“120 mil euros. Vendo rim para pagar hipoteca.”
“Vendo medula espinhal por questões econômicas.”
“Por razões econômicas extremas vendo um dos meus rins.”
Anúncios como esses estão espalhados em páginas de classificados na internet na Espanha. Vender órgãos é uma das maneiras encontradas por alguns espanhóis para conseguir dinheiro.
A reportagem do Opera Mundi conversou por telefone com uma das pessoas que publicaram esse tipo de anúncio. Minerva, de 29 anos, confirmou que colocou a medula à venda por 150 mil euros. Ela contou que trabalha como secretária em um escritório e recebe 1,3 mil euros por mês, mas considera a quantia insuficiente: “A crise está afetando a minha família. Todos – três pessoas – estão desempregados”.
Minerva relata que até hoje não recebeu nenhuma ligação de interessados em sua medula, mas afirma que tem medo de ser denunciada e teme o que possa acontecer se tivesse que fazer a cirurgia. E confessa que não contou a ninguém de sua família sobre o anúncio, porque certamente desaprovariam a atitude.
Denúncia
Esta semana, a Facua-Consumidores em Ação, entidade não governamental que trabalha em defesa do consumidor, registrou uma queixa ao Grupo de Crimes Cibernéticos da Guarda Civil Espanhola contra a venda de órgãos e tecidos pela internet.
Na última terça-feira (21), a organização recebeu uma denúncia de que uma pessoa teria colocado seu rim a venda num site de classificados e resolveu investigar a veracidade da informação. Em algumas horas de busca na rede, a entidade encontrou 31 anúncios que vendiam rins, pulmões ou medulas.
Segundo o porta-voz da Facua, Ruben Sanchez, as ofertas eram feitas por espanhóis ou latino-americanos que vivem como imigrantes na Espanha. Para ele, este não é um problema social generalizado, mas é preciso estar atento, principalmente num momento de crise como o que o país está vivendo. “Entendemos que se uma pessoa se propõe a um ato tão desesperado, isto é fruto de uma penúria econômica muito grande, de um grave problema financeiro. E na Espanha o número de cidadãos que passam por problemas financeiros hoje em dia é muito grande”.
Sanchez também considera que a internet facilita essa prática: “ninguém podia expor publicamente que queria vender um órgão, você não poderia colocar um anúncio em um jornal de algo que era ilegal, mas agora, com a internet, pode-se divulgar de forma massiva”, explica.
O Ministério de Saúde e Política Social da Espanha divulgou uma nota sobre o caso afirmando que a publicação de qualquer anúncio referente à venda de órgãos é ilegal. O comunicado diz também que esse tipo de comércio é impossível pela forma como está organizado o sistema de doação e transplantes no país, que é referência em todo o mundo.
A Espanha é líder mundial em matéria de transplantes, com uma taxa de 34,2 doadores por um milhão de pessoas em 2008. No Brasil, foram 7,2 doadores por milhão, segundo dados da Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO).
Anúncio em site espanhol oferece rim:
Não ao tráfico de órgãos
Assim como no Brasil, o comércio de órgãos na Espanha é proibido. De acordo com o artigo 8.3 do Real Decreto 2070/99, “proíbe-se fazer qualquer publicidade sobre a necessidade de um órgão, tecido o sobre sua disponibilidade, oferecendo ou buscando algum tipo de gratificação ou remuneração”.
Uma lei da União Européia determina ainda que não serão penalizados apenas os indivíduos responsáveis pela retirada ou pela comercialização de partes do corpo humano, mas também qualquer pessoa que colabore com o transporte, conservação, importação ou exportação dos órgãos.
A venda de órgãos e tecidos também é condenada pelo Conselho da Europa, pela Sociedade Internacional de Transplantes e pela OMS (Organização Mundial de Saúde), que considera que o tráfico de órgãos viola os princípios de equidade, justiça e respeito à dignidade humana.
Um relatório da OMS divulgado no mês passado revela que o tráfico de órgãos aumentou nos últimos anos. O documento também cita a internet como veículo de divulgação tanto da venda como da compra de órgãos e tecidos humanos.
* Texto e fotos
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