O Tribunal Supremo Eleitoral (TSE) da Bolívia reconheceu nesta terça-feira (26/11) Grover García como presidente do partido governista Movimento Ao Socialismo (MAS). Com isso, o ex-presidente Evo Morales perdeu a liderança da sigla depois de 25 anos em meio a uma disputa política interna com o atual chefe do Executivo, Luis Arce.
A decisão ocorre após o congresso realizado pelo MAS na cidade de El Alto. O evento foi organizado em maio por grupos ligados a Arce e deu a vitória ao atual presidente na disputa pelo partido. A medida foi reconhecida pelo Tribunal Constitucional Plurinacional (TCP) só em 14 de novembro.
A partir disso, o TCP orientou a decisão da Justiça Eleitoral. Evo rebateu a decisão e disse que se trata de uma apropriação do movimento indígena e que isso é “um sequestro que leva a um genocídio político”.
Evo foi eleito presidente do MAS em janeiro de 1999 e na liderança da sigla chegou à Presidência do país em 2006, ocupando o cargo até 2019, quando sofreu um golpe.
Grover Garcia celebrou a decisão da Justiça Eleitoral, disse que vai avisar a direção que está deixando a liderança do partido e que entregará os relatórios dos trabalhos realizados durante a última gestão. “A justiça é feita para as organizações sociais. Agora nosso instrumento político voltou para as mãos das organizações sociais”, afirmou.
A disputa pela liderança do partido reflete uma briga interna em torno da candidatura presidencial no pleito de 2025. O ex-presidente se tornou o principal opositor do atual governo depois de voltar do exílio na Argentina em 2020. Morales começou a criticar algumas decisões de Arce e seus apoiadores e disputar espaço pela candidatura do MAS nas próximas eleições presidenciais, do ano que vem.
O estopim da desavença, na corrida pela liderança da sigla, se deu em outubro de 2023, quando apoiadores de Morales organizaram um congresso em Lauca Eñe, no distrito de Cochabamba. A região é seu berço político e reduto eleitoral. No evento, ele chamou os apoiadores de Luis Arce de “traidores”.
Neste mesmo evento, o MAS determinou a expulsão de Arce do partido, já que ele, como representante da sigla no Executivo, não compareceu ao congresso.
O Tribunal Constitucional Plurinacional da Bolívia decretou em dezembro de 2023 que presidentes e vice-presidentes só poderiam exercer o cargo por dois mandatos, de forma seguida ou não. Com a sentença judicial, Evo Morales, que foi presidente por quatro mandatos, não poderia voltar ao poder.
No entanto, um novo Tribunal Constitucional será eleito em dezembro. Os apoiadores de Evo consideram que, com novos juízes, essa norma poderia cair e o ex-presidente poderia voltar a ser candidato em 2025.
A decisão desta terça-feira aumenta a discussão em torno da disputa pela candidatura para a Presidência em 2025 em uma escalada da tensão entre as duas lideranças.
Em 27 de outubro, Morales publicou, em seus perfis nas redes sociais, um vídeo do momento em que o carro em que estava foi alvo de tiros. De acordo com a denúncia de Evo, trata-se de um atentado cujos autores seriam quatro homens encapuzados e vestidos de preto. O ex-presidente disse que a perseguição aconteceu quando ele viajava de sua casa, em Villa Tunari, à cidade de Chimoré. Ele acusou Arce de conhecer os autores dos disparos.
O ministro de governo da Bolívia, Eduardo del Castillo, negou que o carro do ex-presidente tenha sido atacado pela polícia do país. De acordo com ele, o veículo que transportava o ex-mandatário fugiu de uma operação policial que estava na estrada da cidade de Villa Tunari.
No começo de novembro, Morales anunciou que deu início a uma greve de fome para pedir um “diálogo de paz” com o governo Arce. A greve durou uma semana e foi encerrada em 8 de novembro. No mesmo dia, congressistas ligados ao grupo de Evo interromperam e interditaram a sessão do Parlamento em que o atual mandatário faria seu informe anual.
A decisão de Morales foi tomada depois de uma série de protestos que bloquearam estradas e que terminaram com manifestantes ocupando um quartel e prendendo cerca de 20 militares.
Evo investigado
Morales é acusado de “estupro e tráfico de pessoas” por manter relações com uma menina de 15 anos em 2015, quando ainda era presidente e, de acordo com a denúncia, ele teria tido uma filha com a adolescente em 2016. O ex-presidente da Bolívia não compareceu para depor na Delegacia Geral de Polícia de Tarija.
O ex-mandatário ainda foi acusado pelo ministro da Justiça, César Siles, de criar uma rede de jovens de 14 a 15 anos para ter a sua disposição enquanto era presidente. O ministro disse que esse grupo seria chamado de “Geração Evo”. Os pais da jovem também estariam sendo investigados porque supostamente receberam dinheiro ao entregá-la ao ex-presidente em troca de favores.
De acordo com a lei boliviana, caso ele não se apresentasse para depor, a Justiça poderia determinar uma ordem de captura para que Morales deponha. Siles reforçou que Evo estaria sujeito à prisão caso não comparecesse.
O objetivo da defesa do ex-presidente é transferir o julgamento para Cochabamba, cidade onde vive Evo Morales, usando um artigo do Código de Processo Penal que faz referência ao “juízo natural”, ou seja, o direito de ser processado na jurisdição em que vive. Para o advogado Jorge Pérez, o processo “nasceu morto” por ter sido encerrado em 2020.
Evo Morales criticou a investigação, dizendo que as acusações são “inventadas” e têm como objetivo forçar um processo criminal.