Durante toda a campanha, o presidente eleito do Uruguai, José Mujica, falou muito em educação. “Não há libertação possível sem educação”, disse em diversas ocasiões. O dirigente da coalizão de esquerda Frente Ampla colocou como exemplo os países nórdicos europeus, onde cerca de 60% dos jovens têm ensino superior. Em compensação, no Uruguai, esse número não passa de 20%, segundo dados do INE (Instituto Nacional de Estatística).
Nesse sentido, Mujica considera que um dos meios para melhorar a educação no país, a longo prazo, é a universalização do ensino universitário, para obter maior igualdade social. Um relatório sobre juventude e Mercosul do Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), que será divulgado nesta sexta-feira (11), concluiu que jovens com ensino superior são menos propensos à pobreza. Já entre os jovens com dois filhos ou mais, somente os que têm mais de doze anos de educação formal ficam acima da linha de pobreza.
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No Uruguai, um dos maiores problemas do ensino universitário é a evasão no segundo grau. De acordo com um relatório da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade da República, 35% dos jovens que ingressam no ensino médio não terminam os estudos.
Segundo especialistas, a questão está associada à educação do ensino médio no Uruguai que está formatada apenas para formar estudantes universitários em carreiras clássicas, como advocacia, medicina e agronomia, mas não prepara os jovens para o ingresso em institutos técnicos. “Não há uma boa sintonia entre o mundo laboral e o ensino médio. A educação do segundo grau é basicamente pré-universitária, e precisa de outros componentes que a deixe mais atrativa para os estudantes”, disse ao Opera Mundi Anibal Merino, representante da Federação Nacional de Professores do Ensino Médio.
Apesar disso, Merino acredita que se deve fazer um diagnóstico das causas da evasão antes de tirar conclusões e propor medidas. Ele diz que a solução não deve ser adaptar os programas às exigências do mercado de trabalho, já que o ensino médio propõe “uma educação completa, onde se contemplem todas as possibilidades de formação”.
“Não é somente capacitar [o jovem] para um trabalho, mas sim passar por um desenvolvimento completo das suas habilidades”, afirmou.
Projetos brasileiros
Um dos exemplos para combater a evasão escolar vem do Brasil, que criou o Proeja (Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos). A iniciativa pretende integrar o ensino profissionalizante com a educação básica, tentando superar a dualidade entre trabalho manual e intelectual. O programa inclui trocas curriculares e modificações nos mecanismos de assistência ao estudante para favorecer a sua permanência na escola.
No Brasil, o problema da evasão tem sido combatido, mas o resultado ainda é insuficiente. De acordo com o Censo Escolar da Educação Básica 2009, estudo realizado pelo Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) há uma queda de 1,2% em relação a 2008 no número total de matrículas na Educação Básica, antes com 53,3 milhões, agora com 2,5 milhões de alunos. A Educação Básica engloba a Educação Infantil, Ensino Fundamental, Ensino Médio, Educação Profissional, Educação Especial e Educação de Jovens e Adultos.
De acordo com o IBGE, de 100 alunos que ingressam na escola na 1ª série, apenas 5 concluem o Ensino Fundamental, ou seja, apenas 5 terminam a 8ª série.
As propostas da Frente Ampla para este governo também estão voltadas à valorização das carreiras técnicas, reservando a elas um maior orçamento e colocando em prática um programa orientado à capacitação para o trabalho de pelo menos cinco mil pessoas por ano.
Descentralizar
Outro problema para o acesso ao ensino superior é que o Uruguai possui somente uma universidade pública (a Universidade da República), em Montevidéu, e somente alguns cursos estão disponíveis nos centros regionais em outros departamentos (estados). Desta forma, os jovens que não são da capital e, ao mesmo tempo, são de baixa ou média renda, não têm condições de cursá-la. “Mandar um jovem à capital não é viável”, repetiu Mujica nos atos de campanha.
Por outro lado, embora a universidade pública no Uruguai seja gratuita, 90% dos que ingressam nela pertencem aos dois quintos da população de maior renda do país.
Para enfrentar este problema, a proposta da Frente Ampla inclui a criação de 25 mil bolsas de estudo. Além disso, o orçamento educativo triplicou durante o governo do presidente Tabaré Vázquez, e a ideia é que ele se mantenha em uma porcentagem de 4,5% do Produto Interno Bruto (cerca de 1,5 bilhão de dólares, tomando-se por base o PIB de 2008).
A Frente Ampla propõe ainda criar universidades públicas no interior do país, provavelmente em conjunto com outros países da região, como Argentina e Brasil. Para isso enfrenta certa resistência da Universidade da República, que quer manter o monopólio da educação pública universitária.
Para Mijail Yapor, conselheiro da Federação de Estudantes Universitários do Uruguai, o principal obstáculo para o ingresso à universidade está mesmo na evasão no ensino médio. No entanto, ele acredita que, a longo prazo, a universidade deve ter uma “presença muito mais forte no interior” do país. “A concentração geográfica é extremamente negativa para incentivar os jovens do interior a estudar uma carreira universitária”, afirmou.
Yapor defende ainda que se deve dar maior autonomia aos centros regionais e criar pólos de desenvolvimento universitário nas outras regiões. Entretanto, ele declara que a Federação de Estudantes é contrária à criação de outras instituições públicas. “Uma nova instituição teria que começar do zero e não estaria suficientemente preparada, não teria recursos materiais e humanos nem a renda necessária, não teria potencial de pesquisa”, opinou.
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