Desde a Revolução Iraniana, que fundou uma república populista teocrática islâmica, em 1979, Irã e Estados Unidos não mantêm relações. Outro ponto de atrito é o programa nuclear iraniano, motivo das sanções econômicas impostas pela ONU (Organização das Nações Unidas) desde 2006. Por isso, o Irã vem procurando formas alternativas de comércio, junto a países subdesenvolvidos e emergentes.
Na segunda parte da entrevista concedida ao Opera Mundi, de Nova York, o jornalista iraniano Homaan Majd, intérprete do presidente Mahmoud Ahmadinejad e autor do livro The ayatollah begs to differ (O aiatolá pede para discordar), analisa as mudanças que podem ocorrer na tensa relação entre os países com a eleição de Barack Obama e a aproximação do Irã com a América do Sul.
O presidente Ahmadinejad viria à América do Sul esta semana, mas adiou a viagem para depois das eleições de 12 de junho. Qual a importância para o Irã das relações com a região e especialmente com o Brasil?
As relações são extremamente importantes para o governo iraniano, porque o país deseja – e precisa – buscar alternativas de mercado. Países que sejam amigos, contatos políticos fora da Europa e dos Estados Unidos. Por que ele cancelou a viagem é impossível afirmar com certeza, mas se falarmos em “timing”, era realmente um mau momento para promover essa visita, ainda mais com a forte oposição no país. O povo não entende em um primeiro momento a importância do contato e vê como um desperdício de dinheiro. Também não entende a ausência por tanto tempo em um momento crucial político. Em viagem, ele poderia estar exposto a uma série de ataques da oposição.
O governo iraniano acredita na América do Sul e por isso abriu embaixadas na Nicarágua, Bolívia, tem ótimas relações com a Venezuela. Quanto ao Brasil, a visão é de que é um país muito importante, devido ao poder que tem frente a outros países, por seu tamanho, pelo desenvolvimento de tecnologias. O Irã quer fazer comércio bilateral com o Brasil. Além disso, vê no presidente Lula um entusiasta dos países emergentes e dos subdesenvolvidos.
Projetando um cenário em que Ahmadinejad perca as eleições, as relações com os Estados Unidos poderiam melhorar?
Independentemente do resultado, com Ahmadinejad ganhando ou perdendo, as relações já irão melhorar, pois Barack Obama tem uma postura diferente das administrações anteriores com relação ao Irã, uma vontade de dialogar. Claro que seria mais fácil sem Ahmadinejad, especialmente devido às declarações dele quanto ao Holocausto. É difícil para um governo dos Estados Unidos lidar com isso, pela proximidade com Israel. Obama não quer ir para a guerra com o Irã e sabe que o país é uma importante peça do quebra-cabeça da geopolítica internacional. Ele não rejeita o país, ao contrário de George W. Bush.
Como foi a recepção dos iranianos à eleição de Obama?
As pessoas ficaram muito felizes e ao mesmo tempo, surpresas. Em setembro, quando as chances de Obama eram grandes, os iranianos não podiam acreditar que um negro, com um nome árabe, pudesse dirigir o país mais poderoso do mundo. Havia dúvidas no Irã se o lobby judeu deixaria isso acontecer, se as pessoas compareceriam às urnas. O governo iraniano recebeu muito bem a notícia e enxerga um interlocutor em Obama. Entendem que ainda estão lidando com os Estados Unidos, mas com um presidente diferente dos anteriores.
Tendo em conta as diversas ocasiões em que o senhor conviveu com o presidente iraniano, como é Ahmadijead?
Ele é muito inteligente. E charmoso para aqueles que o conhecem. Nós no Ocidente, de alguma forma, o consideramos como uma figura ridícula, quase caricatural. Mas olhando a partir da perspectiva do iraniano, as palavras de Ahmadinejad fazem muito sentido. Os iranianos têm muito respeito por ele e se incomodam com a ridicularização que ele sofre em certas partes. No mundo árabe, o consideram um ótimo político, que aborda questões importantes para a região. Ele é uma pessoa bastante racional – não em questões como a do Holocausto, claro – mas falando de maneira geral.
Leia a primeira parte:
Problemas econômicos desafiam presidente do Irã na luta pela reeleição
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