.
“Elas foram a representação do novo, da renovação, já que em ambos os países a mulher no poder representava uma novidade. Claro que depois cada uma alçou seu próprio voo. Hoje Bachelet é uma figura política muito mais forte e relevante que Lagos”, comenta Quiroga.