O temor de ver a imagem associada a ações pró-aborto não é uma exclusividade dos candidatos à Presidência do Brasil José Serra (PSDB) e Dilma Rousseff (PT). A onda conservadora e a pressão de movimentos religiosos atingiu até mesmo o Velho Continente, que durante esta semana viu o Conselho da Europa aprovar uma moção em favor de médicos e enfermeiros que se neguem a atender mulheres que queiram realizar um aborto.
A moção do Conselho, com sede na cidade francesa de Estrasburgo e que conta com representantes de 47 países europeus, surgiu como uma reação a uma proposta da deputada sueca Carina Hägg. Ela buscava justamente fortalecer e proteger funcionários de hospitais e clínicas em países com forte oposição dos chamados grupos “pró-vida”, sobretudo no Leste Europeu. Em entrevista ao Opera Mundi, Hägg lamentou o que chamou de retrocesso no continente e mostrou-se preocupada com a campanha eleitoral no Brasil.
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“A luta pelo poder não pode deixar de lado o compromisso pelos direitos humanos, pelos direitos da mulheres. O que está em jogo não é apenas realizar o aborto, mas poder fazê-lo recebendo atendimento adequado. Eu tomei conhecimento do que está acontecendo no Brasil e considero a situação preocupante. O país promoveu grandes avanços nos últimos anos e tem um importante papel na América do Sul. Um avanço no Brasil teria consequências positivas em toda a região” afirmou a deputada de 53 anos, membra do parlamento sueco desde 1995 pelo Partido Social-democrata.
Carina Hägg diz que o movimento anti-aborto voltou a crescer na Europa nos últimos cinco anos, de forma bastante organizada e com pesado suporte financeiro.
Divulgação
Para Hägg , a discussão sobre aborto deve se estender para o âmbito da saúde
“O que aconteceu no Conselho da Europa tem que servir como um despertador para que os políticos acordem e vejam que trata-se de uma oposição sistemática e muito bem planejada, com recursos econômicos e um forte lobby vindo sobretudo da Igreja Católica. Conheço muitos deputados que não compareceram à votação porque temiam prejudicar sua imagem em seus redutos eleitorais, assim como parece acontecer no Brasil”, argumentou.
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Para a política sueca, países onde o aborto é legalizado sem restrições deveriam ser mais atuantes e levantar a questão em suas missões diplomáticas.
“A própria Suécia recuou bastante neste aspecto. O governo não aborda mais o assunto quando nossos representantes viajam a outros países ou recebem visitas de delegações estrangeiras. Se você não tem o apoio de seu próprio governo fica difícil lutar de igual para igual contra os grupos conservadores. Não se trata de se opor a uma religião, mas de tratar a questão do aborto como saúde pública e direitos humanos”, justificou Hägg.
Retrocesso
A moção do Conselho da Europa tem valor prático limitado, já que não se sobrepõe à legislação de cada país. No caso da Suécia, em que o direito ao aborto é previsto na constituição, apenas clínicas particulares podem se negar a atender pacientes, não o serviço público, responsável pelo atendimento da maior parte da população.
“Não é um problema grande na Suécia, mas é uma dura realidade em vários outros países europeus, como a Polônia, onde recentemente uma jovem grávida morreu porque o médico se negou a fazer uma cirurgia intestinal de emergência que poria em risco o bebê. Essa decisão tomada em Estrasburgo mostra que estamos vivendo um retrocesso muito grande”, concluiu.
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