O presidente venezuelano Nicolás Maduro reconhece que o mundo enfrentará “turbulências” nos próximos anos com a transição do governo norte-americano – do democrata Joe Biden para o republicano Donald Trump. No entanto, considera que, para a Venezuela, será uma oportunidade para estabelecer um “novo tipo de relação” com os Estados Unidos.
A posição de Maduro foi manifestada durante a entrevista exclusiva que o líder venezuelano concedeu ao jornalista e fundador de Opera Mundi, Breno Altman. A conversa é uma edição especial do programa 20 MINUTOS:

Para o líder venezuelano, ainda não é possível avaliar se as possibilidades de negociações com Trump serão melhores em comparação com o governo anterior. Entretanto, após descrever a Venezuela como uma nação de “vitoriosos”, Maduro disse que o país tem planejado projetos nacionais como o chamado “Plano da Pátria 2025-2031”, e afirmou estar confiante “para sairmos bem em qualquer cenário que possa surgir”.
“O passado já passou, agora temos de olhar para o futuro. Vamos esperar e ver o que o futuro nos reserva”, frisou.
Em relação aos conflitos no Oriente Médio, sobretudo na Faixa de Gaza, e às expectativas referentes a Trump, que governa a principal nação aliada de Israel, Maduro disse esperar que o acordo de cessar-fogo, que está em vigor atualmente, possibilite o posterior reconhecimento do direito do povo palestino e, consequentemente, o estabelecimento do Estado da Palestina, tendo sua capital em Jerusalém Oriental.
“O ensaio criminoso contra o povo palestino em Gaza diz que ali foi ensaiada a guerra psicológica, a guerra nas redes, a guerra militar, o extermínio étnico do povo palestino. Mas o povo palestino resistiu e saiu vitorioso”, disse o mandatário. “Sem dúvida, as elites dos Estados Unidos e da Europa estão tentando conter as mudanças no mundo, hegemonizar as mudanças no mundo. E isso já não é possível, há outro mundo e nenhum povo permitirá ser apagado do mapa, ou que neguem seu direito ao futuro”, completou.
Por fim, o presidente venezuelano revelou não esperar que os Estados Unidos respeitem a soberania de seu país.
“Não se pode esperar que os outros nos respeitem, temos de nos fazer respeitar. Digo sempre ao povo um pensamento do grande José Gervasio Artigas, um dos grandes libertadores da América do Sul, um homem firme, corajoso, capaz. Sempre repetimos Artigas: ‘não esperemos nada além de nós mesmos’”, afirmou.
Veja trechos da entrevista de Breno Altman com Nicolás Maduro (para a entrevista na íntegra, clique aqui):
Breno Altman: presidente, o que a mudança de governo nos Estados Unidos, do democrata Joe Biden para o republicano Donald Trump, significa para a Venezuela? O senhor acha que o novo presidente vai repetir a política agressiva do seu primeiro mandato, de 2017 a 2021, quando chegou a ameaçar a Venezuela com agressão militar?
Nicolás Maduro: você pergunta: o que é que isso significa para a Venezuela? Eu te respondo que para a Venezuela significa uma oportunidade de abrir a porta a um novo tipo de relação em que todos ganham. Isso é o que significa para nós.
E para o mundo?
Para o mundo, significa grandes mudanças que estão em pleno andamento, e certamente veremos turbulências, problemas, mas o reconhecimento de que já existe um mundo multicêntrico, pluripolar, e que o mundo multicêntrico pluripolar prevalecerá, e que esperamos que se cumpra o que o presidente Trump ofereceu: que haja paz, que não haja mais guerra, que acabe a guerra e que todas as outras questões sejam resolvidas através da diplomacia e da paz.
O senhor acha que com Donald Trump as possibilidades de negociar com a Venezuela são melhores do que com o governo cessante, o governo de Joe Biden que acabou de sair?
