Em 8 de novembro, o embaixador colombiano em Washington, Daniel García-Peña, reuniu-se com altos funcionários de segurança da Casa Branca. Quando saiu, confirmou o que El Tiempo havia noticiado por meio de fontes confidenciais: durante o governo de Iván Duque, a Colômbia comprou um spyware israelense chamado Pegasus.
O Pegasus é um software produzido pelo NSO Group israelense e é habilitado secretamente (sem o consentimento dos usuários) em dispositivos eletrônicos por meio de um jailbreak. Ele lê textos, rastreia chamadas, coleta senhas, localiza telefones e extrai informações de aplicativos como Facebook, WhatsApp e Telegram.
O aspecto grave e controverso da questão é que a Colômbia adquiriu o software por US$ 11 milhões sem informar o presidente Duque. Além disso, a compra teria sido financiada inteiramente pelos Estados Unidos. O pagamento teria sido realizado em dinheiro a Israel. De acordo com as fontes do El Tiempo, o Pegasus parou de ser usado antes de Gustavo Petro iniciar seu mandato presidencial. O secretário de Estado colombiano, Luis Gilberto Murillo, expressou sua preocupação em relação ao grau de violação da soberania nacional e a aparente independência com que atuam algumas instituições colombianas.
“O mais importante é que todas as informações possam ser conhecidas, de forma transparente, sobre como e em quais casos específicos o software foi usado para que tenhamos a garantia de que isso não ocorra novamente”, disse Murillo.
Durante o dia de comemoração dos 105 anos da criação da Força Aérea Colombiana (agora chamada de Força Aeroespacial), Petro disse que a compra e o uso do software de espionagem Pegasus (embora ele nunca o nomeie diretamente) violou a soberania nacional. “Defesa cibernética não é o mesmo que espionagem e, nisso, devemos traçar um limite”, disse ele. “A menos que a Constituição de 1991 seja inútil. A menos que nossa democracia tenha sido enfraquecida.”
Petro acrescentou que “nossa soberania não é apenas agitar a nossa bandeira, e sim que as principais decisões que são tomadas na Colômbia sejam tomadas pelos colombianos. Se elas são tomadas por outras pessoas, independente de quem elas querem ser, então perdemos a soberania.”
Além disso, o chefe de Estado aludiu ao caso em um post no X, afirmando que qualquer ação predeterminada de um nacional “contra a soberania do país é um crime e é chamado: ‘traição à pátria'”.
Petro explicou que seu governo manterá conversas com os Estados Unidos sobre sua soberania nacional, neste caso questionando a independência das instituições colombianas em relação aos desejos do governo norte-americano: “O presidente deve impor a soberania nacional. Essa soberania não é apenas sobre os rumos que a Colômbia deve tomar, mas também tem a ver com a questão de conhecer essa defesa cibernética, que deve estar sob responsabilidade nacional.”
Por enquanto, tanto a Procuradoria-Geral da Colômbia quanto a Promotoria-Geral da Colômbia estão investigando o incidente, que teria ocorrido em 2020. Embora tenha sido prometido que o Pegasus seria usado apenas contra traficantes de drogas em outros países, como México e El Salvador, ele foi usado para espionar outras categorias de pessoas, inclusive contra oponentes políticos.
As revelações controversas levantam uma série de dúvidas sobre a real independência da Colômbia e os métodos de ação dos Estados Unidos na América Latina. Sobre isso, o ex-presidente da Colômbia, Ernesto Samper, postou em sua conta no X: “Agora o caso Pegasus se complicou! Restam perguntas, apenas perguntas: por que até agora, após as eleições nos Estados Unidos, o governo Biden reivindica a responsabilidade pela compra do sistema diabólico? Como a aquisição de um sistema de espionagem eletrônica por 11 milhões de dólares, pago em dinheiro em dois voos clandestinos para Israel, pode ser considerada uma operação “cotidiana”? Como é que o presidente Iván Duque e seu gabinete de segurança não deveriam saber disso porque era uma compra “rotineira”? Quem garante que o sistema não foi usado para espionagem política? Onde diabos está o Pegasus hoje, o que ele faz, quem o está operando, quem está espionando?”
(*) Publicado originalmente em Peoples Dispatch
(*) Tradução de Rocio Paik