Vários governantes internacionais, além de membros do governo brasileiro, como o ministro da Economia e o presidente do Banco Central, são acusados de terem ocultado ativos em empresas offshore, inclusive com fins de evasão fiscal. A informação faz parte das denúncias feitas pelo “Pandora Papers”, investigação jornalística que envolveu centenas de repórteres pelo mundo.
O resultado do trabalho do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ na sigla em inglês) sobre os chamados “Pandora Papers” começou a ser revelado neste domingo (03/10). Os quase 600 repórteres de dezenas de meios de comunicação, incluindo os jornais The Washington Post, The Guardian, El Pais ou ainda a revista Piauí, se basearam no vazamento de 11,9 milhões de documentos de 14 empresas de serviços financeiros de todo o mundo.
Segundo o consórcio, vários dirigentes de peso, como o primeiro-ministro da República Tcheca, Andrej Babis, o rei da Jordânia, Abdallah II, ou ainda os presidentes do Equador, Guillermo Lasso, e do Quênia, Uhuru Kenyatta, aparecem na lista dos que teriam ocultado milhões em paraísos fiscais. No total, o ICIJ identificou transações de 336 dirigentes, que criaram mais de 1.000 empresas, das quais dois terços tinham sede nas Ilhas Virgens Britânicas. Celebridades, como a cantora colombiana Shakira e a modelo alemã Claudia Schiffer também aparecem na investigação.
Do lado brasileiro, dois nomes de peso foram apontados: o do ministro da Economia, Paulo Guedes, e o do presidente do Banco do Brasil, Roberto Campos Neto. Segundo a investigação, Guedes tinha pelo menos US$ 8 milhões investidos na empresa Dreadnoughts International Group, sociedade registrada nas Ilhas Virgens Britânicas, da qual era acionista. O seu nome, assim como o de sua mulher e filha, eram usados nas transações.
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Funcionários de alto escalão, como Paulo Guedes, têm que cumprir restrições ao aplicar dinheiro em offshores
Conflito de interesses
A revista Piauí, que encabeçou a investigação no Brasil, lembra que “a abertura de uma offshore ou de contas no exterior não é ilegal, desde que o saldo mantido lá fora seja declarado à Receita Federal e ao Banco Central”. Guedes afirma que declarou suas empresas offshore. Porém, os funcionários públicos de alto escalão têm uma série de restrições para fazer esse tipo de transação, principalmente quando sua função pode ter impacto em investimentos feitos no exterior, como é o caso de um ministro da Economia.
Já o presidente do Banco Central aparece no “Pandora Papers” como dono de quatro empresas, duas delas registradas no Panamá. Campos Neto afirma ter declarado as somas que tinha no exterior tanto à Receita Federal como ao BC. Porém, como Guedes, ele participou de decisões ligadas ao seu cargo que podem ter influenciado positivamente seus próprios investimentos no exterior, o que caracteriza conflito de interesses.
Na esteira do Panamá Papers
Criado em 1997 pelo Centro de Integridade Pública, o ICIJ se tornou uma entidade independente em 2017. Sua rede inclui 280 jornalistas investigativos em mais de 100 países e territórios, assim como cerca de 100 veículos de comunicação parceiros.
O consórcio ficou famoso em 2016, quando tornou público o escândalo que ficou conhecido como “Panamá Papers”. Na época, o ICIJ revelou transações e investimentos secretos de milhares de clientes do escritório de advocacia panamenho Mossack Fonseca, após um vazamento de mais de 11 milhões de documentos.
As revelações sacudiram o mundo dos negócios e da política. A tal ponto que chefes de governo, como o primeiro-ministro islandês, Sigmundur David Gunnlaugsson, e paquistanês, Nawaz Sharif, tiveram que deixar seus cargos.
No ano seguinte, o consórcio publicou o “Paradise Papers”, uma nova série de documentos que revelou manobras fiscais ilegais envolvendo nomes como o campeão de Fórmula 1, Lewis Hamilton, e até o Príncipe Charles.