Quarta-feira, 26 de março de 2025
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O Conselho de Segurança das Nações Unidas reuniu-se de emergência na última quarta-feira (19/02) para discutir o conflito na República Democrática do Congo (RDC), palco de avanços e violência do grupo armado M23 (Movimento 23 de Março), aliado de Ruanda.

Segundo a representante especial da ONU na RDC, Bintou Keita, nas 24 horas anteriores à reunião, o M23 capturou a cidade de Kamanyola, localizada na fronteira entre Congo, Ruanda e Burundi. No último sábado (15/02), os rebeldes já haviam avançado sobre a cidade de Bukavu, capital da província de Kivu do Sul e a segunda maior cidade do país.

Keita defendeu que o avanço do grupo, apoiado pelo exército ruandês, ignorou os apelos internacionais por um cessar-fogo, causando “consequências arrasadoras e a perda de muitas vidas humanas”.

A representante pediu que o Conselho tome medidas “urgentes e decisivas” para evitar uma “guerra regional mais ampla”, além de responsabilizar os autores de violações e abusos que estão sendo cometidos contra os civis na RDC.

Além de Kamanyola e Bukavu, o M23 também avançou e tomou controle de Goma, capital da província de Kivu do Norte, em 26 de janeiro. Após dominar a região, o grupo rebelde estabeleceu uma administração paralela na cidade, com a nomeação de um governador e de um prefeito.

Keita também chefia a missão de paz da ONU na RDC, a Monusco, e denunciou que o M23 controla todas as estradas que entram ou saem das áreas sob o seu domínio. Segundo ela, o grupo impôs “severas restrições à liberdade de circulação” dos soldados das Nações Unidas.

De acordo com a representante, os rebeldes impedem os esforços dos soldados da ONU para avaliar os danos no aeroporto de Goma – uma das cidades tomadas pelo grupo, estão impedidos de eliminar munições não detonadas na cidade, e de repor água e outros bens de primeira necessidade.

“Isso impõe sérios desafios ao pessoal civil e fardado da Monusco no cumprimento do mandato de proteção da população civil”, afirmou no Conselho de Segurança.

A Monusco elegeu um novo líder militar em 10 de fevereiro, o responsável é Ulisses de Mesquita Gomes, general do Exército Brasileiro. Em uma das primeiras tarefas do cargo, Gomes chegou à RDC nesta quinta-feira (20/02) para avaliar a situação do conflito.

Na cidade de Beni, o general brasileiro informou que sua viagem ao país africano tem como objetivo principal coordenar a proteção aos civis do país.

MONUSCO/X
Bintou Keita chefia missão de paz da ONU na RDC, e denunciou que M23 controla estradas das áreas sob o seu domínio

Questão humanitária

Keita explicou que os prédios da Monusco nas regiões dominadas pelo M23 estão sob “extrema pressão”, pois abrigam muitos civis refugiados. Segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) mais de 6,7 milhões de pessoas, sendo 40% delas crianças, foram deslocadas nas províncias afetadas pelo conflito.

Desde o último fim de semana, mais de 20 mil pessoas cruzaram a fronteira para o Burundi, país africano que faz fronteira com o leste do Congo. De acordo com a Agência da ONU para Refugiados (Acnur), “muitos estão exaustos, separados da família e precisam urgentemente de ajuda”.

Keita adicionou que o deslocamento em massa, o afluxo de combatentes e prisioneiros e a proliferação de armas agravaram a vulnerabilidade de mulheres e meninas à violência sexual.

Em detalhe, o Comitê dos Direitos da Criança da ONU alertou que as crianças deslocadas e em situação de rua no país estão sofrendo graves violações, incluindo execuções sumárias, recrutamento forçado e sequestro.

De acordo com o organismo, 45 de 120 crianças em situação de rua, que haviam sido atendidas em um centro de ajuda a refugiados em Goma, foram mortas. Segundo a entidade, escolas e hospitais continuam sendo alvejados em meio aos avanços do M23.

De acordo com o Unicef 26,4 milhões de pessoas na RDC precisam de ajuda humanitária urgente. Deste total, 15,4 milhões, ou seja, mais da metade, são crianças.

Origem do conflito no Congo

Segundo uma fonte da RDC, sob condição de anonimato, ao Brasil de Fato, o atual conflito na República Democrática do Congo ocorre porque o país africano é muito rico em recursos naturais, como tântalo, estanho, tungstênio e ouro, os quais o Ocidente se interessa para uso em seu setor tecnológico.

“O Ocidente está usando Ruanda para saquear esses recursos. Já Ruanda criou esse grupo de rebeldes chamado M23, totalmente apoiado por eles para saquear os minerais e levá-los à Kigali, capital ruandesa, para exportação”, explica.

Na análise do ativista pan-africanista, a mídia internacional “distorce a situação” ao configurar o conflito como uma questão étnica. Esse equívoco ocorre porque durante a guerra civil da Ruanda, entre abril e julho de 1994, a etnia tutsi foi massacrada por extremistas étnicos hutus, de modo que 800 mil pessoas foram mortas.

Nos últimos anos, o M23, um grupo predominantemente tutsi e apoiado pelas tropas da Ruanda, conquistou grandes áreas de território no leste da RDC, como em Kivu do Sul e do Norte, alegando que luta para defender a população de sua etnia.

O governo de Ruanda insiste nessa narrativa, mas a fonte da RDC explica que “os rebeldes do M23 são ruandeses que se passam por congoleses”.

(*) Com ONU News