A nomeação de um novo primeiro-ministro na França 60 dias após a realização de eleições legislativas antecipadas não significou o fim da crise política no país. Quinze dias depois de assumir o posto, o conservador Michel Barnier finalmente apresentou ao presidente Emmanuel Macron uma lista de 38 ministros para ocupar o futuro gabinete – mas o anúncio oficial dos nomes aos franceses ainda não ocorreu.
O impasse permanece entre a direita, fortalecida pela escolha de um nome do partido Os Republicanos (LR) para o cargo de premiê, e o centro, representando o presidente. A esquerda, vencedora do pleito realizado em junho e julho, não participa do novo governo, “depois que Barnier teve de engolir diversas recusas dos socialistas” durante as conversas para a formação da lista de ministros, salienta o jornal Libération nesta sexta-feira (20/09).
“Se ainda precisasse de uma prova do enfraquecimento do Executivo depois da dissolução da Assembleia, essa divulgação dos nomes sem o anúncio oficial nas escadarias do Eliseu é mais uma. A nova versão da lista preliminar, retocada por Macron que a julgou à direita demais, representa um reequilíbrio” das forças políticas no governo, acrescenta o jornal.
Barnier – que chegou a ameaçar jogar a toalha diante das dificuldades para compor o gabinete – prometeu revelar até domingo o ministério completo. Os últimos detalhes são alinhados entre o grupo macronista e a direita tradicional.
Críticas
No entanto, Macron não teria recusado nenhum dos nomes indicados, entre eles o de políticos conservadores da ala mais à direita do LR.
O senador Bruno Retailleau, da direita católica, se prepara para comandar uma das pastas mais importantes, o Ministério do Interior. A indicação de Retailleau, que tem posições parecidas com as da extrema direita sobre a questão da imigração, foi denunciada neste sexta-feira pela esquerda.
Outro nome anunciado e criticado pela oposição foi o da senadora LR Laurence Garnier, escolhida para o Ministério da Família, apesar de suas posições contra o casamento homoafetivo e contra a inscrição do direito ao aborto na Constituição francesa.
A presidente interina de Os Republicanos, Annie Genevard, ficaria com a Agricultura. Dezesseis dos 38 ministros congitados já estão em algum ministério atualmente.
Gabinete ‘absurdamente parecido’ com o anterior – e sem a esquerda
“O primeiro-ministro reivindica uma ruptura, mas o perfil da sua equipe se parece absurdamente com a precedente, apimentada com mais pesos pesados dos Republicanos – como se fosse uma confirmação da ‘direitada’ do mandato de Emmanuel Macron”, afirma Le Monde, ao salientar que a ausência de políticos da esquerda “contribui para a impressão de desequilíbrio da nova equipe”.
Le Monde acrescenta ainda que os macronistas, “acostumados a segurar as rédeas do poder há sete anos, ficaram furiosos por não serem convidados a participar das grandes decisões”.
Já Le Figaro avalia que as negociações políticas para a formação do gabinete sinalizam “que o nível continua a baixar – e já estávamos próximos do nível do mar” desde a dissolução da Assembleia francesa. A lista com os nomes do ministério é apresentada “depois de 15 dias de intensas negociações nos bastidores, pontuadas de golpes baixos, portas batendo e ameaças de demissão”.
“Diante de tal espetáculo, como se espantar que o voto de protesto se refugie no Reunião Nacional, na França Insubmissa ou na abstenção?”, questiona o diário, referindo-se aos partidos de extrema direita e esquerda radical, respectivamente.
“O novo primeiro-ministro sabia que deveria encarar a hostilidade de princípio” destes dois partidos, continua Le Figaro, mas agora também “precisa contar com a hostilidade dissimulada do partido presidencial” – e em especial do ex-primeiro-ministro Gabriel Attal, líder dos macronistas.