Horas após discursar na abertura do debate de chefes de Estado da 79ª Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU), em Nova York, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva participou nesta terça-feira (24/09) de um evento paralelo, organizado por ele e pelo presidente do Governo da Espanha, Pedro Sánchez, no encontro “Em defesa da democracia: lutando contra o extremismo”, também na sede da ONU, na cidade norte-americana.
No evento, Lula fez um balanço sobre a quebra de confiança no regime democrático, abalado pelo agravamento da exploração capitalista, abrindo espaço para extremismo e forças totalitárias.
“A democracia liberal demonstrou-se insuficiente e frustrou as expectativas de milhões. Ela se tornou apenas um ritual que repetimos a cada 4 ou 5 anos. Um modelo que trabalha para o grande capital e abandona os trabalhadores à própria sorte não é democrático. Um sistema que privilegia os homens brancos e falha com as mulheres negras é imoral. Fartura para poucos e fome para muitos em pleno século XXI é a antessala para o totalitarismo. Nossa luta é fazer com que a democracia volte a ser percebida como o caminho mais eficaz para a conquista e efetivação de direitos”, disse o presidente. Para Lula, a democracia vive seu momento mais crítico desde a Segunda Guerra Mundial.
O encontro foi acompanhado pelos presidentes da França, Emmanuel Macron; de Cabo Verde, José Maria Neves; do Chile, Gabriel Boric; e do Conselho Europeu, Charles Michel. Também participaram os primeiros-ministros do Canadá, Justin Trudeau; do Timor Leste, Xanana Gusmão; de Barbados, Mia Motley, além dos representantes da Noruega, Colômbia, Quênia, México, Estados Unidos, Senegal e da ONU.
Transparência
Coanfitrião do encontro, Pedro Sánchez abordou o problema da desestabilização causada pelas redes digitais e falou sobre um plano para fomentar a democracia.
“É necessário promover a transparência e a responsabilidade dos meios de comunicação e das plataformas digitais, e, especialmente, de todos que desenvolvem a inteligência artificial. Na Espanha, acabamos de aprovar um plano de ação pela democracia, em que abordamos estas e outras questões, colocamos em marcha medidas concretas para melhorar a qualidade da informação, fortalecendo a transparência. Os cidadãos têm de saber quem são os proprietários dos meios de comunicação que estão por trás das informações que se publicam e que consomem”, disse.
Apesar de criticar o capitalismo, Lula ponderou que não defende “acabar com o livre mercado, mas sim recuperar o papel do Estado como planejador do desenvolvimento sustentável e como garantidor do bem-estar e da equidade”. Sobre liberdade de expressão, o presidente brasileiro diz que é algo central numa democracia absoluta, mas não pode ser absoluto, e defendeu regulação das redes sociais, para conter a propagação de discursos que conduzem à opressão.
“As tecnologias digitais ajudam a promover e difundir o conhecimento, mas também agravam os riscos à convivência civilizada entre as pessoas. As redes digitais se tornaram um terreno fértil para os discursos de ódio misóginos, racistas e xenofóbicos que fazem vítimas todos os dias. Nossas sociedades estarão sob constante ameaça, enquanto não formos firmes na regulação das plataformas e do uso da inteligência artificial”, disse.
“Eu rezo que não tenhamos que passar por outra Guerra Mundial para podermos ser capazes de fazer a coisa certa. Estamos a bordo desse bloco, porque o sistema democrático, que, mesmo com suas imperfeições, por causa da desigualdade, da dependência excessiva dos mercado, é o melhor modelo”, destacou a primeira-ministra de Barbados, Mia Motley.
Combate ao extremismo
Tanto Lula quanto Sánchez apontaram que o encontro desta terça marca o início de uma série de outras atividades entre esses países para defender a democracia e combater o extremismo.
“Os movimentos extremistas promovem o discurso do ódio, a polarização, a divisão, a intolerância, a radicalização e a violência, enfraquecendo o diálogo cívico e ameaçando a coesão social. Os extremistas procuram sempre minar a confiança dos cidadãos nas instituições, que garantem as liberdades e o Estado de Direito”, afirmou o presidente de Cabo Verde, José Maria das Neves.
Já o presidente do Chile, Gabriel Boric, afirmou que os líderes progressistas que defendem a democracia não devem vacilar na condenação do autoritarismo, independentemente da ideologia. Citou os casos da Venezuela, Israel, Nicarágua e Rússia.
“Diante dessas situações, precisamos adotar uma única posição como países progressistas. Nós, como movimentos progressistas, precisamos ser capazes de defender princípios. E nisso, acho que às vezes fracassamos, pois não usamos a mesma medida para julgar aqueles que estão do nosso lado”.