A julgar pela recepção que lhe deram na manhã de terça-feira (10) nesta pequena cidade do Golfo do México, os norte-americanos amanheceram extasiados com um presidente que na noite anterior exigiu aos políticos, grandes corporações e bancos que fizessem sua parte para tirar o país da crise econômica.
“A festa acabou, seria bom que percebessem isso”, disse Barack Obama ontem, na primeira entrevista coletiva na Casa Branca, onde praticamente formalizou a mudança que quer imprimir à América. “O povo norte-americano não precisa ser convencido de que é preciso resolver a crise, porque já está sofrendo com ela. Agora é o governo que tem que atuar”.
Desde a semana passada, quando o pacote de recuperação econômica parecia que ia derrapar no Senado, Obama decidiu voltar aos velhos métodos de fazer política. Começou a reunir-se publicamente com pessoas de todos os estratos sociais, um pouco por todo país, e diante deles, dos chamados grass-roots (militantes), começou a pressionar o Senado para aprovar seu plano.
A coletiva, inédita porque nunca um presidente tinha feito algo assim na terceira semana do primeiro mandato, foi outra forma de pressão. E o Senado percebeu.
Hoje, por 61 votos a 37 – três senadores republicanos incluídos –, o pacote de US$ 838 bilhões foi aprovado. A Câmara dos Deputados tinha aprovado sua versão por US$ 819 bilhões e agora os dois planos vão a uma comissão de conciliação para se obter a versão final, que será submetida a Obama.Saiba mais.
O presidente estava no meio do discurso no auditório Harbourside, em Fort Myers, quando seu chefe de gabinete lhe passou um papel com a informação da aprovação do pacote. Quando Obama confirmou ao público o que estava se passando, foi o delírio.
Mais de 4 mil pessoas, que fizeram fila para entrar desde a madrugada, começaram a pular de alegria e entoar a palavra de ordem da campanha, “yes, we can” (sim, podemos), transformando-a em “yes, we did” (sim, nós conseguimos). Velhos cartazes de campanha voavam, os pais carregavam as crianças, jovens dançavam e – lá no palco – Obama sorria e repetia: “yes, we did”.
“Parece que os senadores se assustaram quando souberam que eu vinha a Fort Myers. Parece que não querem ver o pessoal de Fort Myers furioso”, disse Obama.
E acrescentou: “São boas notícias e quero agradecer a todos os membros do Senado. Ainda temos de conciliar as duas versões antes de chegarem à minha mesa, de modo que vamos ter de trabalhar um pouco nos próximos dias. Mas é um bom começo”.
Antes do anúncio, Obama explicava que para ele, a aprovação do plano de recuperação é chave para seu futuro político. “Espero ser julgado pelos meus resultados. Não vou dar nenhuma desculpa [para meus fracassos]. Se isso não funcionar e as pessoas sentirem que não levei o país ao bom caminho, já sabem o que fazer, escolher um novo presidente”.
Gente que perdeu o emprego e a casa, mas não a esperança
A cidade costeira de Fort Myers não foi escolhida por acaso. Esta região registra o pior índice de desemprego da Flórida. No ano passado, aqui foram cortados 12.000 dos 255.000 postos de trabalho em todo o estado.
Também teve o maior número de propriedades residenciais perdidas, em todo o país, porque seus donos não puderam pagar a hipoteca, informou a Casa Branca num correio eletrônico enviado aos jornalistas.
“Toda a minha família trabalhava num centro comercial. Meus pais, meu marido, eu, minha irmã e seu marido. No ano passado, o centro fechou e nós perdemos tudo, incluindo as casas”, contou ao Opera Mundi Tabita Williams, uma jovem de 23 anos, com dois filhos, que participou do encontro com Obama. A família toda vive agora em casas emprestadas pela Igreja Católica e depende do seguro-desemprego.
Para gente como eles, Obama teve uma palavra. “Quero que saibam que estou a par de que esta é a pior área do país em termos de fechamento de casas. Que esta crise é algo que afeta suas famílias e amigos. Por isso vamos fazer todo o possível para que os proprietários responsáveis possam ficar em suas casas”, afirmou.
Ao lado de Tabita, estava John McVeigh, um agricultor do Arkansas que há 10 anos veio para a Flórida trabalhar na indústria das laranjas. Também está desempregado. “Eu perdi o meu trabalho porque os patrões começaram a contratar os imigrantes ilegais. Eles cobram menos, e não lhes pagam o seguro”, explicou.
A maior parte dos pessoas presentes consultadas pelo Opera Mundi assistiu à coletiva do presidente na noite anterior e, por isso, veio vê-lo ao vivo. “Rezo para que seu plano seja aprovado. Seria a única forma de melhorar a maioria dos terríveis cortes que fizeram no orçamento das escolas”, disse a professora Tracee Tobler.
Ao contrário das expectativas presidenciais, a aprovação do pacote no Senado não teve um grande apoio bipartidário. Só três senadores republicanos votaram a favor, o que representa um problema para Obama, que defendeu a necessidade de um amplo apoio nas duas Casas.
Em Fort Myers, falando com jornalistas, um assessor do presidente minimizou a questão. “A crise é tão grande que o importante é ser aprovado. Os senadores perceberam a mensagem. À medida que vejam que o presidente está bem sério na questão do bipartidismo, acabarão por perceber a sua necessidade”.
Dow Jones caiu
Mas se a reunião popular em Fort Myers foi prazerosa, o presidente encontrou más notícias quando regressou a Washington: na Bolsa de Nova York, o índice Dow Jones caiu quase 400 pontos. Também caíram os outros índices dos Estados Unidos e as principais bolsas européias, assim como a Bovespa.
A queda parece ser uma consequência direta do anúncio feito pelo secretário do Tesouro, Timothy Geithner, sobre os planos da administração para ajudar as instituições financeiras.
Geithner disse que o governo pensa em comprar uma série de ações em bancos com problemas e apoiar o mercado de crédito, mas não deu pormenores sobre os planos, apenas assinalou as duas áreas onde vai atuar. Ontem, na coletiva, Obama também não quis informar detalhes, mas disse que era “para não estragar” o discurso do secretário do Tesouro.
Segundo analistas, o plano poderia beneficiar o Bank of America e o Citigroup, duas instituições financeiras em dificuldades, mas com perspectivas de recuperação.
“O mercado tinha a esperança de que Geithner e o Departamento do Tesouro iam nos dar algo substancial. Mas uma vez mais esconderam os pormenores”, comentou ao Wall Street Journal o estrategista de investimentos da Mainstay Investments, Bill Knapp.
NULL
NULL
NULL