Paulo Nogueira Jr.: ‘Trump é sintoma agudo de decadência da velha arquitetura mundial’
Para economista, países do BRICS e Sul Global devem ocupar espaço e construir a nova arquitetura financeira global
Para o economista brasileiro Paulo Nogueira Batista Jr., a “decadência da velha arquitetura mundial” é encabeçada pelos Estados Unidos e que tal ordem econômica que vigora atualmente “sofreu um choque monumental sem precedentes” desde a chegada de Donald Trump à Presidência norte-americana para seu segundo mandato.
A fala de Nogueira ocorreu no último dia do evento Dilemas da Humanidade: Perspectivas para Transformação Social, nesta quinta-feira (10/04). Durante a mesa “Nova Arquitetura Financeira”, o especialista afirmou Trump produz esse choque por ser uma “figura errática”.
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“Mas também porque os EUA ainda têm uma importância muito grande na economia mundial. O país é a segunda maior economia no mundo, com presença em todas as regiões do globo, influência direta e indireta em todos ou quase todos os países. Com sua chegada, tudo está muito incerto. Eu nunca vi tanta incerteza na economia mundial com a que nós temos agora”, ponderou.
Guerra comercial
Sobre a guerra tarifária de Trump, Nogueira afirmou que a crise não é de agora, apontando que os EUA já vinham em uma “decadência cultural, psicológica, política e econômica bastante acentuadas”. Ainda, para ele, as tarifas anunciadas parecem não ter “métodos nessa loucura” e citou a peça de teatro de William Shakespeare, Hamlet: “é loucura mesmo. E ela é produto da falência do sistema político norte-americano”.
“Trump, na verdade, é um sintoma agudo dessa decadência. E mostra que ela é maior do que se imaginava. E agora, se torna mais explícita. E os Estados Unidos são os primeiros que vão passar da barbárie à decadência sem conhecer a civilização”, declarou, citando o escritor norte-americano Mark Twain.
Por outro lado, Nogueira pontua algo “muito positivo do que está acontecendo” que é a “decadência de um país que tem sido nocivo ao planeta”.
Desdolarização
Nesse espaço aberto pela hegemonia dos Estados Unidos, o economista brasileiro defende que Rússia, China e o BRICS façam a construção da nova arquitetura financeira global. “A Rússia é um país importante que está dando uma demonstração fantástica de resistência, e a China que já está constituindo uma nova arquitetura”.
Nogueira afirma que a desdolarização “já está acontecendo” de diversas maneiras: as transações transfronteiriças de países estão sendo feitas crescentemente em moedas nacionais, como entre Rússia e China, Rússia e Índia, Rússia e Irã, exemplifica. Outro exemplo, segundo o economista, é que “a participação do dólar nas reservas internacionais dos bancos centrais estão caindo gradualmente”.
Para a presidência brasileira no bloco, Nogueira diz que o país tem “três iniciativas possíveis de desdolarização para levar adiante”: a primeira é um sistema de pagamentos internacionais alternativa ao SWIFT, o BRICS Cost Border Payment Initiative (BCPI), foi mencionada pelo Grand Gom.

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A segunda é uma unidade de conta, que funcionaria como uma cesta de moedas dos países BRICS, que funcionaria como uma referência para a futura moeda do bloco. “Não é uma moeda unificada, não seria um tipo de euro, é uma moeda para transações internacionais, um ativo de reserva alternativo às moedas não mais confiáveis
BRICS no centro da alternativa
O fundador do Brics+ Analytics, o russo Yaroslav Lissovik, também participou da mesa desta sexta e falou sobre a criação de plataformas regionais, apontando que o BRICS “é o melhor lugar dentro do Sul global para ser o núcleo para a formação dessas plataformas”.
“E se estamos falando sobre bancos de desenvolvimento regional ou acordos de financiamento regionais, ou acordos de negociação regionais dentro do formato amplo do que você chama, você poderia contar com o BRICS+ como o principal tipo de coordenador, orquestrador dessas plataformas regionais”, afirmou.
Já o Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), conhecido como o Banco do BRICS, poderia ser o mecanismo de coordenação para os acordos de financiamento regional do sul global, sugere. “Minha proposta seria um novo banco de desenvolvimento NDB que envolveria a formação de um círculo de parceiros ou de instituições aliadas que incluiria, em primeiro lugar, os bancos de desenvolvimento regional do Sul Global”, detalha.
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Para ele, a maior parte dos recursos está no “mundo em desenvolvimento” e que “faz sentido que em algum momento haja um movimento muito mais enfático por parte dos países do Sul Global para assumir maior controle” disso.
De acordo com o economista, que trabalhou no Fundo Monetário Internacional (FMI) como conselheiro do Diretor Executivo para a Federação Russa, as instituições internacionais estão dominadas pelas economias ocidentais. Nesse sentido, para reformar esse sistema, o especialista sugere, inspirado nas intervenções do evento Dilemas da Humanidade, no “regionalismo”, ou seja, “blocos regionais no sistema financeiro e comercial que podem apoiar a arquitetura econômica global”.
