A recente crise diplomática entre a Colômbia e os Estados Unidos reflete a necessidade de os países latino-americanos formarem uma frente comum para abordar questões como a migração, fortalecer a integração regional e se aproximar de economias do sul global, como as dos BRICS, disse o ex-presidente colombiano Ernesto Samper em entrevista exclusiva à Sputnik.
“Existem pelo menos oito ou 10 mecanismos de integração sub-regional que poderiam encontrar um ponto de convergência na Celac para definir uma posição comum diante da política do senhor Trump”, disse o também ex-presidente da Unasul sobre a crise diplomática entre Washington e Bogotá.
“Nunca estivemos tão desintegrados”
Para o doutor em economia e direito, os países latino-americanos poderiam apresentar na cimeira da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC), convocada com urgência para 30 de janeiro pela presidente hondurenha Xiomara Castro, uma posição comum sobre temas como a migração, a luta contra as drogas, a defesa da soberania territorial ameaçada, o caso do Canal do Panamá e a defesa da colaboração da China na América Latina.
“Todas essas são questões que deveriam fazer parte de uma espécie de resposta da América Latina às teses que hoje fazem parte da nova ‘Doutrina Trump'”, disse ele.
Essa política do novo governo em Washington, disse Samper, nos leva de volta 50 anos aos tempos da Operação Condor, quando a intenção dos Estados Unidos era desestabilizar os países que eram considerados inimigos e como exemplo, exemplifica, há a aliança do país norte-americano com as ditaduras militares do sul e o assassinato do ex-presidente chileno Salvador Allende. em setembro de 1973.
“A integração nunca foi tão importante como agora na América Latina e nunca estivemos tão desintegrados como estamos no momento”, disse o coordenador do Grupo de Puebla, que reúne líderes progressistas da América Latina.

Ex-presidente da Colômbia, Ernesto Samper afirma que países da América Latina estão desintegrados, mas que é preciso de uma união contra a extrema direita de Donald Trump
Brasil, chave na aproximação com os BRICS
Nesse sentido, o ex-presidente considerou que, embora não concorde com uma diplomacia ideológica como a adotada pelo presidente republicano, é necessária uma aproximação com países do sul global, como os BRICS.
“É inevitável que, se esta for a posição do Sr. Trump, então uma aliança de progressismo será necessária para neutralizar essa nova influência, esse novo estilo de relações internacionais e nessa formação ideológica, porque a primeira palavra será com o sul. Somos países do sul, especialmente da América do Sul”, disse Samper.
Segundo Samper, o Brasil poderia liderar uma aproximação de toda a região com os Brics, com os países não alinhados ou com os países que são identificados com as coordenadas sul.
“De qualquer forma, a região tem que estar preparada para um alinhamento regional na CELAC ou uma segunda alternativa que seria uma aliança ideológica”, acrescentou.
Rumo a uma nova arquitetura financeira
Para o ex-presidente, o retorno de Trump à Casa Branca representa uma oportunidade de avançar no fortalecimento de uma nova arquitetura financeira que reduza a dependência do dólar e dos Estados Unidos, bem como de se aproximar de uma moeda — e até mesmo de criptomoedas — na região.
“Mas é claro que enquanto os Estados Unidos persistirem em usar o dólar e as transações em dólares como arma política para isolar os países, para colocá-los contra a parede, como pretende fazer hoje em Cuba ou na Rússia, será muito difícil”, advertiu.
Para Samper, avançar na desdolarização é uma forma de avançar para outra globalização em que não há uma moeda única, um padrão único e um país único, mas pode haver outros fatores de poder que se expressam regionalmente.
Sobre a crise diplomática que eclodiu em 26 de janeiro após Recusa do presidente Gustavo Petro em receber dois aviões militares com migrantes colombianos algemados de mãos e pés, incluindo mulheres grávidas e menores, Samper Pizano disse que é o presidente dos EUA que viola a lei, não os deportados.
“Ele está revisando as leis que tanto nos Estados Unidos quanto as convenções internacionais sobre a proteção de asilados e refugiados exigem tratamento justo, digno e adequado aos estrangeiros que vivem em seus respectivos países”, disse ele.