Ninguém pode falar isso neste momento, posso te dar a minha opinião sobre o passado, mas o passado já passou, agora temos de olhar para o futuro. Vamos esperar e ver o que o futuro nos reserva. O que eu posso falar para você, Breno, e para o povo brasileiro, é que esta Venezuela que está aqui hoje, que você vê, essa Venezuela está de pé. Esta Venezuela tem um projeto nacional, um grande projeto americano. Nosso projeto, como falava Bolívar, é a pátria, é a América.
Temos um projeto para o país, temos um plano muito claro, discutido com o nosso povo, que é o Plano da Pátria 2025-2031; temos um poder popular, temos fusão militar-policial popular, somos vitoriosos. Hoje, você olha para mim e somos vitoriosos e estamos nas melhores condições para sairmos bem em qualquer cenário que possa surgir. Desenvolvemos um pensamento estratégico herdado do Comandante Chávez. Chávez tinha uma capacidade de pensamento geopolítico e estratégico fantástica, brilhante, magnífica, e nós fomos seus alunos diretos.
O Presidente Lula sabe, porque a gente se conheceu, eu o conheci quando era ministro das Relações Exteriores, e ele conhece os debates muito interessantes que aconteciam sobre o mundo e sua evolução. Chávez foi quem visualizou e nos disse que o BRICS são nosso caminho, mesmo em 2006, 2007, de fato ele escreveu isso no programa de governo que deixou para 2012.
E você acha que Donald Trump vai respeitar a soberania da Venezuela?
Não se pode esperar que os outros nos respeitem, temos de nos fazer respeitar. Digo sempre ao povo um pensamento do grande José Gervasio Artigas, um dos grandes libertadores da América do Sul, um homem firme, corajoso, capaz, e sempre repetimos Artigas: “não esperemos nada além de nós mesmos”.
Não esperemos nada de ninguém, daqui, de lá… Não, não, não. É você que tem de planejar com suas forças, com sua capacidade, o que você pode conseguir, e com base nisso avançar. Se você esperar que alguém te ajude… não, não, não. É você que tem de ajudar você próprio.
Ajude-se a você próprio e caminhe com seu próprio esforço, como o grande Ho Chi Minh: “caminhar com seus próprios pés, pensar com sua própria cabeça e construir com suas próprias mãos”. No dia em que Nossa América não esperar nada do exterior e construir tudo de dentro com o seu próprio esforço, esse dia chegará e a independência florescerá com prosperidade e seremos respeitados.
Assim, cada um só tem de se fazer respeitar com firmeza, com patriotismo e com razões.
Presidente, como interpreta a escalada militar dos Estados Unidos e seus aliados em regiões como a Ucrânia e o Oriente Médio, especialmente na Palestina? O mundo está próximo de uma guerra mundial? O que pode mudar? Volto a perguntar sobre Donald Trump, o que pode mudar com a administração de Donald Trump diante de um cenário tão perigoso no mundo?
O Papa Francisco disse que já estávamos numa terceira guerra mundial, nós acreditamos nisso, o ensaio criminoso contra o povo palestino em Gaza diz que ali foi ensaiada a guerra psicológica, a guerra nas redes, a guerra militar, o extermínio étnico do povo palestino. Mas o povo palestino resistiu e saiu vitorioso, o povo palestino.
Destruíram seus edifícios, destruíram suas mesquitas, mas não conseguiram destruir seu orgulho de ser palestino e seu direito de pertencer àquela terra, por isso esperamos que este acordo de cessar-fogo em Gaza seja o prelúdio de um acordo de paz que reconheça o direito do povo palestino a ter seu próprio Estado, sua independência e sua capital em Jerusalém Oriental.
Esperamos que muito em breve exista um acordo de paz na Ucrânia e que esta guerra militar possa se dissipar e, seguramente, da guerra militar passaremos a outra, à guerra cognitiva, à guerra comunicacional, à guerra econômica, porque, sem dúvida, as elites dos Estados Unidos e da Europa estão tentando conter as mudanças no mundo, hegemonizar as mudanças no mundo.
E isso já não é possível, há outro mundo e nenhum povo permitirá ser apagado do mapa, ou que neguem seu direito ao futuro. Por isso, temos uma diplomacia que é a diplomacia da paz e em todas as circunstâncias defendemos a paz.