A África do Sul realizou hoje (22) a quarta eleição desde o fim do “apartheid”, em 1994. A justiça eleitoral do país anunciou que o comparecimento às urnas nas eleições parlamentares foi de 87% dos eleitores inscritos – o mais alto desde o fim do regime de segregação racial. De acordo com o jornal Times, centenas de milhares de sul-africanos começaram a se posicionar em fila do lado de fora das zonas eleitorais ainda de madrugada.
O favorito para a conquista da maioria no Parlamento sul-africano, segundo as pesquisas, é o CNA (Congresso Nacional Africano), partido do ex-presidente Nelson Mandela e que tem como indicado à presidência Jacob Zuma. No entanto, os números também apontam que o partido não conseguirá manter a maioria de dois terços dos assentos.
Na atual Assembleia Nacional, o CNA conta com 279 deputados (69,75%), enquanto a Aliança Democrática (DA, na sigla em inglês) tem 50 cadeiras (12,50%), o Partido Inkhata da Liberdade (IFP, em inglês) possui 28 (7%) e os demais da oposição somam 43.
Sul-africanos fazem fila de madrugada
A principal razão para isso é que, pela primeira vez após 15 anos no poder desde o fim do apartheid, o CNA enfrenta a competição de um partido saído de seu quadro de políticos e liderado por negros, o Cope (Congresso do Povo) e fortes diferenças internas no partido.
Durante a campanha, o Cope tentou ganhar votos do CNA questionando a honestidade de Zuma. “Os líderes do partido governista ganham tratamento especial, só os pobres têm que enfrentar a justiça. Estamos cansados de eleger políticos que ganham bons salários, mas continuam roubando o nosso dinheiro”, acusou Mosiuoa Lekota, presidente do Cope no último comício do partido.
Zuma foi protagonista de quase dez anos de polêmicas nos tribunais. Contudo, no último dia 6, a Procuradoria Geral sul-africana retirou as acusações de corrupção, fraude, extorsão e lavagem de dinheiro. O tribunal considerou que houve manipulação no processo aberto contra Zuma.
“Esta é a eleição mais interessante na África do Sul desde a de 1994, porque o CNA enfrenta muitos problemas de corrupção e tem uma oposição mais forte. Além do mais, com o passar dos anos, o discurso do partido de que ele lutou pelo fim do apartheid perde um pouco da força, as pessoas começam a se interessar mais por empregos e serviços” disse à BBC Brasil a cientista política Yolanda Sadie.
Mandela
Em um claro sinal de que a competição é dura, o CNA organizou um encontro em massa no último dia 18 com a presença surpresa de um fraco Nelson Mandela, aparecendo ao lado de Zuma. O líder e símbolo da luta pelo fim do apartheid vive em Moçambique. O apoio de Mandela era necessário.
O CNA, além de abalado pela oposição, ainda vive uma guerra interna entre Zuma e o ex-presidente, Thabo Mbeki. Zuma foi demitido por Mbeki da vice-presidência após ser acusado de aceitar suborno, mas fez um retorno meteórico e venceu Mbeki em 2007, tomando a liderança do partido e eventualmente forçando o perdedor a renunciar.
Desmond Tutu, o aposentando arcebispo da Cidade do Cabo, ganhador no prêmio Nobel da Paz por sua atuação durante o apartheid, questionou em entrevista ao Times a capacidade de Zuma assumir o governo. “Não é como nas eleições anteriores. É tão verdade que as pessoas estão se questionando demais antes de depositar o voto”, afirmou após sair da zona eleitoral, sem revelar seu candidato.
Zuma
Apesar de absolvido pela Justiça, Jacob Zuma, 67 anos, filho dinâmico e autodidata de um trabalhador doméstico, que de pastor de vacas na infância se tornou a cabeça estratégica do CNA, ainda é visto por muitos como uma ameaça para a jovem democracia capitalista, profundamente abalada pela crise econômica mundial.
Seu relacionamento próximo com o principal sindicato do país, o Congresso dos Sindicatos Sul-africanos (Cosatu) e com o Partido Comunista não ajudaram a curar algumas dúvidas de que o político pode desviar do caminho trilhado por Mandela e Mbeki, a favor do capitalismo.
Mas com a África do Sul enfrentando a primeira recessão após uma década de expansão econômica, poucos especialistas acreditam que Zuma fará uma mudança radical para a esquerda.
Durante a campanha, o candidato tentou apaziguar investidores e líderes de negócios. A robustez das instituições sul-africanas, a liberdade de imprensa e o fato de o país ser um respeitado membro do G20 certamente ajudaram.
Zuma promete criar empregos em um país com 22% de desemprego, continuar a construir casas e expandir o estado de benefício social para ajudar a maioria pobre, incluindo o um terço da população que vive com menos de dois dólares por dia. Isto explica sua popularidade junto às bases pobres do CNA.
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