Na segunda parte da entrevista ao Opera Mundi, Michael Shifter, vice-presidente do Inter-American Dialogue, aborda as divergências que surgiram dentro da administração norte-americana em relação ao golpe de Estado em Honduras e que, segundo ele, se configuraram mais como uma estratégia do país do que uma genuína fonte de preocupação. No entanto, Shifter pontua categórico: “Se a pergunta é quem decide, a resposta é fácil: Obama. É ele quem toma as decisões políticas fundamentais”.
O presidente George W. Bush foi amplamente criticado por negligenciar a OEA, tentando torná-la menos eficaz e relevante. Por sua vez, o presidente Barack Obama prometeu dar uma maior ênfase em abordagens multilaterais para lidar com desafios regionais. Neste contexto, como o senhor interpreta a decisão de apoiar a revogação da suspensão de Cuba na OEA em abril?
Duvido que uma administração norte-americana encabeçada por Bush ou por John McCain teria aceitado assinar, junto com os países latino-americanos, a revogação da suspensão de Cuba na OEA. Este foi um sinal positivo do governo Obama. Significa que os Estados Unidos estão dispostos a não ter uma política para a região, mas com a região.
Até agora, contudo, não acho que haja o menor indício que o governo Obama se comprometeu em revigorar a OEA. Uma boa indicação disso será a qualidade do próximo embaixador que Obama mandará para a organização.
O golpe em Honduras provoca reações divergentes entre Obama e o resto de sua administração, especialmente entre ele e a secretária de Estado, Hillary Clinton. Por exemplo, ela foi especialmente mais cautelosa do que Obama em relação à volta de Zelaya no país. Como explicar esta diferença?
Honduras não é uma exceção. Em outras questões de política externa, também, assistimos ao que chamamos de rotina “good cop/bad cop” (tira bom e tira mau) entre Clinton e Obama. Voltando a Honduras, Obama adotou um tom muito firme e cheio de princípios, enquanto Clinton ficou muito mais cautelosa, querendo deixar mais espaço para manobras diplomáticas com o objetivo de uma solução pragmática. Não acho que os sinais foram necessariamente contraditórios, mas certamente ilustram diferenças de estilo. Acho que um complementa o outro.
Como o senhor explica o fato de a administração Obama ter se mantido em silêncio frente à repressão do governo golpista – alguns manifestantes foram mortos e jornalistas presos – tendo em mente o peso que os Estados Unidos têm na América Central?
Dado que esta crise migrou para a fase de negociação, imagino que o governo de Obama esteja fazendo o que pode para aumentar as perspectivas de um acordo. Denunciar os abusos do governo Micheletti não irá ajudar nessa direção. Pelo contrário, pode provocar um escalonamento do conflito. Além disso, o governo norte-americano provavelmente prefere apoiar a comissão dos Direitos Humanos da OEA, que tem sido muito ativa pesquisando os acontecimentos em Honduras.
Este exemplo coloca uma questão: quem decide a política externa dos Estados Unidos para o hemisfério?
É muito tentador apontar divergências na política externa entre as diversas agências e os funcionários de alto nível do governo norte-americano. Elas são inevitáveis e seguirão surgindo nos próximos meses e anos do governo Obama. Mas é ainda cedo demais para perceber claramente as divisões sobre política externa. Até agora, a máquina parece funcionar de maneira bastante harmoniosa e eficaz.
Se a pergunta é quem decide, a resposta é fácil: Obama. É ele quem toma as decisões políticas fundamentais. Isso não significa que Clinton, Jones e Gates não sejam importantes, mas o presidente, que é extremamente seguro de si próprio, está no comando. Não há dúvida sobre isso. Ainda não dá para saber como será o trabalho de Arturo Valenzuela, que foi designado como Secretário de Estado assistente para o Hemisfério Ocidental, já que sua confirmação foi temporariamente adiada, precisamente pela crise em Honduras.
O senhor acha que estas divisões podem ressurgir em relação a outros paises, como Bolívia, Equador ou Venezuela?
O que a crise em Honduras revelou de maneira aguda é a persistência das divergências entre o partido democrata e o partido republicano sobre as questões de política externa mais sensíveis. Honduras levanta problemas que vão além do próprio país, incluindo o papel de Hugo Chávez na região e a percepção do problema que ele representa para os Estados Unidos. Dentro do governo, vamos ver diversas abordagens para lidar com estes países e outros. Isso é inevitável, e até certo ponto, saudável. É importante evitar exagerar qualquer divisão dentro do governo, pelo menos até agora.
Leia a primeira parte da entrevista:
Crise em Honduras revela limites da OEA
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