Às vésperas das eleições gerais no Reino Unido, a serem realizadas nesta quinta-feira (04/07), as pesquisas apontam para um resultado claro: a derrota do Partido Conservador, atualmente no poder com o premiê Rishi Sunak. Depois de 14 anos na oposição, o Partido Trabalhista, liderado por Keir Starmer, parece estar prestes a voltar ao governo com uma grande maioria.
Pesquisas eleitorais sugerem que a frustração com a situação da economia é um dos principais motivos a impulsionar a mudança. De acordo com o think tank norte-americano Pew Research Center, apenas 22% dos eleitores acham que a economia do Reino Unido está em boa forma.
Até mesmo apoiadores convictos do Partido Conservador concordam. Há não muito tempo atrás, em 2017, cerca de 75% dos apoiadores do partido tinham uma opinião positiva sobre a economia. Hoje esse número está em 27%.
“Coisas começam a melhorar”
Essa não é uma boa notícia para uma legenda que teve uma década e meia para implementar sua visão econômica no país. No entanto, o governo está se apegando a alguns dados econômicos moderadamente positivos dos últimos meses, considerando-os um motivo pelo qual os eleitores ainda podem confiar nos conservadores para administrar a sexta maior economia do mundo.
“Depois de dois anos difíceis que o país teve, sem dúvida, agora as coisas estão começando a melhorar”, disse o premiê Sunak em maio. “A confiança está voltando à economia e ao país.”
A economia do Reino Unido saiu da recessão no primeiro trimestre de 2024, com um crescimento melhor do que o esperado de 0,7%. A inflação também caiu pela primeira vez em três anos para a meta de 2% do Banco da Inglaterra, fortalecendo as expectativas de que o banco central do país venha a cortar as taxas de juros no final do verão britânico.
O analista Andrew Goodwin, da Oxford Economics, diz que há sinais preliminares de recuperação econômica. “No contexto dos últimos dois anos, a economia está indo razoavelmente bem”, avalia. “Há um crescimento sustentado, embora não no ritmo que normalmente se veria nos estágios iniciais de uma recuperação.”
Preocupações dos eleitores
No entanto, ele diz que detalhes de políticas econômicas não têm sido um grande ponto de discussão durante a campanha eleitoral. “As políticas econômicas tendem a não ter muito apelo entre os eleitores, e os partidos se concentraram principalmente em outras questões”, diz. “Mesmo assim, as pressões sobre o custo de vida e o subfinanciamento dos serviços públicos são dois fatores fundamentais por trás do desejo de mudança dos eleitores.”
O analista Creon Butler, diretor de economia e finanças globais do think tank londrino Chatham House, avalia que a situação da economia está motivando os eleitores, principalmente a questão da inflação. Ele também diz que o financiamento dos serviços públicos é uma questão muito importante para os eleitores.
“Eles podem ver as consequências do fraco desempenho da economia no Serviço Nacional de Saúde (NHS, na sigla em inglês) e em toda uma série de outros serviços, desde a polícia até as autoridades locais, gastos com estradas e assim por diante”, comenta.
“Ou seja, o que o público vê é são as consequências do fraco desempenho econômico, que o governo não tem dinheiro suficiente para gastar em serviços públicos essenciais.”
Uma questão importante para o próximo governo será o investimento público. Um estudo recente do Institute for Fiscal Studies, um instituto de pesquisa econômica sediado no Reino Unido, prevê que o investimento do setor público, como percentual do PIB, diminuirá de uma estimativa de 2,4% para este ano para 1,8% até 2028.
“Não acho que o público esteja ouvindo a história completa dos partidos políticos sobre as escolhas realmente difíceis que temos de fazer”, diz Butler. “As consequências da fraqueza da economia, especialmente o crescimento da produtividade, não foram realmente explicadas ao público na medida necessária”, avalia.
Goodwin concorda. “O formato da política fiscal pós-eleitoral está em debate, mas ambos os partidos estão ignorando amplamente a herança ruim que terão de enfrentar no próximo governo”, afirma.
Poucas diferenças quanto à política econômica
Embora haja uma grande debate entre ambos os partidos, inclusive sobre como aumentar a produtividade e o crescimento do PIB, muitos comentaristas dizem que as políticas econômicas de trabalhistas e conservadores não diferem muito.
Desde o desastroso e curto governo de 49 dias da conservadora Liz Truss, o Partido Trabalhista tem se apresentado como a opção estável para administrar a economia.
O governo de Truss entrou em colapso devido às suas políticas econômicas pouco ortodoxas. Isso destruiu a imagem dos conservadores como um partido com competência econômica. Mas, desde a posse do também conservador Jeremy Hunt no cargo de ministro das Finanças do Reino Unido, os trabalhistas não se opuseram a muitas de suas posições econômicas.
A trabalhista Rachel Reeves, que deverá ser a ministra das Finanças num governo trabalhista, tem posições semelhantes às de Hunt sobre tributação e regras fiscais, dois aspectos cruciais nos gastos públicos.
Mesmo assim, Butler avalia que um governo trabalhista após 14 anos de governos conservadores pode levar a uma mudança econômica fundamental. “É importante não subestimar o fato de a abordagem geral ser muito diferente porque a filosofia é diferente”, observa.
Ele diz que o Partido Trabalhista difere fundamentalmente dos conservadores em três áreas da política econômica: o papel do setor público, a regulamentação e a atitude em relação à União Europeia.
É nas relações com a UE que o impacto de um governo trabalhista provavelmente seria sentido mais rapidamente. Embora o líder dos trabalhistas, Keir Starmer, tenha cuidadosamente evitado falar sobre o Brexit desde que assumiu a liderança, os conservadores tentam retratar uma vitória trabalhista como “ruim para o Brexit”.
“O Brexit estaria em perigo com os trabalhistas”, resumiu Sunak recentemente.
Butler diz que os trabalhistas têm menos “bagagem” do que os conservadores com relação à UE e que, embora não queiram necessariamente reabrir as negociações para, por exemplo, voltar a participar da união alfandegária, eles estariam interessados em desenvolver relações mais cordiais e produtivas entre a UE e o Reino Unido do que as dos últimos anos.
No entanto, ele enfatiza que, independentemente de quem vencer as eleições, o impacto de longo prazo da saída da UE continuará a ser muito grande. Vários estudos mostraram que o PIB do Reino Unido está hoje entre 2% e 3% menor do que ele seria se o Brexit não tivesse acontecido.