As Mães da Praça de Maio realizaram nesta quinta-feira (18/11) a 1700ª
marcha em protesto por seus filhos desaparecidos durante a ditadura
militar argentina (1976-1983), como fazem todas as semanas, desde o auge
da repressão até o período democrático.
Luciana Taddeo
Todas as quintas-feiras, as Mães da Praça de Maio marcham em protesto contra o desaparecimento dos filhos
Pontualmente, às três e meia da tarde, ali estavam elas,
persistentes e a postos, levando a mensagem “aparição com vida dos
desaparecidos” bordada nos panos brancos que sempre amarram na cabeça e
cobrem os cabelos da mesma cor, para iniciar a volta na pirâmide
localizada no centro da praça, em frente à sede do governo.
A marcha foi acompanhada por um grupo de admiradores que todas as
quintas-feiras protestam com elas, carregando bandeiras e gritando
“presente!” a cada vez que um nome é lido pela narração que acompanha o
protesto e lembra um por um dos filhos que sofreram a “desaparição
forçada”.
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“Chegamos aqui pela primeira vez desesperadas pelos nossos filhos.
Não sabíamos que passariam tantos anos, achávamos que conseguiríamos
encontrá-los”, afirmou Hebe de Bonafini, presidente da Associação Mães
da Praça de Maio, em referência ao dia 30 de abril de 1977, quando
fizeram seu primeiro protesto. Como os militares tentavam reprimir a
manifestação pedindo que circulassem, as Mães começaram a tradição de
caminhar dando voltas na praça, com cartazes que pediam a aparição com
vida dos presos desaparecidos.
“Quem poderia acreditar naquele grupinho de loucas que enfrentou a
ditadura? Nunca uma organização, em todo o mundo, marchou 1.700
quintas-feiras sem deixar de ir a nenhuma”, registra a associação em seu
site oficial. Ao fim de cada protesto, gritavam as consignas: “Com vida
os levaram, com vida os amamos” e “Aparição com vida”.
Hebe confessou em um discurso feito após a marcha que a idade já
pesa para ela e suas companheiras: “Acordamos de manhã cheias de dor,
doem nossas pernas, os olhos, o joelhos, o rim, o coração, tudo.” O
avanço dos anos, no entanto, não foi suficiente para diminuir a
persistência de suas reivindicações: “Mas mesmo assim, quando se
aproxima das três da tarde, vamos correndo pra frente do espelho para
colocar o pano na cabeça e quando chegamos na praça já não sentimos dor
nenhuma. Por isso eu digo que nossa saúde mental está aqui, na luta”,
garantiu Bonafini.
Luciana Taddeo
Mensagens políticas se tornaram frequentes nas manifestações das Mães
Protesto político
Na marcha 1.700, a faixa carregada pelas mães dizia “Apoiamos o
projeto nacional e popular”. A nova mensagem passou a incorporar a
marcha após a morte do ex-presidente Néstor Kirchner, refletindo o
alinhamento da associação com o governo liderado por Cristina e da
participação das mães na política do país, que ganhou ainda mais força
com o início do mandato do Kirchner.
Com o passar dos anos e a diminuição da possibilidade de que seus
filhos fossem encontrados com vida, os protestos das Mães da Praça de
Maio ganharam cada vez mais caráter político. Algumas das faixas levadas
à frente das marchas nos últimos anos traziam mensagens como: “Lutemos
contra a riqueza da oligarquia terra tenente”, “Trabalhemos pela reforma
agrária”, “Viver combatendo a injustiça” e “Distribuição da riqueza
já”.
Foi devido a esta inclinação a reivindicar mais que o aparecimento
dos filhos que divergências ideológicas internas começaram a surgir.
Finalmente, em 1986, o grupo se dividiu em duas correntes: a Associação
das Mães da Praça de Maio e a Associação das Mães da Praça de Maio –
Linha Fundadora. A primeira conta atualmente com subsídio do governo e
possui cerca de 200 integrantes em todo o país. A segunda, que reúne a
maior parte das mães que originaram esta tradição, se declaram
“independentes”, e conta com aproximadamente 100 membros.
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Nas quintas-feiras, assim como se repetiu na marcha 1.700, as mães
da linha fundadora não deram voltas ao lado do grupo de Bonafini, mas do
lado oposto e em um número reduzido. Apesar das diferenças, estas cerca
de 300 mães dedicaram a vida a um objetivo comum: encontrar seus filhos
desaparecidos e exigir justiça. “Um caminho foi marcado por estas mães
que estão aqui hoje: não faltar nas quintas-feiras”, declarou Bonafini.
Ao final de seu discurso, a presidente da associação majoritária
lembrou que as cinzas das Mães da Praça de Maio que morreram estão
espalhadas pela praça. “Pedimos que fizessem isso com todas, porque
vamos estar aqui sempre. Quando nossas companheiras vão morrendo,
sentimos que estão aqui e que marcham apertadas com nossa faixa, assim
como sentimos com nossos filhos, que estão nos apoiando”, afirmou.
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