Neste sábado (09/02), completa-se dois meses que Hugo Chávez partiu da Venezuela em direção a Cuba para se submeter à quarta intervenção cirúrgica para o tratamento de um câncer na região pélvica. Desde então, diversos anúncios foram realizados, boletins sobre a saúde do presidente venezuelano foram lidos, manifestações tomaram as ruas e rumores foram espalhados.
Desde que Chávez foi internado em Havana, após a aprovação de sua viagem à capital cubana por unanimidade pela Assembleia Nacional, o governo venezuelano emitiu, em pelo menos 30 oportunidades, informações sobre a evolução médica do presidente. Segundo os ministros do governo venezuelano, Chávez dá diretrizes sobre a condução do país à distância.
Na última quinta-feira (07/02) o chanceler do país disse ter se reunido na capital cubana com o presidente, com o vice Nicolás Maduro e com a Procuradora Geral Cilia Flores. “(…) acabamos de terminar um encontro profundamente humano com nosso Comandante Chávez. [Ele] Está batalhando!”, escreveu no Twitter Elías Jaua, designado ministro de Relações Exteriores do país por meio de um documento no qual constava a assinatura de Chávez, durante sua internação.
A oposição frequentemente pede provas de que Chávez está vivo, alegando insuficiência de contato. Quando questionado sobre a falta de uma foto ou de dados precisos sobre a saúde do mandatário, o ministro de Comunicação Ernesto Villegas afirmou a um jornal argentino que “há um limite” que deve ser respeitado devido ao “direito à privacidade dos pacientes”. Segundo ele, Chávez “deu informações muito precisas” para que o poder Executivo informe “com rigor as boas e más notícias” sobre sua evolução à população.
Outra crítica da oposição é a suposta ingerência do governo de Cuba nas tomadas de decisão do gabinete venezuelano. Uma das vozes ativas contra o proceder ministerial durante a ausência de Chávez é a do dirigente oposicionista Leopoldo López: “Evidentemente a capital de Venezuela se mudou para Havana, como se fôssemos uma colônia”, falou em meados de janeiro sobre as reuniões na capital cubana.
Agência Efe (08/02)
Segundo ministros, Chávez dá diretrizes sobre a condução do país à distância; para oposição, comunicação é insuficiente
Além dos constantes questionamentos da oposição, os ministros venezuelanos – e até mesmo a ex-esposa de Chávez – tiveram que pedir publicamente o fim dos rumores sobre a ausência do mandatário. Também, frequentes anúncios de sua morte que circulam nas redes sociais (que incluem montagens de fotos que mostram o presidente em um caixão). A imprensa colaborou com a difusão de informações nunca confirmadas.
Entre as publicações mais escandalosas estão as veiculadas por jornais espanhóis. Um exemplo é uma reportagem publicada pelo jornal ABC, no início de janeiro, na qual afirmava que o presidente venezuelano estava em coma, respirando artificialmente através de tubos, que deveriam ser desconectados em breve. A notícia foi desmentida com veemência pelo governo, que anuncia continuamente a melhora do estado de saúde do presidente.
Com a foto de um homem entubado em sua primeira página, o jornal El País, também espanhol, construiu o exemplo mais emblemático da criação de rumores por parte da imprensa. A publicação, que alegava que o paciente da imagem era de Hugo Chávez, foi desmentida por leitores – que descobriram a falsidade da informação – e teve que se retratar publicamente. O governo venezuelano garantiu que processará o jornal.
O assédio e a falta de cuidado com a veracidade das informações por parte da imprensa ocidental não é novidade, segundo analisou recentemente o economista Mark Weisbrot, co-diretor do Center for the Economic and Policy Research . Para ele, no entanto, o “festival midiático de ódio” contra o presidente venezuelano nos últimos dias “foi impressionante até mesmo para os padrões de hostilidade com os quais estamos acostumados”.
Além dos rumores, desde a partida de Chávez para Cuba, os venezuelanos também tiveram que lidar com a falta de produtos alimentícios. Importantes jornais do país – a maioria contrária a Chávez – noticiavam “crise” e “desabastecimento”. Para o ministro da Alimentação, Carlos Osorio, as falhas na distribuição de alimentos de primeira necessidade foram provocadas pela “direita venezuelana” para gerar uma falsa crise.
“As tentativas de desestabilização por parte da direita têm sido uma presença constante na história da revolução bolivariana, toda vez que eles acham alguma oportunidade de criar um rumor, uma notícia ou gerar algum tipo de caos, eles se aproveitam”, afirmou a Opera Mundi Carlos Julio Ron, conselheiro político da embaixada venezuelana no Brasil. Segundo ele, no entanto, “o povo já demonstrou várias vezes, nas eleições e na construção do processo, ter clareza do rumo da construção do poder popular e de seu destino”.
