Quarta-feira, 26 de março de 2025
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Um hospital público de Bukavu, no leste da República Democrática do Congo, sofreu uma invasão do grupo paramilitar ruandês M23, que matou dezenas de pessoas, enquanto os poucos sobreviveram conseguiram fugir, quase todos eles feridos.

O episódio ocorreu no dia 14 de fevereiro, durante a tomada da cidade por parte da milícia, que é apoiada pelo governo e pelo exército de Ruanda. O grupo iniciou uma ofensiva contra territórios do leste congolês em meados de janeiro, e desde então já conquistou as províncias de Kivu do Norte e Kivu do Sul – esta última é a região que tem como capital a cidade de Bukavu, que também é a segunda mais populosa do país.

No entanto, os fatos só vieram à luz neste domingo (02/03), quando funcionários da Cruz Vermelha e de agências da Organização das Nações Unidas que atuam no continente africano divulgaram o teor de um documento com os relatos de alguns sobreviventes.

O jornal britânico The Guardian publicou, neste mesmo domingo, alguns dos testemunhos sobre os acontecimentos. Um deles foi o de Mugisho Shalukoma, de 20 anos, que precisou amputar uma perna após ter sofrido vários ferimentos a bala durante a invasão.

“De repente, senti meu pé cada vez mais duro. Não vi a pessoa que atirou em mim, não consegui ver mais nada depois dos tiros, e me salvei porque as pessoas ao meu redor me tiraram de lá”, relatou o jovem.

Deogracias Chibambo, um ativista de direitos humanos ligado a organização “Ça Suffit” (“já basta”, em francês), disse que “os invasores entraram facilmente no hospital e simplesmente foram atirando e matando pessoas, inclusive crianças”.

“Houve pânico geral, com balas sendo disparadas de muitos lugares, os sobreviventes foram os que tiveram a sorte de escapar da forma que foi possível”, disse o ativista.

O Comitê Internacional da Cruz Vermelha afirmou ter conseguido resgatar cerca de 162 pessoas que fugiram do Hospital de Bukavu após a invasão do M23 ao local.

Cruz Vermelha Internacional
Massacre cometido pela milícia M23 na República Democrática do Congo vem causando o deslocamento de milhões de pessoas

Segundo Esperance Mwamini Birindwa, enfermeira e porta-voz da sede da Cruz Vermelha na República Democrática do Congo, afirmou que todos os resgatados foram internados em outros centros médicos do país, entre os dias 14 e 24 de fevereiro, mas que três deles faleceram logo após a hospitalização, devido à gravidade do estado em que se encontravam.

Por sua vez, o M23 divulgou um comunicado no qual reconheceu a invasão do hospital, mas alegou que a ação visou enfrentar supostas tropas congolesas escondidas no local, e que a denúncia feita horas antes pela Cruz Vermelha e pela agência da ONU seria uma “peça de propaganda do governo congolês”.

7 mil mortes, 7 milhões de deslocados

O M23 é uma das milícias que faz parte da chamada Aliança do Rio do Congo (CRA, por sua sigla em inglês), que é apoiada pelo governo de Ruanda. Há relatos de que suas ações no território congolês são realizadas em conjunto com tropas do exército ruandês.

O avanço do M23 na República Democrática do Congo é a mais grave escalada em mais de uma década de conflito no leste do país, e tem suas raízes no genocídio de 1994 em Ruanda e na luta pelo controle dos vastos recursos minerais presentes no território congolês.

O M23 é um dos mais de 100 grupos armados que formam parte do CRA e que lutam contra o exército congolês, com o apoio financeiro, logístico e bélico entregue pelo governo de Ruanda, além do envio de tropas do país para participar de ações conjuntas no território vizinho.

Por sua parte, o governo da República Democrática do Congo diz que Ruanda patrocina grupos milicianos da região com o objetivo de se apropriar das riquezas minerais da região.

De acordo com agências da Organização das Nações Unidas (ONU) que atuam no continente africano, a invasão do M23 às províncias do leste da República Democrática do Congo já provocou mais de sete mil mortes, incluindo um massacre no qual 163 mulheres foram queimadas vivas, além do deslocamento massivo de mais de sete milhões de pessoas.

 

Com informações do The Guardian.