O presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, prepara-se para enfrentar um desafio interno, as eleições presidenciais marcadas para 12 de junho. Fragilizado pelo mau momento da economia e criticado dentro do próprio governo pela aspereza de suas posições políticas, mas contando com o apoio da população rural e dos mais pobres, o presidente vai enfrentar a oposição dos reformistas, derrotados por ele em 2005.
“A atmosfera não está tensa, mas também não está normal. E Ahmadinejad está atento a isso”, afirma o jornalista iraniano Homaan Majd, que mora nos Estados Unidos desde a infância, mas vai ao Irã com frequência, é intérprete de Ahmadinejad e acaba de voltar da última viagem ao país natal. Autor do livro The ayatollah begs to differ (O aiatolá pede para discordar), Majd analisa nesta entrevista ao Opera Mundi, desde Nova York, o cenário “complexo e incerto” da política iraniana.
O presidente do Irã vem sofrendo fortes críticas em seu país, conforme as eleições se aproximam. Ele tem chances de ser reeleito?
Sim. Acabei de voltar do Irã e não há dúvidas disso. Mas é preciso levar em conta que as eleições iranianas são muito imprevisíveis, até o último momento não é garantido quem irá ganhar. Só saberemos quem são aqueles com maior chance nas últimas semanas, dias. Ninguém previu a eleição de Ahmadinejad em 2005. Os iranianos são indecisos e por isso um candidato pode ganhar no último dia. Os registros começaram ontem e a campanha, só na semana que vem. Haverá um período de intensa campanha e todos tentarão prever quem será o vencedor, mas é muito difícil. Ahmadinejad tem o apoio daqueles que vivem nas áreas rurais e de pequenos comerciantes, aos quais prestou grande ajuda, com incentivos governamentais.
Quem é a oposição iraniana, quem pode fazer frente a Ahmadinejad?
A principal oposição é dos reformistas, que são diametralmente opostos a Ahmadinejad, que é conservador. Essa fatia da política iraniana é representada por Mir-Hossein Mousavi, primeiro-ministro do Irã de 1981 a 1989. O ex-presidente iraniano Mohammad Khatami apóia Mousavi, mas acredito que ele tenha poucas chances. A juventude iraniana (cerca de 50% da população tem menos de 25 anos) não o conhece muito bem, pois ele esteve fora da política por 20 anos.
Ahmadinejad assiste a desfile militar em Teerã – Abedin Taherkenareh/EFE – 18/04/2009
Quais são as principais preocupações do eleitorado iraniano nestas eleições?
Os pontos-chave dessas eleições para a população são as questões econômicas e a política externa, em maior e menor grau de influência respectivamente. As pessoas estão insatisfeitas, querem maior liberalização, um manejo maior da economia. O desemprego está alto (oficialmente em 11%), a inflação bateu em 20% ao ano. Alguns iranianos precisam ter dois, três empregos para pagar as contas. A economia não está em boa forma.
A política externa aparece com força também nas eleições. Muita gente no Irã não concorda com a postura combativa de Ahmadinejad. Acham que ela não ajuda em nada o país. Pelo contrário, dizem: funciona como combustível para a manutenção das sanções ao país, que debilitam a economia. Por causa delas, não há investimento externo. Os reformistas certamente destacarão isso contra o presidente. E um detalhe: não é que os críticos não concordem com o que ele diz, mas desaprovam o estilo como os pensamentos são colocados. É indiscutível que as palavras de Ahmadinejad sobre assuntos como o Holocausto afetaram a imagem do país. Será um fator no pleito.
Em que medida os problemas econômicos são provocados pelo presidente? Qual é o impacto das sanções?
O problema da economia é baseado em uma questão de administração. Ahmadinejad estava no comando quando os preços do petróleo estavam altos, acima de 75 dólares o barril. Ele gastou muito, em benefícios para o país, também, mas não se importou com os valores. Não é culpa dele que o preço do petróleo tenha caído dessa forma, para menos de 50 dólares, mas sim as atitudes que tomou como presidente, em qual base projetou o orçamento. Ele não conseguiu estimular o investimento doméstico, muito menos o externo.
E o projeto nuclear?
Quanto a essa questão, é praticamente unânime no país que existe o direito ao desenvolvimento da tecnologia nuclear. Todos concordam que o Irã tem esse direito, assim como outras nações ao redor do mundo, como os próprios Estados Unidos, a França e o Paquistão.
O líder espiritual do Irã, aiatolá Ali Khamenei, repreendeu Ahmadinejad em público sobre sua decisão de tirar Mostafa Khaksar Qahroudi do comando da organização da peregrinação a Meca. O ambiente fica mais pesado com declarações assim? Quanto as palavras do aiatolá influenciam o governo e as eleições? O presidente tem autonomia no Irã?
De modo geral, o clima está quente, mas não somente pelas palavras de Khamenei. A maioria das pessoas, claro, simplesmente vive sua rotina, mas há muita discussão nas ruas com as eleições. Os iranianos debatem muito em cafés e restaurantes as ações do governo e os rumos do país. E também levam em conta as palavras de seu líder. A atmosfera não está tensa, mas também não está normal e Ahmadinejad está atento a isso.
Khamenei é o líder supremo do Irã. Ele tem a autoridade máxima. Pode mudar uma decisão do governo a hora que quiser. Quanto às eleições, ele não expõe sua preferência, mas é óbvio que preferiria um conservador. Mas isso não significa que as pessoas votarão em quem ele apontar. A maioria é independente e tem suas próprias idéias.
Um exemplo de que o poder do líder não se reverte em votos foi a eleição do reformista Mohammad Khatami em 1997 por larga vantagem de votos: 70%.
Leia a segunda parte:
Irã busca alternativas de mercado na América do Sul, diz intérprete de Ahmadinejad
Assista aqui entrevista dada por Hooman Madj ao The Daily Show em 28/09/2009
NULL
NULL
NULL