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De fato, apesar do clima pesado, os seguidores de Chávez deram mostras de que estão dispostos a esperar por seu regresso. Seja para rezar, celebrar uma insurreição liderada por Chávez, manifestar apoio ao governo ou prestar um juramento coletivo em nome do presidente ausente, os chavistas tomaram as ruas de Caracas em diversas oportunidades durante os dois meses de tratamento do mandatário, reeleito em outubro do ano passado.
“Independentemente destas tentativas [de desestabilização] a população apoia os programas sociais, o governo, o presidente Chávez, as manifestações de apoio e solidariedade têm sido enormes nos últimos meses”, enfatiza o conselheiro. Para ele, os venezuelanos reconhecem o gabinete de Chávez “que continua sendo presidente”, e “continua apoiando o trabalho que tem sido feito”.
Ron afirmou ainda que não existe uma situação extraordinária na Venezuela. “O país não parou, está muito ativo, todos os dias os ministros e o vice-presidente têm atividades, o governo continua fixando as metas de seus programas, o presidente já tomou algumas decisões. Toda vez que é necessário, os ministros consultam, conversam, ele [Chávez] aprova, dá instruções. O governo está se mobilizando, está em desenvolvimento normal”, garantiu.
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Na última quinta-feira (07/12), 3,4 mil casas construídas pelo programa habitacional Gran Misión Vivienda Venezuela foram entregues a novos moradores. Segundo o coordenador do Órgão Superior de Moradia do país, já são 350 mil habitações edificadas desde o lançamento do programa, em 2011. Destas, 64% foram construídas por voluntários. A continuidade do projeto se deve a “instruções do comandante Hugo Chávez”, disse Ramírez, esclarecendo que o Executivo do país já se organizou para cumprir a meta de entrega estipulada para 2013.
Prensa Miraflores
Após a reeleição de Chávez, propostas para segundo mandato foram debatidas pela população e depositadas em urnas
Com Chávez ausente, os venezuelanos também foram surpreendidos pelo anúncio da instalação de uma Comissão da Verdade no final de fevereiro para investigar crimes contra os direitos humanos cometidos por razões políticas durante o período conhecido como “puntofijismo” ou Quarta República (1958-1998).
O anúncio dá continuidade à aprovação, pela Assembleia Nacional, em outubro de 2011, do projeto de lei que prevê penalizar responsáveis por crimes, desaparições, torturas e outras violações aos direitos humanos durante o período iniciado após a derrocada do ditador Marcos Pérez Jiménez.
Algumas decisões sensíveis como a do ajuste financeiro demoraram para serem tomadas. Na última sexta-feira (08/02), o ministro de Planejamento e Finanças do país, Jorge Giordani, anunciou a desvalorização do bolívar, que passará de 4,30 para 6,30 em relação ao dólar a partir da próxima quarta-feira (13/02). Segundo ele, a medida, ordenada pelo presidente para “minimizar gastos e maximizar resultados”.
Também será criada uma nova autoridade para a otimização do sistema cambial, integrado pelo ministério conduzido por Giordani, pelo Banco Central da Venezuela (BCV), e pela pasta de Mineração e Petróleo. O organismo tem como objetivo o controle da inflação e o equilíbrio do fluxo de divisas disponíveis para as necessidades orçamentárias.
“Neste momento temos um brote inflacionário e especulativo e é onde se tem que atuar”, disse o ministro sobre as novas medidas econômicas. Para Ron, “tudo está no seu ritmo devido”. “O governo está funcionando devidamente e irá atendendo [cada questão] no momento que for preciso. Não há uma parálise ou alguma coisa assim”, afirmou.
No entanto, alguns aspectos ainda geram expectativas no país. Um deles é a apresentação ao Legislativo do “Plano Socialista 2013-2019”, que parece esperar pelo regresso do presidente. Após a reeleição de Chávez, propostas foram debatidas em praças e centros de estudos do país, e posteriormente depositadas em urnas. Na metade do processo colaborativo, que durou cerca de dois meses, pelo menos 4,3 mil sugestões já tinham sido feitas para o novo mandato chavista.
Realizado durante o juramento de cada mandatário, o plano de governo, que passa por aprovação do poder Legislativo, acabou adiado indefinidamente com o dia da posse de Chávez – após decisão do Supremo tribunal, que concedeu ao presidente reeleito o tempo “que for necessário” para que assuma o comando do país, após sua recuperação em Cuba. A população ainda aguarda o texto que direcionará a nova administração participativa.