Começou nesta segunda-feira (08/04) no Panamá o julgamento de 27 acusados de participação em esquema de lavagem de dinheiro associado ao escândalo conhecido como Panama Papers, que revelou como parte dos mais ricos em todo o mundo utilizam paraísos fiscais para a prática de evasão fiscal através de empresas offshore.
As revelações divulgadas pelo Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ), em colaboração com diversos veículos de imprensa internacionais, abalaram governos em diferentes países e resultaram na abertura de inúmeras investigações ao redor do globo, além de prejudicar a reputação do Panamá como centro internacional de investimentos offshore.
Os documentos, inicialmente obtidos pelo jornal alemão Süddeutsche Zeitung através de fontes anônimas, cobrem um período de quase 40 anos – de 1977 a dezembro de 2015.
Entre os 27 acusados estão Jurgen Mossack e Ramon Fonseca Mora, os fundadores do escritório panamenho de advocacia e consultoria Mossack Fonseca – considerado à época como a quarta maior empresa de advocacia offshore do mundo – que teve papel central no escândalo.
O vazamento de 11,5 milhões de documento da Mossack Fonseca gerou acusações contra personalidades influentes como políticos, bilionários e até astros do esporte.
O primeiro-ministro da Islândia, Sigmundur David Gunnlaugsson, foi forçado a renunciar ao cargo após os Panama Papers revelarem que sua família possuía contas em paraísos fiscais. O então premiê do Paquistão Nawaz Sharif foi impedido de assumir cargos públicos pelo resto de sua vida após seu nome aparecer nos documentos.
Outras personalidades cujos nomes surgiram nos Panama Papers eram os do ex-primeiro-ministro britânico e atual Ministro do Exterior do Reino Unido, David Cameron, do jogador argentino de futebol Lionel Messi, do então presidente da Argentina Mauricio Macri e do cineasta espanhol Pedro Almodóvar, entre outros.
Alvos da Lava Jato
No Brasil, a Mossack Fonseca já havia se tornado alvo da Operação Lava Jato, que chegou a deter alguns de seus funcionários em meio a investigações do escândalo de corrupção envolvendo a empreiteira Odebrecht.
Os documentos mostraram que a empresa criou ou vendeu empresas offshore para políticos e familiares de sete partidos: PSDB, PMDB, PP, PDT, PTB, PSB, PSD.
Alguns dos políticos brasileiros envolvidos direta ou indiretamente nas denúncias eram o então presidente da Câmara Eduardo Cunha, o ex-deputado federal João Lyra, o ex-senador Edison Lobão, o deputado federal Newton Cardoso Jr. (PMDB-MG), o ex-ministro da Fazenda Delfim Netto, e o ex-senador e ex-presidente do PSDB Sérgio Guerra, morto em 2014.
Os documentos indicaram que a firma panamenha teria criado ao menos 107 contas offshore para, no mínimo, 57 indivíduos ou empresas relacionadas aos esquemas de corrupção investigado pela Lava Jato.
Entraves para punir envolvidos
Em 2018, a Mossack Fonseca anunciou que iria encerrar suas atividades em consequência de “danos irreparáveis” à sua reputação.
Após o escândalo, o Panamá adotou uma nova legislação contra esse tipo de crime, embora o país ainda esteja na lista negra da União Europeia (UE) de paraísos fiscais.
O fato de que não existirem leis panamenhas contra a lavagem de dinheiro à época do escândalo podem gerar dificuldades às tentativas do Judiciário de punir os envolvidos.
No Panamá, o crime de evasão fiscal passou a ser passível de punição apenas a partir de 2019, ainda que somente para valores acima de 300.000 dólares por ano (R$ 1.500 milhão)
Em 2023, Jurgen Mossack e Ramon Fonseca Mora começaram a ser julgados no Panamá pela acusação de lavagem de dinheiro associada às investigações da Lava Jato no Brasil. Os promotores pediram pena de 12 anos de prisão para ambos. Uma nova audiência está marcada para 26 de abril.